O génio excêntrico de FC Porto e Sporting que chegou a selecionador. Quem se lembra de Oliveira?
António Oliveira brilhou de leão e dragão ao peito
Um dos jogadores mais geniais da
história do futebol português, um criativo que gostava de atuar solto atrás dos
avançados, onde podia dar largas à imaginação e talento que possuía. Um génio
que, assegura quem o viu jogar, poderia ter ido mais longe na carreira não
fosse a personalidade difícil que faziam dele uma espécie de enfant terrible.
Aos 13 anos já treinava com os
seniores do Penafiel,
mas como o clube
duriense não tinha camadas jovens, resolveu mudar-se para o FC
Porto, emblema no qual se começou a destacar como… lateral esquerdo. “Vi
pela primeira vez o António a jogar nos nossos juniores, como defesa esquerdo!
Eu, treinador de bancada, pensava que ele tinha talento a mais para jogar
naquele posto. Contratado para treinador o José
Maria Pedroto, após analisarmos o nosso plantel, ele foi da mesma opinião e
disse-me que iria fazer dele, como avançado, um jogador que ficaria na nossa
história. E mais do que ficar na nossa história ficou na do futebol português”,
contou Pinto
da Costa no livro Azul até ao Fim. António Oliveira estreou-se pela
equipa principal dos dragões
a 2 de maio de 1971, quando tinha apenas 18 anos, e foi ganhando paulatinamente
o seu espaço até se tornar numa das principais figuras dos azuis
e brancos, o maestro e capitão da equipa que em 1977-78 quebrou o longo
jejum de 19 anos sem o título nacional – na época anterior havia contribuído
para a conquista da Taça
de Portugal. Depois de ter ajudado o FC
Porto a sagrar-se bicampeão em 1978-79, viveu a primeira das suas
polémicas. Numa altura em que Portugal começava a exportar alguns futebolistas,
como João
Alves, Norton de Matos, Seninho e Vítor Baptista, António Oliveira sentiu o
chamamento do estrangeiro e sobretudo do dinheiro, tendo assinado pelo Betis,
numa transferência que rendeu 36 mil contos ao emblema
da Invicta. A Federação Portuguesa de Futebol ainda tentou intrometer-se para
impedir que o jogador saísse, temendo uma debandada geral, mas a secretária de
Estado do Trabalho, Manuela Aguiar, interveio para defender os futebolistas no
direito à emigração por melhores condições laborais, permitindo que o médio
ofensivo fosse para Sevilha ganhar um salário mensal de 60 contos.
No entanto, Oliveira não se
adaptou a Espanha, tendo pedido para regressar a casa ao fim de meio ano, após
apenas dez jogos realizados pelos béticos.
“A minha visão do mundo é nitidamente provinciana – foi a conclusão a que
cheguei depois de ter vivido seis meses de solidão espiritual”, resumiu. Para permitir o regresso às
Antas, o presidente do Betis
exigiu uma indemnização de 6000 contos ao FC
Porto. O presidente portista Américo de Sá hesitou e deixou Oliveira à
beira de um ataque de nervos, ao ponto de ter sido o próprio a predispor-se
para pagar esse valor do seu próprio bolso. Porém, no verão de 1980, numa
altura de alguma instabilidade no clube devido à luta de poderes entre Américo de
Sá e Pinto
da Costa, Oliveira saiu – quando já somava um total de 253 jogos e 92 golos
de dragão ao peito – e voltou ao Penafiel
para ter a sua primeira experiência como jogador-treinador, contribuindo para
um honroso 10.º lugar na época de estreia dos durienses
na I
Divisão.
Na temporada seguinte reforçou o Sporting
para formar um trio de ataque demolidor com Manuel
Fernandes e Rui
Jordão. Juntos marcaram quase 80 golos (Jordão
34, Oliveira 22 e Manuel
Fernandes 21) e conquistaram a dobradinha em 1981-82, apesar de não serem
propriamente os melhores amigos. O médio ofensivo falhou, devido a lesão, o
jogo do título, o dérbi com o Benfica
em Alvalade
– vitória por 3-1 com hat trick de Jordão
–, mas antes do encontro proferiu uma frase que ficou para sempre lapidada na
memória dos sportinguistas:
“Por cada leão que cair outro se levantará.” Nesse ano foi também distinguido
com o Prémio Stromp, na categoria Atleta Profissional. No início da época que se seguiu,
na sequência de um atribulado estágio de pré-temporada que resultou no despedimento
do técnico inglês Malcolm
Allison, o presidente João Rocha entregou a Oliveira o comando da equipa, passando
o médio a exercer a função de jogador-treinador. Foi assim que guiou os leões
à conquista da Supertaça
Cândido de Oliveira e aos quartos de final da Taça dos
Campeões Europeus, naquela que ainda hoje é a melhor campanha de sempre do
clube na competição. Contudo, a situação de
jogador-treinador nunca agradou às outras estrelas da equipa. Depois de uma
derrota pesada em Braga (0-3) em março de 1983 que coincidiu com uma lesão que
lhe exigiu um mês de repouso absoluto, Oliveira foi substituído interinamente
por Martinho Mateus no comando técnico até à chegada de Josef
Venglos, voltando depois a futebolista a tempo inteiro.
Haveria de permanecer em Alvalade
até ao verão de 1985, despedindo-se ao fim de 94 jogos e 42 golos, para viver uma
última experiência como jogador-treinador, no Marítimo,
aos 33 anos. Depois pendurou as botas, colocando
ponto final numa carreira que contemplou 24 internacionalizações e sete golos
pela seleção
nacional A, e dedicou-se a tempo inteiro às funções de treinador. Passou sem grande sucesso pelos
bancos de Vitória
de Guimarães, Académica,
seleção
nacional de sub-21, Gil
Vicente e Sp.
Braga, chegando a descer de divisão ao leme dos estudantes em 1987-88, mas
ainda assim foi convidado para assumir o cargo de selecionador nacional dos AA,
tendo qualificado a equipa
das quinas à fase final do Euro 1996
– após dez anos de ausência em fases finais – e guiado a seleção
aos quartos de final desse
Campeonato da Europa.
Após o torneio foi convidado por Pinto
da Costa para se tornar treinador do FC
Porto, tendo guiado os dragões
ao tri (1996-97) e ao tetra (1997-98) na sequência do único pentacampeonato do
futebol português, além de ter vencido uma Supertaça
Cândido de Oliveira (1996) e uma Taça
de Portugal (1997-98). No verão de 1998 alegou motivos
pessoais e familiares para deixar o comando técnico dos portistas, numa altura
em que tinha o seu nome associado aos casos Paula
e N’Dinga
e detinha, juntamente com o irmão Joaquim Oliveira, a Sportinveste, holding
do grupo formada nesse ano e da qual faziam parte, entre outras, Olivedesportos,
PPTV – Publicidade de Portugal, Jornalinveste (proprietária de O Jogo) e
participações na Sport TV e na Sportinveste Multimédia. Em 1998-99 teve uma fugaz
passagem pelo comando técnico do Betis,
abandonando o cargo ainda antes da época começar devido a um desentendimento
com o presidente. Depois de cerca de dois anos sem
treinador, voltou a exercer as funções de selecionador nacional em 2000.
Conseguiu qualificar a equipa
das quinas para o Mundial
2002 – após 16 anos de ausência de Portugal
em Campeonatos do Mundo –, mas não foi além da fase de grupos. A participação
portuguesa no torneio ficou ainda marcada por uma convocatória algo polémica,
com a inclusão de jogadores conceituados a viver momentos delicados na carreira
como Paulo Sousa ou Vítor
Baía, o teste positivo de Kenedy
num controlo antidoping e um estágio demasiado prolongado no continente
asiático. Nunca mais voltou a treinar, mas
não se afastou do futebol. Entre 2004 e 2007 foi presidente do Penafiel,
tendo convidado o velho conhecido Manuel
Fernandes para treinador, e mais recentemente foi apontado como possível
sucessor de Pinto
da Costa na presidência do FC
Porto.
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