O Palmeiras sagrou-se campeão brasileiro
pela décima vez, reconquistando o título dois anos depois, e não há como
dissociar Luiz Felipe Scolari do feito. Bem pelo contrário. Felipão foi, muito provavelmente, o
grande protagonista da campanha alviverde, tendo assumido o comando técnico
após a 15.ª jornada, com a equipa em 7.º lugar e a oito pontos do então líder
Flamengo.
Seguiram-se 22 jogos sem derrotas
no Brasileirão – maior sequência da história do campeonato desde que se tornou
uma prova de regularidade - e desempenhos bastante aceitáveis na Copa do Brasil
e na Libertadores, competições em que o verdão caiu nas meias-finais ante
Cruzeiro e Boca Juniors, respetivamente.
Acabado
de se tornar o treinador mais velho a conquistar o título, com 70 anos –
batendo o recorde de Antônio Lopes, campeão com o Corinthians em 2005, com 64 –
e de se juntar ao mesmo Antônio Lopes e a Vanderlei Luxemburgo no restrito lote
de técnicos que se sagraram campeões brasileiros nos dois formatos que a prova
conheceu (mata-mata e pontos corridos), mais uma vez Scolari voltou a fazer
valer o atributo que lhe é mais reconhecido: capacidade para gerir um grupo.
Sofisticações
táticas não são para o Sargentão, que
apresentou o 4x2x3x1 clássico em terras de Vera Cruz e um futebol direto, com a
bola a ser muitas vezes bombeada a partir do meio-campo defensivo para os
atacantes, à procura da combatividade do ponta de lança (Deyverson ou Borja) ou
da velocidade dos extremos Willian e Dudu.
Defensivamente,
uma das chaves para o sucesso do Palmeiras residiu no conforto dos jogadores
nos momentos sem bola. Sem uma pressão muito alta, o verdão procurava sobretudo não deixar que o esférico entrasse nos volantes adversários, condicionando-os
mas permitindo que os centrais contrários circulassem a bola. Depois, num
segundo momento, quando remetida para o próprio meio-campo, a formação paulista
apresentava-se num bloco baixo e compacto, com os extremos a colaborarem. Nos
primeiros nove jogos oficiais de Scolari, a equipa não sofreu golos.
Wéverton atrás de defesa rotativa
Jaílson e o antigo guarda-redes da União de Leiria, Fernando
Prass, também tiveram as suas oportunidades, mas desde que Scolari assumiu
o comando técnico que Wéverton foi senhor e dono da baliza alviverde. Experiente (30 anos) e com
duas internacionalizações pelo escrete,
foi a última barreira da equipa, mostrando segurança e reflexos apurados.
Se na
baliza houve uma aposta fixa, no quarteto defensivo houve muita rotatividade,
ao ponto de ser quase impossível dizer que uns fizeram parte do onze base e
outros não. O mais utilizado no campeonato foi Antonio Carlos (25 anos),
emprestado pelo Tombense, utilizado em 21 jogos (20 como titular), forte no
jogo aéreo (1,91 m), seguro e com sentido posicional, atuando preferencialmente
como central direito. Pelo lado esquerdo, o mais solicitado foi o veterano Edu
Dracena (37 anos), experientíssimo, seguro e também ele forte no jogo aéreo
(1,87 m). Ainda assim, na reta final apareceram Luan (25 anos), um dos
capitães e autor de dois golos nas derradeiras jornadas, embora tenha estado
negativamente associado à eliminação na Libertadores; e Gustavo Gómez
(25 anos), internacional paraguaio emprestado pelo AC Milan que mostrou
segurança e qualidade no jogo aéreo e… na conversão de grandes penalidades.
A
rotatividade também se faz sentir nas laterais. À direita, o experiente e menos
atrevido Marcos Rocha (29 anos), emprestado pelo Atlético Mineiro, até
foi o mais utilizado e o segundo jogador da equipa com mais recuperações de bola no campeonato (65), mas os seus problemas físicos e a pujança exibida pelo mais
ofensivo Mayke (26 anos) tornaram o ex-Cruzeiro um titular quase
absoluto na segunda volta.
No lado
canhoto, dois laterais contidos na hora de atacar. Victor Luís (25 anos),
que em 2012/13 passou pelo FC Porto B, acabou por somar mais alguns minutos do
que Diogo Barbosa (26 anos).
Felipe Melo e Bruno Henrique intocáveis
À
frente do quarteto defensivo, a clássica dupla de volantes do futebol brasileiro, a que na Europa chamamos de duplo pivot. O
veterano Felipe Melo (35 anos), o jogador com o currículo mais invejável do
plantel, foi intocável na posição de primeiro médio, o mais posicional, o que
mais se mostrava aos defesas quando a equipa optava por sair a jogar de forma
curta. Agressivo – por vezes a roçar a violência –, forte no jogo aéreo, estabilizador e... quezilento,
foi uma peça fundamental para manter a equipa equilibrada e providenciar a
recuperação da posse de bola.
A
sombra do antigo jogador de Juventus, Galatasaray
e Inter de Milão, entre outros, foi o também experiente Thiago Santos
(29 anos), igualmente com um espírito combativo - foi o jogador da equipa com mais recuperações de bola no campeonato (76) - e com alguma capacidade para
sair a jogar.
Como
segundo médio, o lugar foi do muitas vezes capitão Bruno Henrique (29 anos), que
terá vivenciado uma das melhores temporadas da carreira, tendo apontado 13
golos no somatório de todas as competições. A fazer lembrar os box-to-box do futebol inglês, brilhou
nos vaivéns de área a área, a defender e a atacar com qualidade. Participativo
na construção dos ataques, faz a equipa progredir através dos seus passes bem
calibrados e criteriosos ou então queima linhas através de um transporte de
bola muito seguro e objetivo, e exibe igual entrega nos momentos defensivos,
pressionando os adversários, reduzindo-lhes os espaços e inviabilizando-lhes
linhas de passe. Prova disso foi o facto ter sido o jogador do Palmeiras com mais faltas cometidas no campeonato (66). Não deu muitas hipóteses ao tecnicamente evoluído Gustavo
Scarpa (24 anos) e ao estabilizador Jean (32), relegados para um
papel secundário.
A elegância de Lucas Lima ou a força de Moisés
A ‘10’
ou, como dizem os brasileiros, a meia
central, a promessa adiada Lucas Lima (28 anos) foi o mais
utilizado, mas não foi propriamente um titular indiscutível desde que Scolari
chegou ao Allianz Parque. Internacional brasileiro, tem um pé esquerdo
refinadíssimo, que parece que tem olhos, tal a forma como trata bem a bola e
calibra os passes. No entanto, evidencia alguma falta de agressividade, jogando
por vezes muito a passo e chegando mesmo a alhear-se do jogo.
A
alternativa era o mais experiente Moisés (30 anos), irmão do
guarda-redes do Sp. Braga, Matheus. Mais robusto fisicamente (1,84 m), também é
canhoto mas não tem a mesma qualidade técnica que o concorrente, fazendo da sua
entrega o jogo, capacidade para segurar a bola e de uma postura mais
interventiva durante os encontros as principais armas. O veterano tecnicista
venezuelano Alejandro Guerra (33 anos) também pode fazer a posição, mas
fui muito menos utilizado.
Abram alas para o Bigode Willian e o craque Dudu
Outras
das posições que escaparam à rotatividade de Felipão foram as alas. Mais na direita, mas também na esquerda, o senhor
do bigode Willian (32 anos) foi presença assídua no onze, fazendo valer
as suas capacidades de definição – melhor marcador da equipa no Brasileirão,
com dez golos -, de aparecer com qualidade em zonas interiores a gerar desequilíbrios
e de imprimir mudanças na velocidade, embora não seja um portento no drible.
Portento
no drible é precisamente o que é Dudu (26 anos), considerado por muitos
como o melhor jogador do campeonato. Com sete golos e 12 assistências - foi o jogador com mais assistências no Brasileirão 2018 -, esteve
envolvido diretamente em 31 por cento dos golos do Palmeiras na prova, e
encantou com o seu futebol açucarado, criativo e rápido, sempre com a bola colada
ao pé direito. Utilizado preferencialmente a partir do corredor esquerdo, ultrapassou
adversários atrás de adversários nas suas diagonais para o meio, onde aparecia
para definir com qualidade. Sem medo de atirar à baliza, foi o futebolista da equipa que mais remates fez na prova: 70. Também lidera a tabela do Brasileirão de jogador com mais faltas sofridas (124), o que comprova a dificuldade que os opositores tiveram em travá-lo.
Jean e
Hyoran (25 anos) foram alternativas que ajudaram a dar descanso aos dois
indiscutíveis em vários jogos.
O artilheiro da Libertadores e o homem que deu o título
A
rotatividade de Scolari fez-se sentir no eixo do ataque. O internacional
colombiano Miguel Borja (25 anos) foi mais vezes titular nos primeiros
meses da época e ao que tudo indica será o melhor marcador da Taça
Libertadores, com nove golos. Combativo, móvel e com capacidade para jogar de
costas para a baliza, é daqueles avançados que não se fixa na área,
mostrando-se aos médios e participando na construção dos ataques.
No
entanto, a entrada de Scolari deu nova vida a Deyverson (27 anos),
antigo avançado de Benfica B e Belenenses que com Roger Machado estava a zeros
mas que com Felipão apontou nove
golos em todas as competições, incluindo o que garantiu a conquista do título,
no terreno do Vasco. Também móvel e participativo na construção das jogadas de
ataque, fez valer o seu poderio no jogo aéreo (1,87 m), a agilidade, a
qualidade técnica e a capacidade para roer os calcanhar aos defesas, mostrando
mais generosidade do que o colombiano na hora de defender.
Sem comentários:
Enviar um comentário