Contratado ao Torino por seis milhões de euros, o médio Soualiho Meïté vai tornar-se no oitavo jogador francês a atuar
pelo Benfica,
acrescentando o seu nome a uma história ainda muito recente, iniciada já no
século XXI, numa altura em que a seleção de França já tinha vencido dois Campeonatos da Europa (1984 e 2000) e um Mundial (1998), ainda não teve episódios particularmente felizes. Afinal, só dois dos sete gauleses que jogaram de águia
ao peito foram campeões. E nem esses nem os outros cinco foram titulares
indiscutíveis.
Ainda assim, em 1994 reforçou os encarnados um reforço francês de peso, o médio Jean-Jacques Eydelie, mas que não chegou a estrear-se oficialmente pelo emblema lisboeta. Campeão europeu pelo Marselha em 1993, quando se transferiu para o Benfica vinha de um ano sem jogar, devido ao envolvimento num caso de manipulação de resultados que lhe valeu ainda 17 dias na cadeia.
Precisamente no ano em que o Benfica
comemorou o centenário, em 2004, chegou à Luz
não um, mas dois futebolistas franceses. O primeiro, o guarda-redes Yannick, era uma espécie de namoro
antigo dos encarnados,
que há várias épocas perseguiam o guardião que desde 2001 brilhava na baliza do
Alverca,
depois de ter entrado em Portugal pela porta da Naval no ano anterior.
Yannick Quesnel |
“A hipótese surgiu já no final da
primeira época que eu fiz no Alverca,
mas faltava pagar uma percentagem da transferência à Naval. A Naval pediu
dinheiro, a tal metade da transferência, mas não houve acordo entre Alverca,
Benfica
e Naval. Em 2004, no final da temporada acabámos por descer, mas fiquei livre,
o meu contrato terminava, e houve uma proposta do Vitória
de Guimarães, com o Jorge
Jesus, e também do Benfica,
com o José Veiga. A minha ideia era ir para o Vitória,
mas a situação era complicada, porque o Palatsi ainda estava lá, e enquanto ele
não saísse, não havia espaço para assinar, e assim fui para o Benfica,
que foi mais rápido a tratar de tudo”, afirmou em janeiro de 2017, em
entrevista ao blogue Prémio Carreira.
Embora Giovanni Trapattoni também
contasse com o até então titular Moreira e o recém-contratado Quim, o treinador
italiano apostou no guardião natural de Libourne, no sudoeste francês, para o
primeiro jogo da época, frente ao Anderlecht,
relativo à primeira-mão da terceira pré-eliminatória de acesso à fase de grupos
da Liga
dos Campeões. O Benfica
venceu (1-0) e Yannick não sofreu golos, mas o guarda-redes gaulês não voltou a
jogar de águia
ao peito.
“Esperava jogar
mais, mas fui logo enganado pelo sistema. Estavam lá dois bons guarda-redes
internacionais, Quim e Moreira, que voltavam do Euro com a Seleção. Fiz a
pré-temporada como titular, joguei na primeira-mão da Liga
dos Campeões e na segunda-mão, fomos ao Anderlecht
disputar a eliminatória, com o mister Trapattoni. Na véspera fizemos um treino
para preparar a equipa, eu estava como titular, juntamente com cinco outros
jogadores. Fizemos um bom treino e recebemos os últimos conselhos do mister
para o jogo. Estávamos todos preparado para disputar esse jogo importante. Na
tarde do jogo, tivemos a habitual palestra, e quando chegamos lá, o mister e o
José Veiga estavam a falar e pediram-nos para esperar mais dez minutos lá fora,
que foi o que fizemos. Quando descobrimos a equipa que ia jogar, foi uma
surpresa e uma grande deceção para seis jogadores, incluindo eu. Não era o
Trapattoni que mandava, mas sim o José Veiga, que foi quem mudou a equipa toda,
e resultou numa derrota por 3-0, como se devem recordar. Em Lisboa, falei com o
Trapattoni, e o seu discurso foi mesmo este: ‘sabes Yannick, não tenho nenhuma
obrigação para dar razões do quem joga ou não, mas tu és uma boa pessoa, então,
aqui não posso fazer como eu quero e, por causa disso, não vais jogar muito’.
Depois tentei falar com o José Veiga, mas ele dizia mentira sobre mentira...”,
contou.
A meio dessa época foi emprestado
ao Estoril
e na temporada seguinte foi cedido ao Marselha, terminando depois a ligação
contratual ao Benfica.
Manuel dos Santos |
Também no verão de 2004 reforçou
o Benfica
o lateral esquerdo Manuel dos Santos
que, curiosamente, até nasceu na cidade de Praia, em Cabo
Verde. Titularíssimo no Marselha nas quatro épocas anteriores, tinha sido
escolhido para o melhor onze do ano da Ligue
1 e pré-convocado para a seleção francesa em 2003, além de ter tido um
importante na caminhada do emblema do sul de França
até à final da Taça
UEFA no ano seguinte.
“Na altura conheci um primo de
José Veiga, que lhe deu o meu número. Falei com o Veiga e foi ele quem me
convenceu. Já levava quatro anos de Marselha e estava com 29 de idade. Eu
queria jogar no estrangeiro. Mas até ao dia em que falei com Veiga, não pensava
jogar no Benfica
ou Portugal. Na verdade, quando comecei a falar com ele, passados dois minutos
percebi que podia ser muito bom para mim”, recordou ao Maisfutebol
em março de 2020.
Porém, na Luz
teve de lidar com a concorrência do grego Fyssas, que tinha acabado de se
sagrar campeão europeu, e por isso nunca foi titular indiscutível, ainda que em
2004-05 tivesse jogado mais nove jogos – 34 contra 25 – do que o helénico, numa
época em que um golo ao Heerenveen num jogo da Taça
UEFA e na qual se sagrou campeão nacional – desde 1993-94 que as águias
não conquistavam o título.
“O meu passado no Benfica
foi muito bom, fomos campeões, fiz amizade com Luisão, Geovanni, Nuno Gomes,
Simão… é uma parte da minha vida que fica gravada. Foi um momento alto na
carreira, até porque já conhecia o Benfica,
em Cabo
Verde só se fala no Benfica,
por isso, jogar lá era bom, ser campeão foi maravilhoso”, contou.
“Passei um ano com Trapattoni,
como homem era uma pessoa agradável e gentil, como treinador duro e exigente. Mas
essa exigência levou-nos ao título. O FC
Porto não fez um grande campeonato, mas nós concentrámo-nos nos nossos
jogos. Em certos momentos, o Benfica
não jogou muito bem, mas no final, o que fica marcado na história é que foi o Benfica
quem foi campeão e só isso é que importa”, acrescentou.
Na temporada seguinte Fyssas
deixou a Luz,
mas chegou o brasileiro Léo, que assumiu a titularidade de forma mais efetiva
já sob o comando técnico de Ronald Koeman. Após quatro jogos até dezembro de
2005, Dos Santos voltou ao futebol
francês para defender a camisola do Mónaco,
clube que já tinha representado ao mais alto nível entre 1994 e 1997.
“Os adeptos cantam do primeiro
minuto até ao final, são fanáticos, não encontrei isto em mais nenhum lado. No Benfica,
os adeptos têm mais proximidade com os jogadores, têm mais respeito, mais
carinho”, confessou.
Laurent Robert |
Quem ainda esteve quase a
coincidir no plantel benfiquista
com Manuel dos Santos foi o extremo Laurent
Robert, que chegou à Luz
em janeiro de 2006 aos 30 anos, com o estatuto de internacional francês, tendo
inclusivamente vencido a Taça das Confederações 2001, e depois de passagens
bem-sucedidas por Montpellier, Paris Saint-Germain e Newcastle.
Depois de ter jogado no
Portsmouth na primeira metade da temporada não entrou de caras no onze de
Ronald Koeman, mas foi bastante utilizado, tendo atuado em 20 jogos (12 a
titular) e marcou três golos, um dos quais numa vitória caseira sobre o FC
Porto.
“É uma grande memória que eu
tenho do futebol”, começou por contar ao Maisfutebol,
acerca do grande golo de livre direto que marcou a Vítor Baía no clássico. “Joguei
sobre a direita nesse jogo, numa diagonal sofri uma falta e marquei o livre. A
bola saiu forte, bateu no chão e passou por cima do Vítor Baía. Acho que ele
não foi muito feliz naquela jogada. É um grande jogo, o maior clássico em
Portugal, por isso lembro-me bem do jogo, da atmosfera, do golo, de tudo”,
acrescentou.
Ainda assim, não ficou no plantel
na época seguinte, acabando por rumar aos espanhóis do Levante. “Todas as
semanas vou ver os resultados. Serei sempre adepto e espero que o Benfica
seja campeão. Seria uma festa muito grande. Quando joguei aí estávamos numa
fase de mudança. Sei que agora o Benfica
tem tudo e fico feliz. É o maior clube em Portugal”, revelou, em dezembro de 2009.
Hassan Yebda |
Dois anos depois de um
guarda-redes, um defesa e um atacante, no verão de 2008 o Benfica
reforçou-se com um médio francês que, entretanto, se tornou internacional argelino:
Hassan Yebda. Nascido em Saint-Maurice,
nos subúrbios de Paris, e internacional gaulês pelas seleções jovens, chegou à Luz
proveniente do Le Mans.
Embora fosse um desconhecido e
tivesse a concorrência de jogadores como Katsouranis, Rúben
Amorim ou Carlos Martins, Quique Flores deu-lhe a titularidade durante praticamente
toda a temporada 2008-09, tendo atuado num total de 34 jogos (26 a titular) e
marcou dois golos, um dos quais num empate no Dragão
frente ao FC
Porto. “Começámos bem o campeonato e depois de fevereiro começámos a jogar
de uma maneira diferente e perdemos muitos pontos. O final da época não acabou
bem. Sabemos que uma época se joga do início ao fim e nós não acabámos bem,
acabou por não ser uma boa época”, afirmou ao zerozero
em agosto de 2020.
A época seguinte ainda foi
iniciada de águia
ao peito, mas após ter sido suplente não utilizado na jornada inaugural foi
emprestado aos ingleses do Portsmouth. Depois foi novamente cedido, ao Nápoles,
e, entretanto, assinou a título definitivo pelo Granada.
“As coisas correram-me bem lá.
Gostei dos jogadores, do staff e dos dirigentes com quem trabalhei. Tenho muito
respeito pelo clube. Cometi o erro de deixar o Benfica.
Fui eu que forcei. Jesus
queria muito que ficasse. Foi mesmo um erro”, disse em entrevista ao portal sfr.fr em outubro de 2016.
Lionel Carole |
Se Yebda saiu com Jorge
Jesus, foi com o técnico amadorense que em janeiro de 2011 chegou o lateral
esquerdo Lionel Carole, na altura um
menino de 19 anos que era presença habitual nas seleções jovens francesas.
Contratado ao Nantes como uma
aposta de futuro, mas também para fazer sombra a Fábio
Coentrão, foi utilizado em seis jogos no campeonato (todos como titular) na
reta final de 2010-11 e na época seguinte foi emprestado ao Sedan.
Em 2012-13 voltou à Luz,
tendo atuado por 39 vezes e marcado um golo pela equipa B, mas depois terminou
a ligação com os encarnados
para rumar ao Troyes, tendo posteriormente chegado a clubes como Galatasaray
e Sevilha.
Passagem mais discreta pela Luz
– ou melhor, pelo Seixal – foi a do médio Logan
Martin, que em 2015-16 disputou 19 jogos e marcou quatro golos pelos
juniores benfiquistas.
Filho de um antigo defesa de Mónaco
e Marselha, Lilian Martin, chegou proveniente do Cannes e depois rumou ao Génova.
Aos 22 anos, está sem clube desde 2018, quando representou os escoceses do Dundee
United.
Sébastien Corchia |
Seguiu-se um lateral direito com estatuto de internacional francês e que
prometia finalmente destronar André Almeida: Sébastien Corchia. Depois de épocas extraordinárias ao serviço do
Lille, o defesa natural de Noisy-le-Sec, arredores de Paris, sentiu algumas
dificuldades em impor-se no Sevilha e por isso foi emprestado pelos andaluzes
ao Benfica
no verão de 2018.
Porém, também não foi feliz em
Lisboa, não indo além de oito jogos (sete a titular) pela equipa principal e
dois pelos bês. Ainda assim, sagrou-se campeão nacional. “Foi um prazer jogar
neste Estádio lendário e nesta cidade linda. Quero agradecer a todos os benfiquistas,
vocês foram espetaculares. Foi fantástico poder ganhar um Campeonato ao serviço
deste grande clube”, afirmou, aquando da despedida da Luz.
Depois voltou ao Sevilha, que o
emprestou ao Espanyol, mas ainda não voltou a reencontrar a felicidade.
Todibo |
Por último - antes de Meité, claro -, reforçou o Benfica no verão de 2019 o defesa central Jean-Clair Todibo, por empréstimo do Barcelona. Embora tivesse chegado à Luz proveniente de um dos maiores clubes do planeta e de ter no currículo cinco internacionalizações pelos sub-20 de França e passagens por Toulouse e Schalke 04, aterrou em Lisboa lesionado e acabou por só se estrear em janeiro, numa altura em que estava já de saída. Depois de apenas dois jogos realizados às ordens de Jorge Jesus, um para a Taça de Portugal e outro para a Taça da Liga, foi recambiado para o Barça, que o cedeu de imediato aos gauleses do Nice.
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