"Se dissesse aos jogadores que o sol era verde, eles acreditariam". Como Eriksson guiou o Benfica à final da Taça UEFA em 1982-83
Benfica não conseguiu bater Anderlecht no Estádio da Luz
Para Sven-Göran
Eriksson não houve ano zero no Benfica.
Não houve frases feitas como “confiar no processo”. Não houve desculpas. Foi
chegar, ver e vencer. As águias
começaram o campeonato com onze vitórias nas primeiras onze jornadas e desde
cedo que encaminharam a conquista do título nacional, ao mesmo tempo que
superavam eliminatórias na Taça
de Portugal e na Taça
UEFA.
A caminhada prova internacional
iniciou-se em setembro de 1982 com um duplo confronto ibérico diante do Betis,
que contava com algumas das maiores figuras da sua história, como José Ramón
Esnaola, Rafael Gordillo e Julio Cardeñosa. Nada que intimidasse as águias,
que aplicaram um duplo 2-1. Primeiro, na Luz,
Nené de penálti (44 minutos) e Paulo Padinha (73’) marcaram para os encarnados,
tendo Carlos Diarte reduzido para os béticos
(76’).
Duas semanas depois, no Benito
Villamarín, Poli Rincón colocou os verdiblancos
na frente da eliminatória aos 25 minutos, vantagem essa que durou até meio da
segunda parte. Depois Carlos Manuel empatou o encontro (67’) e Nené deu a
estocada final (85’).
Seguiram-se os belgas do Lokeren
de Robert Waseige, que também foram um osso algo duro de roer. Na primeira-mão,
na Luz,
o Benfica
encaminhou a eliminatória graças a um golo de Nené aos 20 minutos e outro de
Humberto Coelho aos 66’, a 20 de outubro.
No segundo jogo, na Bélgica, o Benfica
entrou praticamente a perder, devido a um golo do internacional neerlandês René
van der Gijp logo aos sete minutos. A eliminatória perigou durante algum tempo,
mas um bis do jugoslavo Zoran
Filipovic no início da segunda parte (57’ e 64’) deu conforto às águias.
Ainda invictos no campeonato, a
24 de novembro, os encarnados
iniciaram em solo suíço o duplo confronto com o Zurique, na terceira
eliminatória da Taça
UEFA. Depois de o empate a zero ter subsistido até à reta final da partida,
o neozelandês Wynton Rufer adiantou os helvéticos aos 79 minutos e Filipovic
empatou aos 87’.
O empate na Suíça deu uma falsa
sensação de equilíbrio entre as duas equipas, pois o Benfica
goleou por 4-0 na segunda-mão, no Estádio
da Luz, precisamente três dias após o primeiro deslize no campeonato, um
empate no terreno do Ginásio
de Alcobaça (1-1). Filipovic
abriu o ativo aos 12 minutos e Diamantino Miranda (50’) e Nené por duas vezes
(60’ e 62’) engordaram a vitória das águias
na segunda parte.
Na eliminatória seguinte, os
quartos de final, o Benfica
teve pela frente a AS
Roma, que nessa época viria a sagrar-se campeã italiana e que na temporada
seguinte viria a atingir a final da Taça
dos Campeões Europeus. Uma grande equipa, portanto, com jogadores marcantes
como Franco Tancredi, Sebastiano Nela, Falcão, Carlo
Ancelotti, Bruno Conti e Roberto Pruzzo. O treinador também era sueco, Nils
Liedholm. “Na primavera de 1983, se eu
dissesse aos jogadores que o sol era verde, eles acreditariam. Estávamos bem seguros
no caminho para sermos campeões. Também queríamos ganhar a Taça
UEFA, já tendo atingido os quartos de final. Seis semanas antes do primeiro
jogo, desloquei-me a Roma para observar o nosso adversário – a AS
Roma. Estavam a realizar uma época extraordinária, tendo sofrido apenas duas
derrotas, e fui vê-los defrontar o Cagliari. Nesse tempo, os jogos de Itália
não eram transmitidos para Portugal”, contou Sven-Göran
Eriksson no livro autobiográfico Sven – A Minha História,
publicado em 2013. Apesar do poderio do adversário,
o Benfica
foi ao Estádio Olímpico vencer por 2-1 a 2 de março de 1983, novamente com Zoran
Filipovic em destaque, ao bisar (40 e 62 minutos). Depois do bis do jugoslavo,
Agostino di Bartolomei reduziu para os transalpinos
(65’).
No segundo jogo, na Luz,
o Benfica
segurou a vantagem na eliminatória graças a um empate a um golo. Filipovic
adiantou as águias
aos 19 minutos, enquanto Falcão igualou a partida já bem perto do apito final
(85’).
Romenos superados graças ao
golo fora
Nas meias-finais, o adversário do
Benfica
foi o Universitatea Craiova, da Roménia, um osso bem mais duro de roer do que o
nome sugere. Na primeira-mão, em Lisboa, houve empate a zero.
Na Roménia houve nova igualdade,
mas a um golo, o que permitiu o Benfica
seguir para a final graças à regra que beneficiava as equipas que tivessem
marcado mais golos fora. Ilie Balaci adiantou os romenos aos 16 minutos e Filipovic
restabeleceu a igualdade aos 53’.
A expulsão que encolheu e o contra-ataque fatal
“Pelo segundo ano consecutivo,
conduzi uma equipa à final da Taça
UEFA. Com o Gotemburgo fomos os tomba-gigantes. Com o Benfica
era diferente. Éramos um gigante que defrontava outro – o Anderlecht, da
Bélgica”, recordou Eriksson
na sua autobiografia.
Na altura, o clube de Bruxelas
atravessava um período dourado em termos internacionais, tendo conquistado a
Taça das Taças em 1975-76 e 1977-78 e atingido a final da mesma competição em
1976-77. Já a seleção
belga havia sido finalista vencida do Euro 1980
e ultrapassado a primeira fase de grupos do Mundial 1982. Na primeira-mão da final, disputada
a 4 de maio na Bélgica, o Benfica
sofreu a segunda derrota da temporada, a primeira para a Taça
UEFA, tendo perdido por 1-0, graças a um golo solitário do dinamarquês Kenneth
Brylle aos 29 minutos. “No Estádio do Heysel, em Bruxelas, não jogámos bem. O
Anderlecht ganhou vantagem na primeira parte e, na segunda, tivemos um jogador
expulso [José Luís]. Optámos por não sofrer mais golos e conseguimos esse
objetivo. O Anderlecht venceu por 1-0. Mesmo não tendo marcado fora de casa,
sentíamos que havia boas hipóteses de dar a volta ao resultado em nossa casa”,
comentou o treinador sueco na sua autobiografia.
Na segunda-mão, a 18 de maio, o Benfica
entrou forte e adiantou-se à passagem da meia hora, por intermédio de Shéu, mas
sofreu o empate logo a seguir, por intermédio do espanhol Juan Lozano, num
lance de contra-ataque (38’). “As expetativas estavam altíssimas no Estádio
da Luz. O Benfica
não ganhava uma taça europeia desde Eusébio
e das proezas da sua equipa 21 anos antes. Tivemos um início muito forte e
ganhámos vantagem, mas sofremos um rude golpe quando o espanhol Lozano marcou
para o Anderlecht em contra-ataque. Agora, precisávamos de mais dois golos. Tínhamos
de atacar, mas com cuidado para não voltar a sofrer outro golo. Uma corrida
contra o tempo. No início da segunda parte fiz duas substituições, entrando
dois avançados [Filipovic
e João
Alves], mas não resultou. Era demasiado tarde. O jogo acabou 1-1 e o
Anderlecht ganhou a Taça
UEFA”, lembrou Eriksson.
“Foi a minha primeira grande
derrota. Mas não me sentia profundamente desapontado. A nossa época foi impressionante.
Ganhámos o campeonato com facilidade, com uma única derrota, e apurámo-nos para
a final da Taça
de Portugal que iria jogar-se em agosto [diante do FC
Porto, nas Antas]. Além de termos atingido a final da Taça
UEFA. Não lia os jornais portugueses, mas Börje [Lantz, empresário sueco
que que levou Eriksson
para o Benfica]
disse-me que me elogiavam muito”, prosseguiu o sueco.
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