Por um Ronaldo à Fullkrug

Ronaldo desperdiçou um penálti frente à Eslovénia

Foi muito constrangedor, até para os mais fiéis de Cristiano Ronaldo, o desespero pelo golo que o capitão da seleção nacional revelou em campo durante a partida com a Eslovénia. Os quatros livres diretos foram todos dele, até um de ângulo muito difícil quando Bernardo Silva já se preparava para cruzar para o interior da área. Pouco importa se é mais de longe, mais de perto, mais encostado à esquerda ou à direita, é tudo dele e em força. Se não dá para rematar com força e por cima da barreira, por a distância ser curta, é em força para o lado do guarda-redes. Oblak agradecia. O penálti de que Portugal dispôs, independentemente de haver outro jogador em campo (Bruno Fernandes) com uma taxa de sucesso superior (90% contra 84%) e de CR7 estar extremamente ansioso, também foi do capitão. Daqui a uns dez anos talvez saberemos o quão politicamente corretos estão a ser os seus companheiros de seleção quando falam dele, mas acredito que Bernardo Silva, Bruno Fernandes ou João Cancelo não concordem com esse Ronaldocentrismo.    

 
Às tantas, havia um jogo dentro do próprio jogo. O Portugal-Eslovénia e a procura do golo por parte do madeirense. Aquele Ronaldo altruísta que vimos durante a fase de qualificação e as partidas de preparação desapareceu. Deu lugar a um avançado com uma ansiedade a roçar o desespero, obcecado pelo golo que tarda em aparecer.
 
No banco, Roberto Martínez assistia a tudo, mas não retirou o camisola n.º 7 de campo. Porque, apesar de tudo, Ronaldo ainda é o melhor avançado português, o que garante mais presença na área, e provavelmente perderia mais do que ganhava se o substituísse.
 
Mas isso não significa que o ponta de lança de 39 anos não possa ser melhor gerido, sobretudo numa fase em que o Campeonato da Europa vai afunilando e praticamente já só está em prova a nata do velho continente. Nos quartos de final, Ronaldo vai bater de frente com um dos melhores centrais da atualidade, Saliba, e um Upamecano que é muitas vezes titular num Bayern. Ambos são fortes na marcação, nos duelos e rápidos.  Incomparavelmente mais difíceis de ultrapassar do que quaisquer outros centrais que o português já apanhou neste Europeu. Será inteligente colocar-lhes Ronaldo à frente desde o apito inicial? Ou será mais indicado fazer entrar CR7 quando Saliba e Upamecano já se apresentarem algo desgastados?
 
Ainda que com um estatuto e números muito inferiores, vejo Cristiano Ronaldo ter um papel à imagem de Niclas Füllkrug na Alemanha. Quem o tem visto no Europeu certamente terá ficado com a imagem de um ponta de lança letal, mas se há coisa que o avançado do Borussia Dortmund tem mostrado ao longo da época é que é perdulário e que precisa de muitas ocasiões para marcar. 15 golos em 43 jogos pelo clube nesta temporada está longe de ser um registo brilhante. Na Bundesliga necessitou de 58 remates para fazer 12 golos, com a ineficácia a revelar-se por o número de golos esperados (12,86) ser superior à dos golos marcados.
 
Apesar de já ter faturado por duas vezes no Europeu, Julian Nagelsmann resiste em dar-lhe a titularidade. Porquê? Porque, com cinco substituições, é cada vez mais possível desenhar uma estratégia que inclui os suplentes. Se Fullkrug fosse titular, seria difícil substitui-lo se as coisas não estivessem a correr bem à seleção germânica. Assim, está guardado no banco para atacar na hora certa, seja para acrescentar presença na área numa situação de desvantagem no resultado, como frente à Suíça, seja para segurar a bola e tentar matar o jogo, como diante da Escócia.
 
Faltará, talvez, que Martínez se convença e que Cristiano Ronaldo seja convencido de que começar um encontro no banco não é propriamente estar a relega-lo para segundo plano. É sim tirar o melhor partido dele, no contexto ideal.