Maria João de Figueiredo é a primeira mulher a liderar o clube |
Empresária de profissão, nasceu
no Estoril. "Mas sou uma mulher do Barreiro",
alerta. Aos 3 anos mudou-se para o concelho da margem sul do Tejo com os pais,
empreendedores no ramo da restauração. Maria João ajudava-os a fazer as contas
para os clientes e assim começou a paixão pelos números.
Depois licenciou-se em Gestão de
Empresas e começou a trabalhar na área da contabilidade, tendo posteriormente
aberto o seu próprio negócio. Paralelamente, foi estando ligada ao desporto.
Durante a adolescência começou a assistir aos jogos de basquetebol no antigo
pavilhão do Barreirense.
Mais tarde, como mãe, tornou-se "quase uma líder de claque" das
equipas dos filhos João e Miguel, hoje com 24 e 30 anos.
O envolvimento valeu-lhe convites
para integrar a mesa da assembleia geral e o conselho fiscal, mas neste ano deu
um passo em frente. "Partiu de mim, não fui desafiada por ninguém.
Considerei que era uma missão que tinha de cumprir agora. Um dia pensei assim:
se sou empresária e se gosto de trabalhar com equipas, porque não fazer isto
com a equipa certa no Barreirense,
com pessoas jovens e outras mais experientes? A minha primeira preocupação foi
perceber como os barreirenses iriam encarar a situação pelo facto de eu ser
mulher, mas as primeiras pessoas com quem falei reagiram muito bem e penso que
ao longo da minha vida dei provas de compromisso e de competência",
contou, em conversa numa sala no Campo da Verderena, o recinto que acolhe os
jogos das equipas de futebol desde a demolição do velhinho Campo D. Manuel de
Mello, no centro da cidade.
Reservas? "Zero. O país está a mudar"
Reservas quanto a ser mulher?
"Nada. Zero." "Tenho sentido o carinho das pessoas no Barreiro
e fora do Barreiro.
Toda a gente me tem dado os parabéns por ter tido esta atitude. É uma questão de
mentalidade e o nosso país está a mudar, o mundo é das mulheres", acredita
aquela que é desde 30 de julho uma das poucas mulheres a liderar um clube em
Portugal, incentivando a que mais se envolvam no movimento associativo:
"Falta nós decidirmos e querermos. Temos de ter a atitude de darmos o
passo. Para ser presidente, tenho de ter seis anos de sócia. Até tenho muitos
mais, mas porque é que não há mais mulheres como sócias? É um dos desafios que
vou fazer às mulheres do Barreiro:
serem sócias e acompanharem os maridos no futebol. Porque depois, se for à
procura de mulheres, muitas delas têm a competência, mas não são sócias."
Maria João é presidente desde 30 de julho |
Subidas e mais campos no horizonte
Os principais projetos de Maria
João de Figueiredo passam por "rentabilizar os espaços o melhor possível,
recuperar a mística do Barreirense
e trazer mais gente para os jogos, envolvendo as modalidades, para não haver
pessoas só a ver basquetebol e outras só a ver futebol ou futebol feminino ou
futsal, e a forma de comunicar para o exterior, para informar os sócios mais
depressa e de diversas maneiras".
Para o futebol sénior, que se
prepara para competir pela terceira temporada consecutiva na I
Divisão Distrital da Associação de Futebol de Setúbal, a ambição é o
regresso ao Campeonato de Portugal. "Tenho noção de que vai ser um campeonato
difícil, com adversários difíceis, mas a minha aposta vai ser criar as melhores
condições para que a equipa consiga subir de divisão", vincou, confessando
que criar uma SAD, seguindo o exemplo dos vizinhos Amora, Olímpico
Montijo, Pinhalnovense
e Cova
da Piedade, "é um assunto sensível".
"É prematuro falar sobre ter
ou não ter uma SAD. Estou aberta para ouvir as pessoas e falar, mas não vejo
neste momento que seja a prioridade do clube. Vender o clube nunca será a nossa
ideia, porque há a tal mística e história barreirense",
explica, assumindo que "é provável" que potenciais investidores lhe
batam à porta.
Subir, mas à I Liga, também é uma
ambição para a equipa feminina, pela qual tem um carinho especial. "Tenho
um carinho especial por serem mulheres, mas vou dedicar-me tanto às equipas
femininas como às masculinas", realçou, sem intenção de "revolucionar
tudo" no que toca a equidade: "Estamos no princípio do futebol
feminino. É tudo um processo de maturidade."
Dos relvados aos pavilhões, a
equipa de futsal também é para subir, ao contrário da de basquetebol, que nesta
época regressou ao patamar maior da modalidade. "Estamos onde devíamos
sempre ter estado. Há uns anos decidimos não estar, mas agora fizemos um
trabalho para estar. Estamos a formar uma equipa para alcançar o melhor lugar
na liga e a aposta é sobretudo na formação, porque temos um histórico e uma
cultura muito fortes no Barreiro
em torno do basquetebol", salientou, ambiciosa.
Além dos objetivos desportivos, a
nova presidente do Futebol
Clube Barreirense promete apostar forte no futebol de formação, uma das
bandeiras do clube. "No Campo da Verderena costumamos ter duas equipas a
treinar em meio campo. Com uma equipa a treinar num lado e outra a treinar
noutro, é óbvio que depois os resultados não vão ser tão bons como poderia ser expectável.
Queremos criar mais equipas femininas, mas o que nos bloqueia é o espaço",
explicou, com o intuito de criar mais infraestruturas, mas cuja localização
ainda não pode revelar.
Dinheiro de Cancelo para pagar dívidas
Maria João de Figueiredo quer ver mais mulheres sócias do Barreirense |
Curiosidades sobre o Barreirense
No início do século XX, um grupo
de aprendizes das oficinas dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste fundaram uma
agremiação a que deram o nome de Sport Recreativo Operário Barreirense, que foi
crescendo e beneficiando da extinção de outras coletividades para aumentar o
número de sócios. No entanto, dificuldades financeiras levaram o clube a
proceder a uma profunda reorganização interna e, em assembleia geral realizada
a 11 de abril de 1911, foi decidido que tendo como base esse clube nascesse o Foot-Ball
Club Barreirense.
Uma aventura europeia e duas vezes finalista do Campeonato de Portugal
Hoje nos campeonatos distritais,
o Barreirense
já foi um dos clubes mais importantes do futebol nacional. Na década de 1930,
foi duas vezes finalista do Campeonato de Portugal, perdendo em 1930 para o
Benfica no prolongamento e em 1934 para o Sporting. Na I Divisão também foi
presença assídua nos anos 1950, 1960 e 1970, tendo como melhor classificação o
quarto lugar obtido em 1969-70, que valeu a qualificação para a Taça das
Cidades com Feiras, precursora da antiga Taça UEFA e atualmente Liga Europa, em
que defrontou o Dínamo Zagreb: 2-0 no Barreiro,
1-6 na Croácia.
Se
olharmos aos craques que se formaram e passaram pelo Barreirense,
dava
para construir um plantel histórico de fazer inveja a muitos clubes
portugueses. As faces mais visíveis foram o guarda-redes Bento, o médio Carlos
Manuel, os extremos José Augusto e Fernando Chalana e mais recentemente o
lateral direito João Cancelo. Mas há mais: Adolfo Calisto, Carlos Gomes,
Frederico, Nelinho, Neno ou Arsénio. O treinador Paulo Fonseca também fez
grande parte da formação e da carreira de futebolista profissional no clube,
assim como o atual capitão do Belenenses SAD, Gonçalo Silva.
Estádio D. Manuel de Mello como símbolo da mística do clube mas
demolido em 2007
Depois de utilizar os campos do
Rosário, da Quinta José Alves, do Rossio e do Lumiar, o Barreirense
inaugurou em 1952 o Estádio D. Manuel de Mello, palco que se tornou o símbolo
da mística do clube durante cinco décadas. Com bancadas bastante próximas do
relvado e um peão no lado nascente, acompanhou a equipa de futebol na
consolidação como formação de I Divisão. Situado no centro da cidade, recebeu o
último jogo a 16 de setembro de 2007, antes de ser demolido. Agora, a casa do
futebol do Barreirense é o Campo da Verderena, onde antes funcionavam apenas os
escalões de formação.
Histórico do basquetebol português de regresso ao convívio dos grandes
Bicampeão nacional de basquetebol
em 1956-57 e 1957-58 e detentor de seis Taças de Portugal (1956-57, 1959-60,
1962-63, 1981-82, 1983-84 e 1984-85), o Barreirense
está de regresso à I Liga da modalidade, após ter-se sagrado campeão da
ProLiga. Entre 2000 e 2012 participou consecutivamente no primeiro escalão, mas
cessou atividade após a última presença, voltando à competição após um ano.
Entretanto, outro clube da cidade, o Galitos, ganhou protagonismo no
basquetebol, pelo que os dérbis que vão disputar serão dos grandes atrativos da
temporada.
Equipa de futsal arrancou na época passada e já somou uma subida de
divisão
A secção de futsal do Barreirense
apenas foi criada há cerca de um ano, mas garantiu a promoção aos campeonatos
nacionais logo na época de estreia. Para tal muito contribuiu uma
estrutura que esteve ligada durante várias épocas ao vizinho Fabril, com o
treinador Naná à cabeça, mas também vários jogadores que foram finalistas
da Taça de Portugal e participaram no primeiro escalão da modalidade em
2017-18. Depois de se sagrarem campeões distritais, os alvirrubros vão competir
nesta temporada na Série F da II Divisão Nacional, onde estão precisamente os
fabrilistas.
Link original: https://www.dn.pt/edicao-do-dia/07-set-2019/interior/a-mulher-que-e-presidente-do-barreirense-e-quer-recuperar-a-mistica--11233353.html
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