quarta-feira, 10 de abril de 2024

Quatro parafusos na coluna, quatro operações e três anos sem jogar. O terror de Delfim no Marselha

Delfim esteve no Marselha entre 2001 e 2006
Delfim, médio internacional português e pontapé-canhão campeão pelo Sporting em 1999-00, nunca teve propriamente sorte no que concerne à saúde física durante a carreira. Ainda de leão ao peito, foi operado três vezes ao joelho direito e sofreu uma rutura muscular que o obrigou a parar cerca de quatro meses. Mas ao serviço do Marselha viveu algo ainda pior, um autêntico filme de terror.
 
Transferido para o emblema do sul de França no verão de 2001 por uma verba a ronda os três milhões de euros, arrependeu-se da mudança pouco depois de aterrar em solo gaulês. “Cheguei a um clube que naquela altura não tinha minimamente um projeto desportivo. Era um clube à deriva”, contou à Tribuna Expresso em fevereiro de 2018.
 
Embora não gostasse do idioma, aprendeu francês rapidamente, tendo sido inicialmente orientado por Tomislav Ivic, antigo treinador de FC Porto e Benfica e próximo de Augusto Inácio, que lhe terá dado boas indicações sobre este centrocampista natural de Amarante.
 
Depois de uma primeira época razoável, com 21 jogos e um golo, apesar do 9.º lugar na Ligue 1, lesionou-se gravemente no arranque da segunda temporada no Marselha, em agosto de 2002. “Fiz uma pré-época ao mais alto nível, partimos para o primeiro jogo do campeonato, jogo esse com o Nantes que era em casa, mas como o clube estava castigado tivemos que ir jogar a Lyon. Fizemos 380 quilómetros de autocarro e recordo-me de ter adormecido talvez durante uma hora e meia nesse trajeto. Acordo com uma contratura lombar clássica, mas que me impossibilitava de treinar e jogar a 100%. No treino, na véspera do jogo, senti muitas limitações, falei com a equipa médica e técnica e disse-lhes que não estava em condições, mas o treinador Alain Perrin quis que eu participasse e que fosse para o banco de suplentes. Entrei a 14 minutos do fim. Foram os primeiros e únicos 14 minutos que fiz em três épocas”, recordou o médio.
 
“Dois dias depois no primeiro treino pós-descanso fui manipulado de uma forma muito agressiva por parte do fisioterapeuta/osteopata do clube e que me provocou uma entorse da coluna vertebral. Depois disso foi um calvário com quatro operações e três anos sem jogar ao mais alto nível”, prosseguiu, dando conta de uma “torção violentíssima na coluna” que lhe “provocou dores violentas durante praticamente dois anos”.
 
Embora essa manipulação tivesse acontecido em agosto de 2002, foi operado, por três vezes em três meses (entre outubro de 2002 e janeiro de 2003), a… supostas hérnias inguinais. Um erro de diagnóstico: “Só fui operado à coluna vertebral a 29 julho de 2003, onze meses depois da manipulação, ou seja, só nessa altura fui operado à verdadeira causa da lesão.”
 
Delfim esteve parado entre agosto de 2002 e fevereiro de 2005
E a verdadeira causa da lesão só foi descoberta porque Delfim, à revelia do clube, marcou consulta com um neurocirurgião que, mais tarde, o haveria de operar em Marselha. “Ele percebeu logo e disse-me: ‘Infelizmente caíste num ciclo vicioso’”, lembrou.
  
Depois dos tais 14 minutos em campo no Marselha-Nantes de 3 de agosto de 2002, o internacional português só voltou a jogar a 13 de fevereiro de 2005, numa altura em que tinha sido cedido ao Moreirense. “Fui emprestado ao Moreirense durante quatro meses para perceber se tinha condições ou não de continuar a carreira ao mais alto nível, com quatro parafusos na coluna. Basicamente é isso. Fiz a fixação artificial de duas vértebras a L5 e S1. Os resultados, as respostas foram as melhores possíveis. No Moreirense joguei dois meses com Vitor Oliveira como treinador, e nos últimos dois meses com o Jorge Jesus. E percebi que tinha condições para continuar e regresso ao Marselha para cumprir a última época que tinha de contrato com o clube”, recordou Delfim, que não conseguiu evitar a despromoção dos minhotos à II Liga.
 
Em 2005-06 voltou mesmo ao plantel do Marselha e conseguiu disputar 21 jogos e marcar um golo numa equipa que venceu a Taça Intertoto, chegou aos oitavos de final da Taça UEFA e foi finalista vencida da Taça de França. “Apresento-me no início da época contra as previsões de tudo e todos, porque pensavam que eu estava incapacitado. E tive o privilégio de encontrar um treinador muito humano (Jean Fernandez), que desde cedo deu-me espaço para ombrear com colegas que faziam parte do plantel”, narrou, puxando a cassete atrás.
 
“Tive a sorte de ter uma equipa técnica diferente das outras, que me deu espaço, e que me deu prazer de voltar a vestir a camisola do Olympique de Marselha. E nada melhor do que no primeiro jogo que faço a titular foi na final da Taça Intertoto contra o Deportivo da Corunha, disputado em duas mãos e vencemos a taça. Para mim foi extraordinário, joguei a titular os dois jogos. (…) A vontade de jogar era tanta, tanta que eu não tinha sensações de incapacidade. Até porque tive de superar testes na medicina do trabalho, porque o Olympique tudo fez para que eu não voltasse a jogar mais. A minha revolta e luta foi tal que potencializei de tal forma a minha condição física que nos testes a que fui sujeito na medicina do trabalho nenhum médico foi capaz de me dar como inválido”, acrescentou.

 
No verão de 2006 recusou uma oferta para renovar contrato, magoado com o clube, e mudou-se para os suíços do Young Boys. Ainda representou Naval e Trofense antes de encerrar a carreira em 2009. Depois disso, em 2012, avançou com um processo contra o Marselha pouco dias antes do prazo prescrever. “Enquanto jogasse futebol não queria de maneira alguma estar envolvido em processos. Porque eu voltei a jogar. Contra dados estatísticos e tudo o que se perspetivava para o meu estado clínico, voltei a jogar. E a minha preocupação era desfrutar do tempo que me restava”, explicou o médio que despontou no Boavista e que somou um total de 43 partidas e dois golos pelo emblema do sul de França.
 





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