quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

Treinador do Zambujalense quer “construir equipa forte para sonhar com subida num futuro próximo”

Álvaro Mendes estreou-se no ACRUT Zambujalense com uma vitória
De regresso ao ativo, o treinador luso-angolano Álvaro Mendes aceitou o convite do presidente do ACRUT Zambujalense, que é seu amigo, e assumiu o comando técnico da equipa sénior, que espera potenciar e ajudar a colocar na I Distrital da AF Setúbal.
 
Em entrevista, confessa a saudade dos tempos em que jogava pelo Barreirense no Estádio Dom Manuel de Mello e pelo Luso no Campo da Quinta Pequena, e fala sobre o amigo Paulo Fonseca e sobre o filho, Pedro Mendes, que recentemente foi jogar para Hong Kong.
 
ROMILSON TEIXEIRA - O Álvaro Mendes  entrou com o pé direito no comando técnico do ACRUT Zambujalense, com uma vitória na receção ao Trafaria, naquele que foi o primeiro triunfo da equipa na II Distrital da AF Setúbal. Que balanço faz das primeiras semanas de trabalho?
ÁLVARO MENDES - Muito satisfeito. É um plantel com muita juventude, que claramente quer evoluir para poder ir para outros campeonatos. A juntar a isso a vitória e uma muito boa exibição no primeiro jogo.
 
O ACRUT Zambujalense iria receber este domingo o Monte da Caparica, mas o jogo foi adiado. Imaginamos que este adiamento esteja relacionado com a pandemia de Covid-19...
Exato. Um jogador nosso testou positivo.
 
Na perspetiva de um treinador recém-chegado, veio a calhar o adiamento deste jogo, para trabalhar mais as suas ideias em treino, ou preferia aproveitar a embalagem moral da vitória da semana anterior?
Creio que neste momento preferia que o campeonato não tivesse parado. Os jogadores estão muito moralizados com a exibição e estão muito ansiosos para dar continuidade à nossa recuperação no campeonato.
 
Todas as experiências que o Álvaro teve como treinador foi na I Distrital, e logo em clubes históricos como a União de Santiago e o Sesimbra. O que o levou a aceitar o convite de um treinador da II Distrital que, aparentemente, não tem ambições de subida de divisão?
Sinceramente, não estava nos meus planos treinar esta época, por razões óbvias, no entanto, quando recebi o telefonema e o presidente me abordou, dizendo “mister, preciso da sua ajuda”, tendo nós uma relação de amizade de alguns anos eu não tinha como dizer que não. Obviamente que o facto de conhecer alguns jogadores que foram meus jogadores no Sesimbra também pesou na decisão.
 
Álvaro Mendes no Sesimbra em 2018
Curiosamente, já tinha estado no ACRUT Zambujalense em 2013-14 como treinador dos juvenis. Como descreve o clube?
É um clube de gente séria, com boas condições de trabalho, mas claramente precisa que a sua estrutura aumente a sua ambição para sonhar com outros voos.
 
Quais são os objetivos do ACRUT Zambujalense para esta temporada?
Potenciar os seus atletas individualmente e consequentemente construir uma equipa forte taticamente e mentalmente para num futuro o mais próximo possível sonhar com uma subida de divisão.
 
Que princípios de jogo podemos estar à espera de ver quando assistimos a jogos de equipas orientadas pelo Álvaro?
As minhas equipas são normalmente equipas muito agressivas na conquista da bola e de muita criatividade quando estão em posse. Sou um treinador que privilegia o espetáculo, não gosto de jogar só para o resultado. Mas atenção, respeito quem o faça, cada um com o seu estilo.
 
Voltando atrás no tempo. Onde nasceu e cresceu? Como foi a sua infância?
Nasci em Angola, mas vim para Portugal com dois anos e dividi a minha infância entre a Costa da Caparica e o Barreiro. Foi difícil virmos sem nada para Portugal e a minha mãe sozinha ter de criar quatro filhos. Foi complicado, mas sinceramente não tínhamos nada, mas tínhamos tudo, pois éramos muito unidos e como não havia dinheiro para brinquedos passávamos muito tempo na rua e, como costumo dizer, a escola da rua acelera e muito o nosso crescimento enquanto homens e ao mesmo tempo cria amizades para o resto da vida.
 
Quando é que a bola entrou para a sua vida?
Acho que desde pequeno que tinha a doença da bola, mas quando cheguei ao Barreiro um dia um amigo meu disse que me iria levar a um clube chamado Vila Chã para treinar. Eu tinha 11 anos, tudo correu bem e a partir daí nunca mais parei.
 

“Parte do Barreirense morreu com a demolição do D. Manuel de Mello

Álvaro Mendes jogou pelo Barreirense entre 1990 e 2001
Como jogador fez quase toda a carreira no Barreirense, na altura na II Divisão B. Quais são as principais recordações desse tempo?
Recordações maravilhosas. Aquilo não era um grupo, era uma família em que tive o privilégio de ser capitão durante muitos anos e onde me fiz homem. Quero aproveitar a oportunidade para agradecer a todos os momentos maravilhosos que me proporcionaram.
 
Tem saudades das tardes de futebol no já demolido Estádio Dom Manuel de Mello?
Muitas saudades era um estádio mítico, sempre com muita gente. Creio que parte do Barreirense morreu com a sua demolição.
 
No Barreirense jogou ao lado de jogadores que atingiram um nível elevado como futebolistas e, em alguns casos, também como treinadores. Quais são as principais memórias de jogadores como Duka, Paulo Fonseca, Hugo Cunha, Hugo Carreira, Ernesto, Kali, Zé Pedro e Paulo Lopes. Ainda fala regularmente com alguns deles?
Falo com todos, uns com mais regularidade que outros, o que é normal, mas quando estamos juntos é uma alegria. Como disse, aquilo era uma família e alguns de nós já jogávamos juntos desde crianças.
 

Paulo Fonseca ainda vai chegar a um patamar mais alto”

Paulo Fonseca e Álvaro jogaram juntos entre 1990 e 1995
O nome mais mediático dos que foram referidos acima foi Paulo Fonseca, atual treinador da AS Roma. Ele como jogador já dava a entender ser particularmente interessado pelas questões táticas? Como tem visto a carreira dele?
O Paulo e eu tínhamos uma relação muito próxima, porque já nos conhecíamos desde os 11 anos e a nossa vida era quase exclusivamente futebol. Portanto, não é de estranhar que ele tivesse seguido a carreira de treinador e graças a Deus tem tido sucesso. Creio que ainda vai chegar a um patamar mais alto, até porque é um bom homem e merece.
 
O Álvaro despediu-se da carreira de futebolista no Luso, tendo jogado em mais outro campo que agora não existe, o Campo da Quinta Pequena. Quais são as principais recordações que tem dos dois anos em que jogou pelo clube do Barreiro e como vê o Luso agora sem campo e sem futebol?
Eu cheguei ao Luso dois anos depois de ter deixado de jogar, mas o treinador era meu amigo e pediu para lhe ir ajudar. Foi como se tivesse voltado a jogar por prazer, sem a pressão do profissionalismo, e tive um prazer enorme em representar aquele humilde clube. Quanto ao campo, estava muito velhinho, mas ainda hoje passo naquele lugar e sinto uma enorme nostalgia.
 
Entretanto tornou-se treinador. Fá-lo a tempo inteiro ou tem outra atividade?
Não, infelizmente tenho outra atividade.
 
Começou a carreira de treinador como adjunto de Rui Fonseca no Barreirense, tendo desempenhado as mesmas funções no Comércio e Indústria, no Fabril, no 1º de Maio Sarilhense e no Eléctrico. Depois passou pelo comando técnico de União de Santiago e Sesimbra. O que o levou a romper a ligação com Rui Fonseca e que balanço faz da sua carreira como treinador?
Eu e o Rui falamos praticamente todos os dias e somos grandes amigos. Numa determinada altura fui convidado para assumir uma equipa e a partir daí nunca mais se proporcionou voltar a estarmos juntos, mas nunca se sabe. Em relação à minha carreira, acho que tenho ajudado alguns jogadores a crescer e isso para mim já é uma vitória. Também tenho noção que comecei muito tarde, mas fi-lo conscientemente por um desígnio maior, poder acompanhar o meu filho na sua carreira. Voltava a fazer tudo igual, valeu a pena.
 

“Na minha altura não eram convocados jogadores de fora de Angola…”

Álvaro Mendes (em baixo, à direita) como capitão do Barreirense
Ainda como futebolista, o Álvaro jogou ao lado do Kali, que haveria de se tornar internacional angolano e até esteve no Mundial 2006. Na altura em que o Álvaro jogava, a seleção angolana dava os primeiros passos em fases finais da CAN. Alguma vez foi abordado pela Federação Angolana no sentido de jogar pelos Palancas Negras?
Creio que na fase em que eu tinha condições para representar a seleção, a Federação Angolana não convocava jogadores de fora de Angola, por isso naturalmente nunca fui convidado.
 
Costuma visitar Angola?
Estive em Angola em 2014 a trabalhar. Infelizmente não pude ir conhecer a localidade onde nasci.
 
Gostava de trabalhar no futebol angolano?
Claro que sim, o futebol é universal, ainda por cima na terra onde nasci, e porque também tenho algum conhecimento pelo tempo que o meu filho esteve no Libolo. E, claro, porque já falei muitas vezes com o Kali sobre o futebol angolano.
 
Que opinião tem sobre o futebol angolano? Costuma acompanhar campeonato e seleção?
O futebol angolano tem jogadores de muita qualidade, tem paixão e hoje já tem boas infraestruturas. Creio que, continuando a melhorar na organização, no curto prazo pode ser uma das principais potências em África.
 
Falemos também um pouco do seu filho, Pedro Mendes, que é futebolista e recentemente assinou por um clube de Hong Kong. Como tem visto a carreira dele e quais os principais conselhos que lhe tem dado nesta fase?
O Pedro têm tido uma carreira de altos e baixos, mas também tem tido o mérito de ter conquistado tudo com o seu trabalho e muito a pulso. Está hoje mais maduro e creio que vai ter muito sucesso na Ásia, aliás, como já está a ter. Os conselhos de hoje são os mesmos de sempre: humildade, seriedade, respeito e muita fé em Deus para o futebol e para a vida.

 
Gostava de o ver a representar a seleção angolana? Acredita que ainda vai a tempo?
Gostava e não percebo porque é que nunca foi chamado, sinceramente seria uma mais-valia para a seleção.
 
Também é inevitável falar da pandemia de Covid-19. Sente-se seguro ao estar sem máscara perto de tantas pessoas que não são regularmente testadas?
Infelizmente esta pandemia apanhou o mundo de surpresa e vai deixar marcas por muitos anos. Mas temos que continuar a lutar, a vida é assim mesmo. Quanto às máscaras, é óbvio que quando vejo pessoas sem máscara procuro não me aproximar e lamento que ainda apareçam pessoas a desvalorizar um vírus que já foi o causador da morte de milhões de pessoas.
 
 
Entrevista realizada por Romilson Teixeira








   









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