terça-feira, 6 de agosto de 2024

O lateral com canhota calibrada que venceu um linfoma. Quem se lembra de Nuno Pinto?

Nuno Pinto representou o Vitória de Setúbal entre 2015 e 2022
Lateral esquerdo com uma canhota calibrada, belíssimo executante de bolas paradas, Nuno Pinto disputou 168 jogos na I Liga ao serviço de Boavista, Nacional e Vitória de Setúbal, experienciou os campeonatos de Bulgária, Ucrânia e Roménia e venceu uma dura batalha fora das quatro linhas contra um linfoma.
 
Médio de origem natural de Vila Nova de Gaia e maioritariamente formado no Boavista, foi adaptado ao lado esquerdo da defesa por Jaime Pacheco na primeira época na equipa principal dos axadrezados, em 2006-07. Aproveitou uma lesão de Mário Silva para atuar em dez encontros, defrontou Sporting no Bessa e Benfica na Luz e, pasme-se, terminou a temporada sem qualquer derrota.
 
Apesar do registo invicto, foi emprestado ao Trofense em 2007-08, contribuindo para uma inédita promoção da equipa da Trofa à I Liga, antes de rumar a título definitivo para o Nacional, clube que lhe deu a possibilidade de se estrear na Liga Europa. Esteve, por exemplo, nos dois jogos que que ditaram a eliminação do Zenit no playoff de acesso à fase de grupos, em agosto de 2009.
 
 
Depois de 79 partidas (e um golo) pelos madeirenses, prosseguiu a carreira no estrangeiro em janeiro de 2012. Após dois anos ao serviço dos búlgaros do Levski Sófia, passou meia época nos ucranianos do Tavriya, um clube situado na Península da Crimeia, tendo vivenciado de perto os acontecimentos que culminaram com a anexação do território pela Rússia. “Foi complicado porque estive sem receber desde fevereiro até maio, altura em que terminou o campeonato ucraniano, e quando o conflito eclodiu passei a viver no centro de estágio do clube, onde tinha comida e alojamento, porque não me pagavam. Quando jogávamos fora era complicado porque íamos de autocarro para os locais dos jogos e tínhamos de passar a fronteira da Crimeia para a Ucrânia, para lá e para cá. Éramos barrados pelos ucranianos e pelos russos, sempre com um grande aparato militar, com tanques, homens armados até aos dentes e com a cara tapada. Não foi fácil”, contou ao Record em dezembro de 2014.
 
Para regressar a Portugal no final da temporada teve de viajar de carro até Kiev, com muitos pontos de controlo militar pelo meio, e da capital ucraniana voou para o Porto. Quando tentou rescindir contrato, os responsáveis do Tavriya recusaram e o seu certificado internacional ficou retido na Federação da Ucrânia, que o impediu de arranjar novo clube durante vários meses.
 
Acabou por fazer a segunda metade da temporada 2014-15 nos romenos do Astra Giurgiu antes de voltar a Portugal pela porta do Vitória de Setúbal no verão de 2015.
 
 
No Bonfim só por uma vez esteve perto de conquistar um título, quando atingiu a final da Taça da Liga em 2017-18, mas foi sempre um titular indiscutível ao longo de sete anos, viveu o período de maior regularidade exibicional na carreira e ajudou os sadinos a permanecer na I Liga até uma decisão administrativa os empurrar para o Campeonato de Portugal em 2020.
 
Pelo meio venceu um linfoma, que o afastou dos relvados durante a segunda metade da época 2018-19. Quando anunciou a doença, em conferência de imprensa, o capitão Vasco Fernandes citou Mahatma Gandhi para o encorajar: “Ele é um grande guerreiro e Deus dá grandes batalhas aos grandes guerreiros.”
 
 
A partir desse dia, os adeptos vitorianos batiam palmas quando cada jogo chegava ao minuto 21, em alusão à camisola que Nuno Pinto utilizava.
 
 
No último jogo da temporada, já com a permanência assegurada, o treinador Sandro Mendes proporcionou-lhe um simbólico regresso aos relvados: foi titular e saiu poucos minutos após o apito inicial só para ser ovacionado.
 
 
Mesmo após essa despromoção do primeiro para o terceiro escalão, mostrou lealdade ao emblema setubalense e permaneceu na equipa, apesar dos salários em atraso e dos convites para rumar a outras paragens. “É caso para dizer que o amor pelo clube aumenta a cada dia que passa. Não sei explicar, não te sei dizer, mas a realidade é essa. Tive muitas oportunidades para ir embora”, contou ao Bola na Rede em dezembro de 2020.
 
Dispensado de forma algo repentina e sem direito a despedida ao fim de 179 partidas oficiais e dois golos pelos sadinos, pendurou as botas no verão de 2022 e iniciou de imediato a carreira de treinador. Desde então já comandou Olímpico do Montijo e Serpa.











 

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