Foi a 18 de dezembro de 1921 que,
pela primeira vez, a
seleção
nacional portuguesa disputou um jogo. Foi uma esperada derrota às mãos da
vizinha
Espanha
(1-3), em
Madrid, depois de a escolha dos jogadores ter originado muita
polémica.
Esse primeiro dérbi ibérico
esteve para se realizar em 1912, mas houve falta de acordo, pois os espanhóis
queriam que os portugueses suportassem todas as despesas da partida. Oito anos
depois, e já com a
Federação Portuguesa de Futebol, então denominada União
Portuguesa de Futebol, fundada (a 31 de março de 1914), as negociações foram
retomadas. Depois de alguns adiamentos, o tão esperado encontro foi disputou-se
na capital espanhola.
Outro problema na antecâmara do
jogo de estreia foi a escolha de jogadores.
Augusto Sabbo, na altura treinador
do
Sporting,
ficou responsável pela convocatória e decidiu chamar
Francisco Pereira, do
Belenenses,
o que muito questionado pela imprensa. O atleta acabou por renunciar,
originando uma onda de solidariedade entre os
azuis
que levou também às renúncias do irmão
Artur José Pereira, considerado o melhor
jogador português naquele tempo, e
Alberto Rio.
Entretanto, Sabbo demitiu-se e os
dirigentes da
União Portuguesa de Futebol nomearam uma comissão formada por Carlos
Vilar, Pedro Del Negro, Reis Gonçalves, Virgílio Paula, Plácido Duro e Júlio de
Araújo, que pertenciam à
Associação
de Futebol de Lisboa. Quem não gostou dessa opção foram os clubes da
Associação
de Futebol do Porto, nomeadamente o
FC
Porto, até porque a nova convocatória só incluiu um jogador de emblemas nortenhos,
Artur Augusto, que pertencia precisamente aos
portistas.
E, mesmo nesse caso, os
dragões
defendiam que o futebolista em causa tinha sido chamado por ter nascido em…
Lisboa. À revelia dos dirigentes portuenses, que haviam decretado a ausência
dos seus atletas, o avançado acabou por se juntar à
seleção
nacional, que no entender dos responsáveis da
AF
Porto se tratava de uma seleção de… Lisboa.
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| O primeiro onze da equipa das quinas |
Foi então com uma equipa composta
por quatro jogadores do
Casa
Pia, entre os quais o capitão
Cândido
de Oliveira (mas também António Pinho, António Augusto Lopes e José Maria
Gralha), e trajada por motivos políticos com o equipamento preto do
Casa
Pia, que a
seleção
partiu para Madrid, onde, no campo pelado Martínez Campos, propriedade do
Racing de Madrid (clube extinto em 1977), foi derrotada pela vizinha
Espanha.
“Ainda conheci o António Pinho,
que na altura foi considerado o melhor defesa direito da Europa, e um dia
explicou-me que o problema foi resolvido pelo
Ribeiro
dos Reis e o
Cândido
de Oliveira. O preto e branco eram as cores da cidade de Lisboa e só havia
um jogador do
FC
Porto, que era o Alberto Augusto. Havia jogadores que não queriam jogar com
as cores da República, o verde e o encarnado. A implantação da República
Portuguesa tinha sido há 11 anos e provavelmente havia elementos na equipa que
eram monárquicos. Foi quase um ato político, acrescido do facto de haver seis
casapianos na
seleção,
embora dois estivessem no
Benfica”,
explicou à
Rádio
Renascença, em 2021, o vogal da atual direção do
Casa
Pia, Hélder Tavares.
A
seleção
portuguesa, que se queixava de um terreno de jogo muito estreito, já perdia
por 2-0 a meio da primeira parte, com golos de Manuel Meana (20 minutos) e
Paulino Alcántara (23’), com o segundo a bisar no início do segundo tempo (50’).
Depois veio o momento de glória da
equipa
das quinas, construído por dois irmãos: o portista Artur Augusto – o tal
que se juntou à revelia dos dirigentes portuenses – sofreu o penálti e o
benfiquista
Alberto
Augusto bateu o mítico
Ricardo Zamora, que ainda hoje dá nome ao troféu de
melhor guarda-redes da
Liga
espanhola, para marcar aquele que foi o primeiro golo de sempre da
seleção
nacional.
Há órgãos de comunicação social
que dizem que dessa equipa fazia parte o jogador mais novo de sempre a atuar
com as quinas ao peito, José Gralha, mas o futebolista casapiano tinha 22 anos
e não 16, como erradamente indicam, aquando da realização do jogo. O mais jovem
dessa primeira
seleção
nacional era precisamente Artur Augusto (17 anos, nove meses e três dias), que
deteve o recorde de precocidade até 27 de agosto de 1983, quando foi batido por
Paulo
Futre (17 anos, seis meses e 21 dias).
Mas as curiosidades não ficam por
aqui. Dois meses antes, outro dos jogadores dessa equipa, o defesa
sportinguista
Jorge
Vieira, tornou-se o primeiro árbitro português a apitar um jogo
internacional, um
Espanha-
Bélgica
(2-0), em Bilbau. Outro defesa leonino, João Francisco, viria a ser, quatro
anos depois, o marcador do golo da primeira vitória de
Portugal,
em 1925, frente à
Itália
(1-0) no Estádio do Lumiar.
Dessa equipa também faziam parte
o guarda-redes Carlos Guimarães (CIF), por inerência o primeiro a defender as
redes nacionais; o avançado benfiquista
Ribeiro
dos Reis, um casapiano que mais de duas décadas depois foi um dos fundadores do
jornal A Bola, juntamente com
Cândido
de Oliveira; e o médio benfiquista Vítor Gonçalves, também casapiano e pai
de Vasco Gonçalves, um dos militares de Abril, que se tornou primeiro-ministro
dos II, III, IV e V governos provisórios, no período do
PREC.
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