A rejeição de Toshack, a nega à Académica e a casa na Caparica. A história da ida de Futre para o FC Porto
Futre trocou o Sporting pelo FC Porto no verão de 1984
Paulo
Futre estreou-se pela equipa principal do Sporting
a 10 de maio de 1983, tendo sido lançado pelo treinador eslovaco Jozef Venglos num
jogo particular diante da Portuguesa
dos Desportos em Alvalade,
numa altura em que tinha 17 anos. Exibiu-se a bom nível, mas como nessa altura vigorava
uma regra que só permitia jogar no campeonato quem iniciasse a época já com 17
anos feitos – Futre
só comemorou o 17.º aniversário a 28 de fevereiro de 1983 –, o extremo canhoto
teve de esperar pela época seguinte para se estrear oficialmente.
E Futre
foi grande aposta de Venglos em 1983-84, tendo sido utilizado em 29 jogos (15 a
titular) e apontado três golos. Pelo meio somou a primeira de 41
internacionalizações pela seleção
nacional A, estreando-se num jogo diante da Finlândia
em setembro de 1983, quando tinha apenas 17 anos e 204 dias. Mas no final da temporada, o
técnico eslovaco foi demitido, não resistindo a uma campanha sem títulos, na
qual o Sporting
não foi além do 3.º lugar no campeonato, a 2.ª eliminatória da Taça
UEFA e as meias-finais da Taça
de Portugal. Para o seu lugar foi contratado John
Toschack, que logo durante uma digressão de final de época nos Estados
Unidos disse a Futre
que não contava com ele no plantel. A intenção do treinador
galês era que o extremo ganhasse rodagem num emblema de menor dimensão, tendo
até sugerido a Académica.
Em seguida, a imprensa começou a falar no assunto, noticiando “Futre
na Académica”.
Mas o então jovem de 18 anos não aceitou. Considerava que merecia mais. Após um treino matinal em Alvalade
e quando estava a assinar autógrafos, um homem que nunca tinha visto abordou-o
sobre uma suposta casa na Costa da Caparica que tinha para vender. A
localização não era por acaso: Futre
desde os oito anos que passava férias numa tenda no parque de campismo na Costa
da Caparica, conhecia muito bem aquela zona e gostava de ir para lá.
Quando chegou ao carro para ver
um suposto catálogo, o suposto vendedor apresentou-se como Domingos Pereira, um
representante do FC
Porto, que o levou para a casa do Porto na Avenida da República, em Lisboa.
Lá o montijense
recebeu uma proposta de 27 mil contos (cerca de 135 mil euros) por um contrato
de três anos com direito a carro e uma casa com avaliação próxima dos 20 mil
euros, numa altura em que ganhava apenas 70 contos (350 euros) por mês no Sporting
e estava em vias de ser emprestado à Académica. Entusiasmado com a proposta, mas
vinculado por mais oito anos ao clube do coração, Futre
tentou falar com o presidente João Rocha para pedir um improvável aumento, mas
o melhor que conseguiu foi verbalizar a intenção de auferir 18 mil contos
(cerca de 90 mil euros) em três anos ao dirigente Armando Biscoito. “O presidente
diz que estás louco”, respondeu dias depois o mesmo responsável. Paralelamente, prosseguiu a
pressão do FC
Porto, tendo o vice-presidente Alexandre Magalhães rumado a Lisboa para selar
o acordo e levar o extremo para a Invicta, com Domingos Pereira ao volante. Quando chegou às Antas, por volta
das seis da manhã, entrou numa sala onde estava reunida toda a direção do FC
Porto, incluindo o presidente Pinto
da Costa, que logo ali lhe vaticinou um futuro risinho: “Vais ser tu e mais
dez.” Mais tarde, o treinador Artur
Jorge disse-lhe o mesmo. Futre
assinou pelos dragões
antes ainda de rescindir com o Sporting,
com a bomba a cair por volta das três da tarde. O até então companheiro de
equipa Manuel
Fernandes, que deveria dar boleia a Futre
para o treino, não sabia de nada. E ninguém fazia ideia onde estava o jovem
extremo. Escondido em casa do dirigente
Álvaro Braga e sempre acompanhado por guarda-costas quando estava na rua devido
ao perigo de ser sequestrado até se estrear pelo FC
Porto, lá conseguiu rescindir com justa causa, alegando motivos
psicológicos. “Foi a primeira e única vez que alguém conseguiu ter sucesso com
este tipo de alegação. Em resumo: se eu ficasse no Sporting
podia dar em louco. O argumento era esse. E resultou”, escreveu no livro El
Portugués.
“Foram três meses diabólicos.
Andava num estando de completa ansiedade, mas o FC
Porto acabou por ser a melhor decisão da minha vida profissional. Foi
naquele clube que explodi para o mundo do futebol. Ganhei muitos títulos e
sagrei-me campeão europeu. Teria continuado em Alvalade
noutras condições, mas não fui respeitado como merecia. As pessoas do FC
Porto acreditaram no meu potencial. Contrataram-me para jogar. Para ganhar.
Não queriam emprestar-me a outros clubes”, prosseguiu.
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