O herói da decisiva vitória do Benfica nas Antas em 1991. Quem se lembra de César Brito?
César Brito entrou aos 80 minutos para bisar no reduto portista
Sempre que estamos em vésperas de
um FC
Porto-Benfica,
há sempre pelo menos um jornal, uma estação de rádio ou um canal de televisão
que vai à procura de declarações de um jogador muito específico. Quem? César
Brito. Nunca falha! Afinal, estamos a falar de um avançado que saltou do banco
aos 80 minutos para bisar na vitória encarnada
nas Antas em 28 de abril de 1991 (0-2), um resultado decisivo na caminhada da
equipa então orientada por Sven-Göran Eriksson rumo ao título nacional.
Com esse triunfo, as águias
alargaram de um para três pontos a vantagem sobe os dragões,
na altura comandados por Artur
Jorge. Essa vitória teve outra nota de cariz histórico: foi a última do Benfica
no Estádio das Antas, apesar de o reduto portista
ter recebido clássicos até 2003-04. Curiosamente, as duas primeiras vitórias
dos encarnados
no Estádio
do Dragão para o campeonato foram uma espécie de homenagem à façanha de
César Brito, porque foram ambas por 2-0 e com avançados a bisar: Nuno Gomes em
outubro de 2005 e Lima em dezembro de 2014. Mas voltemos a focar-nos em César
Brito, cuja carreira não se resumiu a esse jogo. Nasceu em Barco, no concelho
da Covilhã, no seio de uma família com oito irmãos – tinha cinco irmãos mais
velhos e duas irmãs mais novas.
Benfiquista
e com o sonho de ser futebolista desde sempre, começou por jogar na ADF do
Fundão aos 12 anos, tendo depois passado para o Sport Clube de Barco, clube
pelo qual começou a jogar nos seniores aos 16 anos, quase 17. Depois de ajudar o emblema da
aldeia a subir à III Divisão e de uma temporada a competir no terceiro escalão,
mudou-se para o principal clube do concelho, o Sp.
Covilhã, no início da época 1983-84. Na temporada seguinte, a jogar ao lado
de Rui Barros (emprestado pelo FC
Porto), ajudou os serranos
a subir à I
Divisão e a atingir as meias-finais da Taça
de Portugal. “Eu fui o melhor marcador nesse ano, fiz uns golinhos, umas
coisas boas, e pronto, depois surgiu o Benfica”,
contou à Tribuna
Expresso em agosto de 2020.
As duas primeiras épocas na Luz,
porém, ficaram marcadas pela escassa utilização, devido à concorrência de
Manniche, Nené, Rui Águas e Diamantino. Não foi além de um total de 20 jogos (e
cinco golos) pelo Benfica
entre 1985 e 1987, mas contribuiu para a conquista da Supertaça
Cândido de Oliveira em 1985, da Taça
de Portugal em 1985-86 e da dobradinha em 1986-87. Seguiram-se dois anos positivos
no Portimonense,
por empréstimo das águias,
tendo nesse período faturado por 14 vezes em 52 jogos, o que lhe permitiu
estrear-se pela seleção
nacional A quando ainda era jogador dos algarvios,
em 1989, somando nesse ano as sete primeiras de 14 internacionalizações. Pelo
meio, sofreu um grave acidente de viação em Pombal no qual perdeu uma filha e que
o afastou dos relvados durante meia temporada, numa altura em que até era para
regressar ao Benfica.
O regresso à Luz
acabou por ser efetivado no início da época 1989-90, marcada pela caminhada até
à final da Taça
dos Campeões Europeus, perdida em Viena para o AC
Milan (0-1). César Brito marcou dois golos nesse percurso, ambos aos
húngaros do Budapest
Honvéd.
Contudo, foi na temporada que se
seguiu que atingiu o seu momento de maior notoriedade, o tal bis nas Antas que
embalou os encarnados
para o título. “Quando entrámos no balneário era um cheiro insuportável. Há
quem diga que era bagaço, outros que era sulfato. Era um ardor nos olhos.
Aquilo foi uma coisa horrível, abrimos uns chuveiros, mas era impossível estar
ali. E então tivemos de nos ir equipar nos corredores que davam acesso aos
balneários. E a revolta foi tanta que nos deu uma força extra e o Benfica
fez um jogo espetacular. Recordo o Rui Águas, que fez um jogão, eu de vez em
quando ainda vejo esse resumo. Toda a equipa com uma vontade enorme, provocado
pelo que aconteceu e não só, porque queríamos ser campeões. Recordo que comecei
a aquecer muito cedo, ainda no início da segunda parte, estive a aquecer muito
tempo, levei com muitas moedas de 50 escudos, aquelas moedas grandes. Da
bancada mandavam-me com as moedas para a zona onde estava a fazer o aquecimento
e ainda apanhei algumas, punha no bolso do fato de treino. Ainda juntei umas
quantas moedas. Depois entrei aqueles 10 minutos e fui feliz”, recordou.
Jogos como esse às ordens de
Sven-Göran Eriksson fizeram-no ganhar o rótulo de arma secreta, o tal jogador
que é decisivo no papel de substituto utilizado. Porém, em 1991-92 foi a
temporada em que foi mais vezes titular e também aquela em que faturou mais: 13
remates certeiros em 37 partidas, 24 delas no onze inicial.
Esse ímpeto foi perdido em
outubro de 1992, já com Tomislav Ivic no comando técnico, quando sofreu uma
grave rutura na coxa, teve de ser operado e ficou sem jogar até maio de 1993.
Já sem a influência de outrora,
sagrou-se campeão nacional em 1993-94, às ordens de Toni,
não tendo saído do banco nos célebres 3-6 em Alvalade
– curiosamente, foi suplente utilizado no jogo dos 7-1, em dezembro de 1986. “Estive
nos bons e nos maus momentos”, lembrou. Na época a seguir, apanhou Artur
Jorge como treinador e perdeu definitivamente espaço, acabando por rumar ao
Belenenses
no verão de 1995, em final de contrato. “Na altura estava o João Alves no Belenenses.
Ele falou comigo, estava interessado e eu pensei: porque não tentar um aninho
ali no Belenenses?
E foi muito bom. Joguei muitas vezes e fui o melhor marcador do clube naquele
ano, as coisas correram muito bem”, recordou, sobre uma temporada em que
apontou nove golos em 27 jogos oficiais e ajudou os azuis
do Restelo a obter um honroso sexto lugar na I
Liga.
A parceria entre João Alves e
César Brito correu tão bem que foi exportada para Espanha em 1996-97. “O João
Alves vai para o Salamanca e voltou a falar comigo, para saber se eu queria. E
porque não jogar no estrangeiro? Também era uma experiência nova e aceitei. Foi
das melhores coisas que me aconteceram. (…) Pela idade que tinha, não tinha
ilusões. Jogava muita vez, criámos um grupo de trabalho espetacular, com alguns
portugueses que foram daqui, juntou-se o Pauleta, joguei muitas vezes com ele,
fazíamos uma dupla espetacular, fazíamos golos. Tive dois anos em Salamanca
brutais, lindos”, afirmou o avançado, autor de 22 remates certeiros em 73
partidas pelo emblema espanhol entre 1996 e 1998, tendo contribuído para a
promoção à La
Liga em 1997.
Na reta final da carreira representou
ainda o Mérida, na II Liga Espanhola, e disputou um jogo pelo Sp.
Covilhã em 1999-00, mas sofreu uma rutura muscular e pendurou as botas em
seguida.
Após encerrar a carreira
dedicou-se a vários negócios na zona onde nasceu e cresceu: já teve um
restaurante, uma marisqueira e uma discoteca.
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