O lateral com canhota calibrada que venceu um linfoma. Quem se lembra de Nuno Pinto?
Nuno Pinto representou o Vitória de Setúbal entre 2015 e 2022
Lateral esquerdo com uma canhota
calibrada, belíssimo executante de bolas paradas, Nuno Pinto disputou 168 jogos
na I
Liga ao serviço de Boavista,
Nacional
e Vitória
de Setúbal, experienciou os campeonatos de Bulgária, Ucrânia e Roménia e
venceu uma dura batalha fora das quatro linhas contra um linfoma.
Depois de 79 partidas (e um golo)
pelos madeirenses,
prosseguiu a carreira no estrangeiro em janeiro de 2012. Após dois anos ao
serviço dos búlgaros do Levski Sófia, passou meia época nos ucranianos do Tavriya,
um clube situado na Península da Crimeia, tendo vivenciado de perto os
acontecimentos que culminaram com a anexação do território pela Rússia. “Foi
complicado porque estive sem receber desde fevereiro até maio, altura em que
terminou o campeonato ucraniano, e quando o conflito eclodiu passei a viver no
centro de estágio do clube, onde tinha comida e alojamento, porque não me
pagavam. Quando jogávamos fora era complicado porque íamos de autocarro para os
locais dos jogos e tínhamos de passar a fronteira da Crimeia para a Ucrânia,
para lá e para cá. Éramos barrados pelos ucranianos e pelos russos, sempre com
um grande aparato militar, com tanques, homens armados até aos dentes e com a
cara tapada. Não foi fácil”, contou ao Record
em dezembro de 2014. Para regressar a Portugal no
final da temporada teve de viajar de carro até Kiev, com muitos pontos de
controlo militar pelo meio, e da capital ucraniana voou para o Porto. Quando
tentou rescindir contrato, os responsáveis do Tavriya recusaram e o seu
certificado internacional ficou retido na Federação da Ucrânia, que o impediu
de arranjar novo clube durante vários meses. Acabou por fazer a segunda metade
da temporada 2014-15 nos romenos do Astra Giurgiu antes de voltar a Portugal
pela porta do Vitória
de Setúbal no verão de 2015.
No Bonfim
só por uma vez esteve perto de conquistar um título, quando atingiu a final da Taça
da Liga em 2017-18, mas foi sempre um titular indiscutível ao longo de sete
anos, viveu o período de maior regularidade exibicional na carreira e ajudou os
sadinos
a permanecer na I
Liga até uma decisão administrativa os empurrar para o Campeonato
de Portugal em 2020. Pelo meio venceu um linfoma, que
o afastou dos relvados durante a segunda metade da época 2018-19. Quando anunciou
a doença, em conferência de imprensa, o capitão Vasco Fernandes citou Mahatma
Gandhi para o encorajar: “Ele é um grande guerreiro e Deus dá grandes batalhas
aos grandes guerreiros.”
A partir desse dia, os adeptos vitorianos
batiam palmas quando cada jogo chegava ao minuto 21, em alusão à camisola que
Nuno Pinto utilizava.
No último jogo da temporada, já
com a permanência assegurada, o treinador Sandro Mendes proporcionou-lhe um
simbólico regresso aos relvados: foi titular e saiu poucos minutos após o apito
inicial só para ser ovacionado.
Mesmo após essa despromoção do primeiro
para o terceiro
escalão, mostrou lealdade ao emblema
setubalense e permaneceu na equipa, apesar dos salários em atraso e dos convites
para rumar a outras paragens. “É caso para dizer que o amor pelo clube aumenta
a cada dia que passa. Não sei explicar, não te sei dizer, mas a realidade é
essa. Tive muitas oportunidades para ir embora”, contou ao Bola
na Rede em dezembro de 2020. Dispensado de forma algo
repentina e sem direito a despedida ao fim de 179 partidas oficiais e dois
golos pelos sadinos,
pendurou as botas no verão de 2022 e iniciou de imediato a carreira de
treinador. Desde então já comandou Olímpico
do Montijo e Serpa.
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