Comitiva portuguesa de 15 atletas à partida para os Mundiais |
É no triplo salto que reside grande parte da esperança portuguesa em medalhas e finalistas nos Campeonatos do Mundo de atletismo, que vão disputar-se entre esta sexta-feira e 6 de outubro em Doha, capital do Qatar.
Entre os 15 atletas lusos estão cinco triplistas: Nelson Évora e Pedro Pichardo no lado masculino e Patrícia Mamona, Susana Costa e Evelise Veiga no setor feminino. "Vamos estar presentes com 15 atletas [menos cinco do que há dois anos] e acredito que estão preparados para fazer o melhor possível, uns com mais ambições do que outros, pelos seus resultados e desempenhos. Os atletas de triplo salto são alguns deles", começou por antever ao DN o diretor técnico nacional, José Santos. "Nestas alturas fala-se sempre em medalhas, mas as medalhas são sempre poucas para todos os países e para toda a gente. A marcha também é uma disciplina em que somos normalmente fortes", acrescenta o dirigente, que dá conta de um "contraste terrível" entre o muito calor que se faz sentir ao ar livre no Qatar e o muito frio dos hotéis.
Para o jornalista especialista em atletismo e autor do site Atletismo Estatística, Manuel Arons de Carvalho, o "número limitado de atletas" que Portugal vai apresentar é um dado "negativo" e diz que o valor do atletismo português vai medir-se mais "em termos de número de finalistas" do que de medalhas. Ainda assim, aponta o "ex-cubano" Pedro Pichardo como "forte hipótese de medalha".
"O ouro será bastante difícil, porque os outros atletas são muito fortes, mas penso que irá ao pódio. O Nelson Évora também tem estado aquém daquilo que vale, mas ele normalmente supera-se sempre em grandes campeonatos, ainda que uma medalha agora pareça fora do alcance, pelo que penso que será bom se conseguir um lugar nos oito primeiros", frisou, à espera de ver Patrícia Mamona apenas entre as finalistas: "É outro nome sempre em voga nestes campeonatos. Não acredito que ela ganhe alguma medalha, mas é um pouco como o Nelson Évora. Será bom se ficar entre as oito finalistas."
Tal como José Santos, também Arons de Carvalho tem esperança numa medalha vinda da marcha, por parte de Inês Henriques na prova de 50 quilómetros. Afinal, a marchadora de Rio Maior vai defender o título mundial. Mas, avisa o jornalista, "outras atletas [as chinesas Liu Hong, Li Maocuo e Liang Rui, a italiana Eleonora Giorgi e a espanhola Júlia Takács] já fizeram melhor tempo do que ela e ela também já não é nova [39 anos] e de ano para ano vai tendo mais dificuldades".
O diretor técnico nacional diz que prefere não falar em número de medalhas "porque há sempre muitas coisas em jogo, muitos fatores", e diz que os objetivos passam por os atletas portugueses "estarem o melhor possível, termos alguns finalistas e se possível uma ou outra medalha", realçando que estes campeonatos surgem numa fase anormal da época, final de setembro/início de outubro.
Nelson Évora tem 17,13 metros como melhor registo em 2019 |
Évora catapultou disciplina
No entender de José Santos e de Arons de Carvalho, a qualidade de Portugal no triplo salto está umbilicalmente associada à promoção que Nelson Évora deu à disciplina, sobretudo com a conquista das medalhas de ouro nos Mundiais de Osaka (2007) e dos Jogos Olímpicos de Pequim (2008).
"É um conjunto de situações. O Nelson Évora fez um trabalho extraordinário, foi e ainda é um dos melhores atletas do mundo, e isso levou a que esta disciplina tivesse uma certa promoção. Depois, tivemos em Portugal um grande especialista em saltos há uns anos e que infelizmente já faleceu, Roberto Soto, que teve um contributo bastante grande. E há treinadores portugueses como José Ganso, um homem que gosta do triplo, e José Urra, um homem que se dedicou ao triplo, sem estar aqui a querer afastar ninguém", procurou explicar o diretor técnico nacional.
"No total, Portugal tem cinco saltadores de triplo, o que é um recorde que vem da força da especialidade em Portugal. A contrastar está o meio fundo e o fundo, pois só temos uma maratonista [Salomé Rocha], ao contrário do que acontecia há uns anos, em que essa era a nossa força. É possível que o exemplo do Nelson Évora tenha sido bom. De qualquer forma, penso que não será algo para continuar. Não acredito que nos próximos Mundiais voltemos a ter tantos atletas no triplo salto", frisou o jornalista especialista em atletismo.
Americanos como principais adversários
É precisamente no triplo salto que José Santos e Arons de Carvalho preveem as disputas mais acesas destes Campeonatos do Mundo. "As duas provas de triplo salto vão ser excelentes, e por acaso também vamos ter atletas nessa competição. Vão ser provas que podem trazer algumas surpresas, são atletas de grande qualidade", perspetivou o diretor técnico nacional.
"Penso que haverá grandes disputas em muitas especialidades, a começar pelo triplo salto, com os americanos muito iguais e Pichardo", anteviu o jornalista, em alusão aos norte-americanos Will Claye (18,14 como melhor marca do ano), Christian Taylor (17,82) e Omar Craddock (17,68). 17,53 e 17,13 foram o melhor que Pichardo e Évora fizeram em 2019, respetivamente.
Outra luta frenética deverá verificar-se na prova dos 100 metros, que pela primeira vez desde 2005 não terá o jamaicano Usain Bolt no tiro de partida. "Também será um dos grandes atrativos, com os americanos a continuar como favoritos", crê Arons de Carvalho, referindo-se a Christian Coleman (9,81 segundos como melhor marca do ano) e Justin Gatlin (9,87).
Impossível transportar resultados da Liga das Nações
O atletismo português esteve em destaque há mês e meio com a vitória na I Liga das Nações e consequentemente promoção à Superliga europeia, mas José Santos avisa que é impossível transportar esses resultados para uma competição com a dimensão de um Campeonato do Mundo: "São campeonatos totalmente diferentes, como é lógico."
"Portugal conseguiu uma proeza algo inesperada na I Liga na Taça da Europa, subindo à Superliga, mas reflete a subida de nível do atletismo português de uma forma geral. Portugal era fraco, agora já está ao nível dos outros. O nível é muito semelhante, mas faltam-nos grandes vedetas. Não é possível transportar", explicou Arons de Carvalho.
Além dos cinco triplistas e da marchadora Inês Henriques, Portugal vai estar representado por Francisco Belo (lançamento do peso), João Vieira (50 km marcha), Lorène Bazolo (100 metros), Cátia Azevedo (400 m), Irina Rodrigues e Liliana Cá (ambas no lançamento do disco), Ana Cabecinha (20 km marcha), Mara Ribeiro (50 km marcha) e Salomé Rocha (maratona).
Programa dos portugueses
Triplo salto masculino (Nelson Évora e Pedro Pichardo) - qualificações a 27/9 às 17.25 e final a 29/9 às 19.45;
Lançamento do peso (Francisco Belo) - qualificações a 3/10 às 17.20 e final a 05/10 às 18.05;
50 km marcha masculinos (João Vieira) - 28/9 às 21.30;
100 metros (Lorène Bazolo) - qualificações a 28/9 às 14.30, meias-finais a 29/9 às 19.20 e final a 29/9 a 21.20;
400 metros (Cátia Azevedo) - qualificações a 30/9 às 16.20, meias-finais a 1/10 às 18.50 e final a 3/10 às 21.50;
Triplo salto feminino (Patrícia Mamona, Susana Costa e Evelise Veiga) - qualificações a 3/10 às 14.40 e final a 5/10 às 18.35;
Lançamento do disco (Irina Rodrigues e Liliana Cá) - qualificações a 2/10 às 16.00 e final a 4/10 às 19.00;
Maratona (Salomé Rocha) - 27/9 às 21.59;
20 km marcha (Ana Cabecinha) - 29/9 às 21.30;
50 km marcha femininos (Inês Henriques e Mara Ribeiro) - 28/9 às 21.30;
Medalhas de Portugal em Mundiais
Helsínquia 1983: nenhuma;
Roma 1987: Rosa Mota (ouro na maratona) e Domingos Castro (prata nos 5000 m);
Tóquio 1991: nenhuma;
Estugarda 1993: Manuela Machado (prata na maratona);
Gotemburgo 1995: Fernanda Ribeiro (ouro nos 10 000 m), Manuela Machado (ouro na maratona), Fernanda Ribeiro (prata nos 5000 m) e Carla Sacramento (bronze nos 1500 m);
Atenas 1997: Carla Sacramento (ouro nos 1500 m), Fernanda Ribeiro (prata nos 10 000 m e bronze nos 5.000 m) e Manuela Machado (prata na maratona);
Sevilha 1999: nenhuma;
Edmonton 2001: Carlos Calado (bronze no salto em comprimento);
Paris 2003: nenhuma;
Helsínquia 2005: Rui Silva (bronze nos 1500 m) e Susana Feitor (prata nos 20 km marcha);
Osaca 2007: Nelson Évora (ouro no triplo salto);
Berlim 2009: Nelson Évora (prata no triplo salto) e Naide Gomes (bronze no salto em comprimento);
Daegu 2011: nenhuma;
Moscovo 2013: João Vieira (bronze nos 20 km marcha);
Pequim 2015: Nelson Évora (bronze no triplo salto);
Londres 2017: Inês Henriques (ouro nos 50 km marcha) e Nelson Évora (bronze no triplo salto).
Curiosidades
Participações portuguesas com mais medalhas: Gotemburgo 1995 e Atenas 1997 (quatro);
Participação portuguesa com mais finalistas: Atenas 1997 (seis);
Participações portuguesas com mais atletas: Atenas 1997 e Berlim 2019 (30);
Participação portuguesa com menos atletas: Helsínquia 1983 (11);
Prova com mais atletas portugueses em Mundiais desde sempre: Maratona (52);
Especialidades que nunca tiveram atletas portugueses: salto em altura, lançamento do disco, lançamento do dardo e 4x400 m masculinos e salto em altura, lançamento do peso e 4x100 m femininos;
Atleta português com mais presenças: Susana Feitor (11, todas nos 20 km marcha) - será igualada por João Vieira (nove nos 20 km marcha e duas nos 50 km marcha).
Link original: https://www.dn.pt/edicao-do-dia/26-set-2019/interior/triplo-salto-portugues-de-mao-cheia-nos-mundiais-de-doha-11333879.html
Sem comentários:
Enviar um comentário