Rúben Neves representou o Montalegre nas duas últimas épocas |
Foi a medo para Montalegre,
mas já se sente em casa e fez história a colocar o emblema
transmontano na Liga 3. Ainda assim, sente que as coisas poderiam ter
corrido melhor tanto a nível individual como coletivo.
Numa altura em que ainda não sabe
em que clube vai jogar em 2021-22, o médio Rúben Neves recorda em entrevista os
mais de dez anos que passou na Sanjoanense,
as passagens por emblemas históricos como Desp.
Aves, Salgueiros
e Felgueiras
e fala da experiência de ser orientado pelo pai, Flávio das Neves.
RUI COELHO - O Rúben Neves disputou um total de 28 jogos e marcou dois
golos ao serviço do Montalegre,
que culminou na subida à Liga 3. Que balanço faz da temporada 2020-21 em termos
individuais e coletivos?
RÚBEN NEVES - Quer a nível
coletivo quer a nível pessoal foi um ano extremamente positivo. Embora pudesse
ter sido melhor ainda, pois a nível coletivo penso que poderíamos ter ombreado
com o Sp.
Braga B pelo primeiro lugar, mas desde cedo eles ganharam alguma vantagem
sobre nós e fomos perdendo o comboio. E embora eles tivessem uma equipa
fantástica, penso que poderíamos ter feito melhor. No entanto, atingimos os objetivos
a que nos propusemos, que era colocar o Montalegre
na Liga 3 é um feito enorme. Uma equipa de uma região descentralizada estar na Liga
3 é um feito notável e fizemos uma época extraordinária. A nível pessoal
gostaria de ter feito mais golos, ainda assim acabei a época com dois golos e 9
assistências, o que não foi mau, mas penso que poderia ter feito melhores
números em termos de golos. Mas estou contente com a época realizada, fiz
praticamente os jogos todos como titular e tive um bom desempenho.
Como têm sido estes dois anos nos barrosões?
Têm sido dois anos fantásticos.
Confesso que, quando assinei pelo Montalegre
e por desconhecer a realidade, fui um pouco a medo, mas chegando lá rapidamente
me adaptei e me senti em casa. É um clube extremamente familiar, sentimo-nos
bem lá e é um clube cumpridor que em nada falha aos jogadores. Têm sido dois
anos de muita satisfação e realização pessoal.
Desde a sua chegada a Montalegre
que foi sempre orientado pelo técnico José Manuel Viage. O que tem achado dos
seus métodos de trabalho?
Tenho gostado. São métodos de
trabalho que me agradam. O mister gosta de jogar um futebol ofensivo e positivo,
o que beneficia as minhas características. Mas mais do que eu possa dizer, é
ver os resultados que o mister tem obtido a jogar um futebol positivo e
agradável.
Já sabe onde vai jogar na próxima temporada?
Ainda não...
“A Sanjoanense é o meu clube do coração e devo-lhe tudo enquanto jogador”
Rúben Neves fez toda a formação na Sanjoanense |
Recuando no tempo, o Rúben nasceu em São João da Madeira. Como é que
foi a sua infância e como é que a bola entrou para a sua vida?
A bola entrou na minha vida por
obra do meu pai. Quando eu nasci o meu pai jogava no Sp. Espinho, depois de ter
passado por clubes como Vitória
de Setúbal, Vitória
de Guimarães, Académica
e Benfica.
Desde pequeno que me habituei a ver futebol, sejam jogos do meu pai, seja em
casa, e depois passei a ver muitos jogos do meu pai quando ele já era treinador.
Diria que a paixão pelo futebol vem mesmo do b1erço. Quanto aos primeiros
passos, desde cedo os dei, visto que aos cinco anos comecei a praticar futebol nas
escolinhas da Sanjoanense.
Quais são as melhores recordações que guarda desses tempos na formação
da Sanjoanense?
São as melhores, era jogar
futebol no seu estado mais puro. Diria que são os melhores anos da vida de uma
pessoa, a fazer aquilo que mais gostamos com os nossos amigos de infância.
Ainda por cima tive a particularidade de poder fazer os primeiros dois anos de
sénior a jogar com amigos de infância porque a Sanjoanense
fez uma equipa só com jogadores de São João da Madeira, o que culminou numa
subida à III Divisão na altura. São memórias inesquecíveis.
De que forma a Sanjoanense
foi importante para a sua vida pessoal e para a sua formação enquanto atleta?
São coisas indissociáveis. A Sanjoanense,
além de ser o meu clube do coração, devo-lhe tudo enquanto jogador de futebol,
pois passei 17 anos da minha vida a representar a Sanjoanense.
Pessoalmente também foi muito importante. desde treinadores, dirigentes e
colegas de equipa que me fizeram crescer enquanto ser humano.
Em 2010, surgiu a oportunidade de se estrear pela equipa principal da Sanjoanense.
Ainda se recorda desse dia? Qual foi a sensação?
Ainda era júnior e entrei para
fazer alguns minutos pela equipa sénior. O jogo em que me estreei a titular foi
na época 2010-11, no primeiro jogo do campeonato, em que ganhámos em casa por
2-0 ao Recreio
de Águeda, que era candidato à subida e fiz inclusivamente o primeiro golo.
É um dia que jamais vou esquecer, não só pela estreia, mas pelo golo e pela vitória
que foi o mote para conseguirmos a subida de divisão.
Na época seguinte ingressou no Cinfães, com o seu pai Flávio das Neves
no comando da equipa viseense. Como conseguiu conciliar o papel de filho e
jogador em simultâneo? Quais são os principais pontos fortes do seu pai
enquanto treinador?
Não foi fácil. Eu era um jogador
que vinha de divisões inferiores e ainda por cima era filho do treinador. Houve
uma desconfiança inicialmente por parte dos meus colegas de equipa, mas
naturalmente eles foram percebendo que dentro do clube eu era só mais um
jogador do plantel e foram-me acolhendo e tratando sempre bem. Mas foi um grupo
muito importante para mim porque cresci muito como jogador e, essencialmente,
como pessoa.
Não é fácil trabalhar com ele,
inicialmente tem uma maneira de lidar extremamente exigente e inicialmente os
jogadores podem achá-lo demasiado agressivo, mas quando entendem o bom coração
que ele tem, se berra com eles é para fazer deles melhores jogadores. Consegue
valorizar a maior parte deles. Penso que a organização defensiva e o jogo de
corredores que cria nas equipas dele são muito bons. Principalmente o jogo de
corredores.
No verão de 2013 teve a sua primeira experiência profissional ao
assinar pelo Desp.
Aves. Como surgiu essa hipótese?
Surgiu através do mister Fernando
Valente, que foi meu adversário quando eu estava no Cinfães e ele no Sp. Espinho.
Ele apreciava as minhas características e além disso eu estava referenciado
pelo departamento de scouting do Desp.
Aves. Então juntou-se o útil ao agradável e acabei por me transferir para o
Desp.
Aves.
Privou com jogadores como o Quim, Jorge Ribeiro e Fábio Martins. Como
eram na altura? E histórias engraçadas com algum deles, tem?
O Quim tinha a particularidade de
se sentar todos os dias à minha frente ao pequeno-almoço. Havia lugares
marcados e eu ficava em frente a ele a partilhar e a ler os jornais desportivos
e a comentar a atualidade, e claro que ele me contava histórias e experiências
que teve no Sp.
Braga, no Benfica
e na Seleção Nacional.
Do Fábio Martins tive algumas
experiências engraçadas, até porque algumas vezes vinha com ele de boleia para
o Porto e mantemos amizade até hoje. Conversamos por vezes via redes sociais.
Na época 2015-16 regressou à Sanjoanense
e teve como treinador Ricardo Sousa. O que mais o impressionou na sua forma de
trabalhar? Surpreende vê-lo nas ligas profissionais?
O mister Ricardo Sousa desde cedo
me impressionou pela forma romântica como olha para o futebol e como idealiza
que as suas equipas joguem e o perfil de jogadores que quer na sua equipa. As
equipas dele jogam um futebol extremamente agradável. Chegou com mérito aos
campeonatos profissionais.
“Deu para perceber que o Salgueiros é um clube grande e especial”
Rúben Neves com a camisola do Salgueiros em 2016-17 |
Em fevereiro de 2017 abraçou o projeto do Salgueiros.
Como correu essa experiência ao lado de jogadores veteranos como Rui Lima,
Hernâni, Cafú e Jorge Gonçalves?
Não correu como desejávamos. O
objetivo era a subida à II
Liga, tínhamos um grande plantel, mas não atingimos os nossos objetivos por
um ponto. Mas foi uma tristeza muito grande, embora estando apenas seis meses
no Salgueiros,
deu para perceber que é um clube grande e especial. Fiquei com um carinho
especial pelo clube.
No Salgueiros
jogou também ao lado de Aylton Boa Morte, que nas últimas temporadas se tem
apresentado em bom plano no Portimonense.
Quais são as principais qualidades dele e como tem visto a progressão dele?
A velocidade e a potência física.
É um jogador muito rápido e muito forte fisicamente e marca a diferença por
isso. Foi um jogador importante no ano em que estive com ele no Salgueiros
e com a sua persistência e crença conseguiu chegar à I
Liga.
“Em seis meses que estive no Freamunde só recebi um”
Em 2017-18 iniciou a temporada no Freamunde, mas foi no Cinfães que
terminou a temporada. Que balanço faz dessa época?
Foi uma época atribulada, talvez
a mais atribulada. O Freamunde tinha descido de divisão e fez uma equipa muito
forte para subir de novo, mas a verdade é que em seis meses que lá estive só
recebemos um. Por esse facto em janeiro houve uma debandada, mas julgo que, se
eles fossem cumpridores, éramos sérios candidatos á subida. Depois em janeiro
voltei para Cinfães, onde também estava o meu pai e o clube estava em segundo
lugar. Curiosamente chego a uma quinta-feira, perdemos 4-0 em Coimbrões a um domingo,
o meu pai foi embora e a equipa acabou por terminar no sexto lugar e fazer uma
má segunda volta. Foi um ano em que tudo correu mal.
“Felgueiras é um clube histórico, com uma massa associativa muito grande”
Seguiu-se o Felgueiras. Com que opinião ficou do clube?
Muito boa, é um clube histórico,
com uma massa associativa muito grande e as pessoas que estavam à frente do
clube em nada nos falharam. Foi onde tive melhor balneário. É muito difícil ter
o companheirismo e camaradagem que havia naquele balneário.
O Rúben é um médio. Como se define enquanto jogador?
Sou um médio com uma boa
qualidade técnica, inteligente, que percebe bem o jogo e com capacidade de
definição no último passe. A minha maior debilidade diria que é a falta de
agressividade.
Rúben Neves no Desp. Aves |
Aos 30 anos, tem algum sonho no futebol que gostasse de cumprir ou
algum clube que gostasse de representar?
Gostava de voltar à I
Liga e, se se proporcionar, voltar à Sanjoanense.
Tem acompanhado a Sanjoanense?
O que tem achado das últimas épocas do clube?
Sim, acompanho sempre a Sanjoanense.
Fiquei muito triste com a não subida à Liga 3. Estiveram num grupo difícil e
havia equipas com maior orçamento, mas a verdade é que um clube com os
pergaminhos e história da Sanjoanense
não pode estar no quarto escalão do futebol português.
Propomos-lhe um desafio. Elabore um onze ideal de jogadores com os
quais tenha jogado.
Não é fácil. E embora sendo
injusto com muitos colegas direi:
Quim na baliza. Pardal
a defesa direito. Júnior Pius e Miguel Vieira a centrais. Ricardo Tavares a
defesa esquerdo. Evra (Vizela) e Rúben Alves no meio-campo. Pedro Pereira na
direita. Fábio Martins na esquerda. Ronan David e André Pereira na frente.
Quais foram os treinadores que mais o marcaram?
Tive muitos e todos foram
importantes, mas destacaria o José Brito que foi muito criticado em São João da
Madeira, mas só tenho coisas boas a dizer dele e apostou em mim quando tinha 19
anos e foi muito importante na transição de júnior para sénior. O meu pai claro
que foi com quem mais me identifiquei, não só por ser meu pai, mas por ter
conseguido retirar de mim as minhas melhores qualidades e ter feito sempre
épocas excelentes com ele. Em termos de treino e ideias para a equipa o Micael
Sequeira, que esteve comigo em Freamunde e era adjunto do Rúben Amorim no Sp.
Braga, pareceu-me ser um treinador para outros voos que não o Campeonato de
Portugal. E, claro, o mister José Manuel Viage, com quem me identifico e nestes
dois anos também tem conseguido tirar o melhor de mim e devolver-me a alegria
de jogar futebol.
Além do futebol, tem outro tipo de atividade?
Não. Só jogo futebol por
enquanto.
Entrevista realizada por Rui Coelho
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