domingo, 31 de maio de 2020

Muacir: "Amora tinha equipa valiosa mas as coisas não funcionaram"

Muacir marcou três golos em 14 jogos pelo Amora em 2019-20
Protagonista de um percurso ascendente no futebol português, desde a II Divisão Distrital da AF Braga ao Campeonato de Portugal, Muacir começou 2019-20 ao serviço do Pedras Salgadas, mas reforçou o Amora logo nos primeiros meses da temporada, mas uma infeção na córnea afastou-lhe dos relvados durante mês e meio e retirou-lhe confiança.

Em entrevista, este avançado de elevada estatura (1,91 m) filho de mãe angolana e pai guineense passa a carreira em revista e traça os objetivos para os próximos anos.



ROMILSON TEIXEIRA - Dividiu a última época entre Pedras Salgadas e Amora, ambos no Campeonato de Portugal. Que análise faz à sua temporada?
MUACIR - Fui para o Amora praticamente no início do campeonato, logo na 4.ª jornada. Felizmente comecei logo com a titularidade e um golo. Consegui ter uma sequência boa nesses primeiros cinco jogos pelo Amora, nos quais fiz três golos e acabei por ter uma grave infeção na córnea, que me impossibilitou de ver de uma das vistas durante sensivelmente uma semana e que me afastou dos relvados cerca de mês e meio, devido ao lento processo de recuperação de visão. Quando voltei, não foi fácil recuperar os mesmos níveis de confiança. Fico, claramente, com uma sensação de insatisfação porque creio que, a nível pessoal, passou ao lado de ser a época que prometia ser, dado o bom início.

O Amora viveu uma época atribulada, com três treinadores, mas conseguiu acabar a meio da tabela na Série D do Campeonato de Portugal. Que balanço faz da temporada dos amorenses, apesar de já ter chegado ao clube com o campeonato em andamento?
Como disse, cheguei ao Amora ainda no início da época e o balanço acaba por ser semelhante ao balanço individual. Tínhamos uma equipa extremamente qualificada, mas por fatores do próprio futebol, as coisas não funcionaram. Muitas vezes, no futebol, e por isso é o desporto apaixonante que é, equipas de muita valia acabam por não encontrar uma sequência regular, a nível de resultados, por conta da falta de inspiração e foi o que aconteceu com a nossa equipa durante o decorrer de praticamente toda a época. Tive a felicidade, neste campeonato, de só jogar em equipas de muita qualidade e, a meu ver, o plantel do Amora desta temporada era o melhor e mais experiente em que estive mas, por infortúnio, as coisas nunca resultaram de forma sequencialmente positiva para nós. Por vezes, é assim.

Quais as diferenças entre os três treinadores que conheceu no Amora, Pedro Russiano, Tuck e Rui Narciso?
Muito sinceramente, tenho pena de não ter podido trabalhar mais tempo com cada um deles e sem dúvida que aprendi muito com cada um. Fica até difícil fazer uma avaliação justa pelo pouco tempo de trabalho com cada um.

“Adeptos do Amora mereciam mais”

Muacir festeja o golo apontado ao Fabril em outubro de 2019
O que distingue o Amora dos outros clubes que representou? Como é a estrutura e a massa adepta?
A principal diferença do Amora em comparação com os outros clubes que representei é, precisamente, a ambição e a vontade que os adeptos têm de comparecer e estar próximos do clube. Infelizmente, este ano não foi condizente com o que todos ambicionávamos. É uma massa adepta que comparece e é muito ambiciosa. Mereciam mais.

Já sabe onde vai jogar na próxima época?
Não. É uma questão que está a ser avaliada, mas que, para já, está em aberto, mediante as opções que já tenho ou as que podem ainda chegar.

Começou a jogar futebol na formação do Sp. Braga. Que recordações tem desses tempos?
Enquanto praticante deste desporto, as melhores. Fui muito feliz no Sporting Clube de Braga. Foram as primeiras experiências com o futebol, os primeiros ensinamentos, as primeiras amizades do futebol, os torneios fora do país e muitas histórias. Muito boas recordações. Felizmente, fui colega de equipa de muito boa gente, no Sp. Braga. Ainda hoje tenho muito boa amizade com os companheiros e treinadores que me acompanharam nesse período, mesmo tendo já passado muitos anos.

Quando esteve no Sp. Braga que perspetivas tinha acerca da sua carreira? Acha que poderia estar noutros patamares?
Na altura era muito novo. Tinha muita crença nas minhas capacidades para ter sucesso no futebol mas nunca com a perspetiva e compromisso que tenho hoje, talvez por conta da imaturidade que advinha da idade muito jovem.

“O meu percurso tem sido sempre a subir”

Avançado marcou oito golos ao serviço do Amarante em 2018-19
Tem feito uma carreira sempre a subir, desde a II Distrital da AF Braga até ao Campeonato de Portugal. Até onde vai chegar o Muacir?
É, até, algo de que me orgulho muito. Felizmente o meu percurso tem sido sempre a subir. Claro que ambiciono ganhar títulos mas não tenho como não valorizar o facto de ter um percurso sempre em crescendo. Acredito muito nas minhas capacidades para chegar a patamares profissionais e é para além de um sonho, o meu grande objetivo. Enquanto o meu percurso e a minha condição física me mostrarem que há essa possibilidade, é o que vou ambicionar.

É sobrinho de Sabu, antigo defesa central de Vitória de Setúbal e Beira-Mar. Que memórias tem do seu tio?
O meu tio, irmão mais velho da minha mãe, jogou em Portugal numa altura muito anterior ao meu nascimento. Ele hoje não reside em Portugal, então acabo por não ter memórias dele. O que guardo dele são as histórias que a minha mãe me conta sobre ele e até mesmo as histórias que me contava o meu treinador no Sporting Clube de Braga. O meu treinador, à época, era o Lito, ex-jogador e internacional português, curiosamente natural de Angola, como o meu tio. Ele tinha sido também companheiro de equipa do meu tio e além disso tinham uma relação de amizade e ele falava-me muitas vezes da relação que partilhavam. Infelizmente, nunca privei com o meu tio Sabu pessoalmente.

Passou por vários clubes durante o seu percurso. Qual deles foi o mais marcante para si e por que motivo?
Sim, tive o prazer de jogar em alguns clubes e vou mencionar dois. Primeiramente, o Cabreiros, marcou porque foi o primeiro clube a dar-me um papel de destaque, creio que também por mérito meu, mais foi ali que se proporcionou muito do que tenho hoje. A nível de amizades, incutiram-me uma conduta vencedora e, felizmente, em três épocas que lá estive, acabámos o campeonato no pódio da classificação, tendo subido de divisão no último desses três anos. Fiz lá também muitos golos e principalmente amigos. Tínhamos o melhor balneário que alguma vez já experienciei. Sou muito grato por ter lá jogado.
Depois, é impossível para mim não mencionar o Amarante. Cumpriu com todas as expectativas que eu tinha, privei com ótimos jogadores e homens; um clube de muita tradição e com infraestruturas de top quando falamos deste campeonato; uma cidade incrível, super acolhedora, onde fui muito bem recebido por todos os adeptos e pessoas ligadas ao clube. Fico muito marcado pela minha passagem por Amarante, sobretudo pelo facto de ter sido a época em que senti que pratiquei o melhor futebol e por ter feito amizades com aqueles que, ainda hoje, considero serem alguns dos meus melhores amigos. São dois clubes que apoio e apoiarei sempre.

Muacir quando atuava nas camadas jovens do Sp. Braga
Quem é Muacir Cassamá fora dos relvados? Como se descreve?
Sou um rapaz calmo, gosto muito de rir e de fazer os outros rir. Passo grande parte do meu tempo ligado a tudo o que envolva futebol, estou sempre atento a notícias e ao desenvolver do futebol um pouco por todos os países. Também gosto muito de passar o tempo rodeado dos meus amigos mais chegados, estou constantemente a ouvir música nova, maioritariamente de hip-hop, é algo que também faço muito como hobby.

Nasceu em Braga. Como descreve a sua infância?
Quando falo da minha infância, falo da minha maior vaidade, que é ter vivido os meus primeiros 18 anos na Ponte Pedrinha, em Braga. Raramente estava em casa, fazia um pouco de tudo o que um rapaz 'de rua' faz. Muita asneira, muito futebol, muita traquinice de miúdo, muitas histórias e, sem dúvida, o melhor de tudo, um sentido de amizade e lealdade que eu acredito que, se não fosse a rua, eu não teria. Sou muito feliz por ter passado grande parte da minha infância e mesmo a adolescência com o meu grupo de amigos da rua. Os meus amigos chegados de há 18/19 anos são os meus de agora e isso é algo que não troco por nada. Sou amigo de longa data deles, dos irmãos deles, dos pais deles e isso é algo que me envaidece muito.

Qual a sua ligação com Angola?
Eu sou filho de mãe angolana, natural de Malanje. O meu pai, embora nascido na Guiné-Bissau, trabalhou sensivelmente oito anos em Angola. Por muita pena minha, nunca fui a Angola mas é algo que tenho também como um grande objetivo ou sonho, poder conhecer as minhas raízes. Gosto muito de tudo o que é a cultura angolana, principalmente comida e música. Curiosamente, na minha playlist de dia de jogo tenho muitas músicas do artista Paulo Flores. Aprecio muito.

“Jogar por Angola seria algo que eu e os meus familiares veríamos com muito agrado”

Tem o desejo de jogar por Angola?
Já cheguei a confessar ao meu empresário, numa conversa ou outra, que seria algo que eu e os meus familiares veríamos com muito agrado, embora nunca tenha sido contactado pela FAF. Confesso que seria um prazer, e que a minha família e eu ficaríamos muito felizes se isso acontecesse.

Acompanha o futebol angolano? Que visão tem sobre o Girabola e a seleção angolana?
Aqui em Portugal é-me um bocado difícil acompanhar os jogos com frequência mas sim, costumo ver os resumos dos jogos, quando possível, e estou sempre atualizado sobre a tabela classificativa do Girabola, inclusive depois de os campeonatos europeus terem parado, houve um período, creio que de uma semana, em que o Girabola ainda teve continuidade e aí houve a transmissão e a possibilidade de acompanhar um bocado mais. Penso que a seleção passa por um momento em que, comparativamente a outros países de África, há ainda um futebol não tão eficaz mas que com a vinda de jogadores experientes a nível europeu como Bastos Quissanga, Núrio, Bruno Gaspar, Wilson Eduardo, Fábio Abreu, entre outros, pode ajudar a acrescentar a qualidade necessária para se igualar a estas seleções.

Sempre sonhou em ser futebolista ou tinha outros sonhos em mente? Qual é o seu grande sonho enquanto jogador de futebol?
Sempre quis ser futebolista e acredito que, seja neste patamar ou num patamar profissional, vou continuar a jogar futebol por muitos mais anos e ligado ao futebol posteriormente.

Quais são os seus ídolos?
Sinceramente, não tenho uma referência que possa destacar. Se tivesse de destacar os que mais me atraíram para gostar futebol, escolho dois: o Robinho pela ousadia, qualidade e por trazer um pouco daquele futebol de rua para os grandes palcos e o Ronaldo Fenómeno, para mim é intocável, tirando Messi e Cristiano Ronaldo, é o melhor de todos, na minha conceção.

“Sou forte no jogo aéreo e de boa finalização com ambos os pés”

Muacir foi muito feliz no Cabreiros
Como se descreve enquanto jogador? Com que avançado top mundial acha que o seu futebol mais se assemelha?
Descrevo-me com um jogador forte no jogo aéreo e de boa finalização com ambos os pés. Sinceramente, não me consigo rever em nenhum jogador de top mundial.

Qual acha foi o momento mais alto da sua carreira? Como se imagina daqui a três anos?
De entre alguns momentos altos que tive tanto a nível coletivo e pessoal, não destaco o mais alto mas sim o mais bonito a nível individual, que foi o golo contra o Leixões, na época passada para a Taça de Portugal, jogando pelo Amarante. Foi, seguramente, um dos golos mais bonitos que marquei e teve também algum destaque por parte principais jornais a nível nacional como sendo um momento de grande inspiração, fico muito feliz por isso. Foi um momento em que tinha os meus amigos chegados e os meus dois irmãos mais velhos presentes e poder partilhar com eles esse momento é algo que me deixou igualmente feliz. Tenho como principal objetivo nos próximos três anos atingir um patamar profissional, seja em Portugal ou no estrangeiro.

Como está a viver esta fase de pandemia? O que faz para manter a forma física?
Tento levar toda esta situação com positivismo e focando com ainda mais seriedade nos propósitos e objetivos que tenho estipulados tanto dentro como fora do futebol, quer a nível pessoal como profissional. Como guia de treino, de momento sigo os vários planos de treino propostos pelo Madalena Ginásio, ginásio que frequentava em Amarante quando lá jogava, atentando e respeitando as limitações que toda esta situação nos impõe mas sempre com muita vontade de regressar ao que mais gosto, que é jogar futebol. Quero aproveitar para agradecer a oportunidade de conversar um bocado sobre mim e o meu percurso no futebol. Desejo as maiores felicidades e progressos.



Entrevista realizada por Romilson Teixeira




















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