Em 1986 jogava no Vita Club, do
seu país, e tinha tudo encaminhado para jogar no Nice, mas o empresário
português Valter Ferreira desviou-o para a Cidade-Berço, tendo fugido de barco
durante a noite para o Congo-Brazzaville, de onde voou para Portugal. “Dissemos
logo que não havia problema. E ainda bem que ficámos, o Vitória foi
das melhores coisas que me aconteceu na vida”, contou ao Maisfutebol em
julho de 2020. No Dom Afonso Henriques encontrou
dois compatriotas, Basaúla e Monduone N’Kama, e primou sempre por uma grande
regularidade, ao ponto de em 1990-91 ter atuado nas 38 jornadas do campeonato.
Antes, no final da temporada
1987-88, nasceu o Caso N’Dinga. O Vitória
fechou o campeonato dessa época com 33 pontos e conseguiu a permanência, ao
passo que a Académica,
com igual número de pontos, desceu à II Divisão, devido ao critério de
desempate que era o confronto direto. Para essa vantagem vimaranense,
muito contribuiu o 3-0 em Guimarães na 34.ª jornada, no qual foi utilizado N’Dinga.
A Académica
queixou-se à Federação Portuguesa de Futebol (FPF) que o jogador estava
irregularmente inscrito, falando num carimbo falso. As queixas dos estudantes
caíram em saco roto, apesar de a novela se ter arrastado durante todo o verão
de 1988, mas o caso voltou à baila oito anos depois. António Oliveira, que na
temporada 1987-88 orientou tanto o Vitória
de Guimarães (entre outubro de 1987 e março de 1988) como a Académica
(entre março e junho de 1988), decidiu abrir a boca a 9 de outubro de 1996 numa
altura em que já era treinador do FC
Porto, numa conversa com jornalistas que considerava ser off the record.
Capa do Record de 23 de outubro de 1996
O problema foi que o Record
decidiu contar tudo, tintim por tintim, na edição de 23 de outubro de 1996, que
vendeu 200 mil exemplares. Na capa, as palavras de Oliveira: “Estive na maior
fraude do futebol.”
“Desce-se um clube de divisão,
desgraça-se uma instituição, porque um gajo se lembrou de fazer uma artimanha
com um carimbo? (...) Então e eu ando aqui a dormir? Eu não estive dos dois
lados? Eu estou metido num processo em dois lados, que é a maior fraude do
futebol, com prejuízos gravíssimos, e chego ao outro lado e nem uma palavra.
Calei-me que nem um rato”, podia ler-se no interior do jornal. “O carimbo do N´Dinga custou-me
uns milhares de dólares, está no meu cofre, vendido pelo senhor Valter
Ferreira. Tenho-os todos na mão”, afirmou Oliveira nessa conversa, citado em
cinco páginas de declarações. Sete dos oito jornalistas que presenciaram
as declarações do treinador consideraram as mesmas protegidas por um acordo de
confidencialidade, mas o oitavo, Vítor Pinto (Record), disse haver
interesse público na divulgação da conversa, tendo transcrito todo o diálogo ipsis
verbis. Oliveira ainda chegou a negar ter
conversado com quem quer que fosse e até disse que desconhecia se estava em
Portugal no tal dia 9 de outubro, mas já com todo o diálogo publicado mudou o
discurso e foi à RTP afirmar que não havia autorizado a divulgação das
suas palavras e que tinha pedido a todos os jornalistas que desligassem os
gravadores. Apesar da situação, Oliveira mostrou-se
bem-humorado quando apareceu numa conferência de imprensa do FC
Porto: “Tinha pensado em pedir uma revista pormenorizada a todos os membros
da imprensa, mas lembrei-me que esta conversa seria em on.” No mesmo
dia, 25 de outubro, Pinto
da Costa ameaçou fechar as portas do Estádio das Antas aos jornalistas “filhos
da PIDE”.
Indignação dos adeptos da Académica visou Oliveira
A Académica,
que foi recorrendo a várias instâncias, queixou-se à Procuradoria-Geral da
República e à FPF por danos desportivos e patrimoniais. Já o Vitória
ameaçou processar Oliveira se este não mostrasse o carimbo, tal como o
empresário Valter Ferreira. Mas nada disto foi avante.
O caso só foi encerrado em julho
de 2003, quando a Académica
perdeu o processo por o Supremo Tribunal da Relação ter aceitado o recurso
apresentado pela FPF, ficando assim sem direito a uma indemnização de cerca de
3,5 milhões de euros. A polémica despoletou ainda uma rivalidade
entre Vitória
e Académica,
que só foi encerrada quando no verão de 2007 quando os então presidentes, Emílio
Macedo e José Eduardo Simões, enterraram o machado de guerra com uma sardinhada
após um jogo de pré-época.
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