quinta-feira, 12 de maio de 2022

Holandeses no Sporting. Nove jogadores e um treinador mas nenhum campeão

O treinador e os nove jogadores holandeses que passaram pelo Sporting
Anunciado esta quarta-feira como reforço do Sporting para 2022-23, o central Jeremiah St. Juste (ex-Mainz) vai tornar-se no 10.º holandês a jogar de leão ao peito. Nenhum dos outros nove foi campeão nacional em Portugal nem sequer o treinador neerlandês que passou por Alvalade. O histórico de nativos dos Países Baixos não é propriamente a história de uma laranja que deu muito sumo, mas ainda assim houve espaço para uma contratação bombástica que acabou por não avançar e da inclusão de pelo menos dois futebolistas no lote de ídolos dos adeptos sportinguistas.
 
A primeira vez que um jogador holandês vestiu a camisola do Sporting foi em janeiro de 1987, numa altura em que a Holanda já tinha sido vice-campeã do mundo por duas vezes (1974 e 1978) e em que Feyenoord (1970) e Ajax (1971, 1972 e 1973) já tinham sido saboreado a conquista do título europeu.
 
Peter Houtman
O pioneiro foi o antigo ponta de lança Peter Houtman, que representava o Groningen e contabilizava oito internacionalizações e sete golos pela Holanda, tendo sido o melhor marcador do campeonato holandês em 1982-83, quando representava o Feyenoord ao lado de Johan Cruijff e Ruud Gullit.
Em época e meia em Alvalade, amealhou 36 jogos e oito golos de leão ao peito, não conseguindo vingar perante a concorrência de Manuel Fernandes, Jordão e posteriormente de Paulinho Cascavel.
“Adorei tudo, tudo, tudo, menos no plano desportivo. Não marquei os golos que gostaria nem me impus como desejaria. Nesse aspeto, foi uma desilusão”, reconheceu, ao Observador, em novembro de 2017.
 
 
 
Frank Rijkaard com a camisola do Sporting na mão
Ainda Houtman representava o Sporting quando caiu a bomba em Alvalade: Frank Rijkaard. Defesa central/médio defensivo que era uma das figuras do Ajax, tinha vários tubarões europeus interessados na sua contratação, mas acabou por visitar o estádio leonino a 26 de outubro de 1987 para conhecer o plantel e o treinador inglês Keith Burkinshaw, naquela que foi a primeira de três visitas a Lisboa, numa altura em que estava em rotura com o emblema de Amesterdão.
Três meses e meios depois, a 11 de fevereiro de 1988, houve luz verde e o então presidente do clube, Jorge Gonçalves, apresentou mesmo Rijkaard à comunicação social na sala de imprensa do antigo Estádio José Alvalade. “Finalmente acabou o pesadelo, estou pronto para jogar”, desabafou o holandês, que dois dias depois esteve na bancada VIP a assistir a um Sporting-Sp. Espinho (0-0).
Rijkaard chegou mesmo a treinar-se com a equipa, enquanto Jorge Gonçalves negociava com o Ajax, mas o processo arrastou-se até que o prazo de inscrição do jogador se esgotou. A solução encontrada pelo clube da capital holandesa foi empresta-lo ao Saragoça e depois transferi-lo para o AC Milan.
“Honestamente, quando assinei contrato em 1987-88 pensei que ia lá jogar dois ou três anos, pelo menos. Mas as coisas mudaram e transferi-me para o AC Milan. Só vivi em Portugal três meses, só treinei, não pude jogar por eles”, recordou à Lusa, em março de 2011, numa altura em que era o treinador prometido pela candidatura de Dias Ferreira (e Paulo Futre) às eleições do Sporting.
 
 
 
Stan Valckx
Se Houtman desiludiu e Rijkaard não ficou, à terceira foi mesmo de vez e Alvalade viu um holandês a vingar: Stan Valckx. Se perguntarem a uma geração de sportinguistas que hoje terá entre 50 e 70 anos quais foram os melhores centrais a jogar de leão ao peito, é muito provável que Valckx seja referenciado.
Elegante internacional holandês recrutado ao PSV por indicação de Bobby Robson, amealhou um total de 90 encontros e seis golos com a camisola verde e branca entre 1992 e 1994. “Tinha trabalhado com ele [Robson] no PSV. Ligou-me e perguntou: 'Stan, estás a precisar de mudar de ares. Que tal uma aventura no Sporting, longe de Eindhoven'? Aceitei de imediato”, recordou ao Maisfutebol em outubro de 2014.
“Já tinha 29 anos e o mister queria-me sempre na equipa. O resto eram miúdos, como o Figo e o Peixe. Craques, sim, mas verdinhos. Senti grande responsabilidade por isso mesmo”, acrescentou.
Pelo meio, marcou presença no Mundial 1994, tendo atuado em quatro jogos na caminhada da Holanda ate aos quartos de final.
Em 1993 foi distinguido com o Prémio Stromp na categoria Futebolista, mas não venceu troféus durante a sua passagem pelo futebol português.
Em outubro de 1994, já com Carlos Queiroz no comando técnico, regressou ao PSV.
“Falar do Sporting é um prazer. Tenho grandes recordações, quase todas boas. Assim, de repente, lembro-me de duas más, que me mataram: o dia em que Bobby Robson foi despedido e a derrota por 3-6 contra o Benfica. Que pesadelo!”, rematou.
 
 
 
Após 17 anos sem presença holandesa em Alvalade, surgiram logo dois futebolistas naturais do país das tulipas no plantel de 2011-12.
 
Stijn Schaars
Comecemos por Stijn Schaars, médio regular e com precisão de passe recrutado ao AZ Alkmaar por 850 mil euros.
Campeão europeu de sub-21 em 2006, campeão holandês pelo AZ em 2008-09 e convocado para o Mundial 2010 – embora não tivesse jogado na campanha da Holanda até à final –, foi titular indiscutível na primeira época de leão ao peito, na qual atuou em 50 encontros e apontou cinco golos, ajudando os verde e brancos a atingir a final da Taça de Portugal e as meias-finais da Liga Europa antes de marcar presença no Euro 2012. “O Sporting foi a melhor escolha da minha vida”, afirmou em fevereiro de 2012, numa entrevista ao Jornal do Sporting.
Na segunda temporada, caiu de rendimento, tal como grande parte da equipa, ainda que tivesse estado vários meses afastado dos relvados devido a uma fratura no quinto metatarso do pé direito, não indo além de 16 jogos e um golo em 2012-13, época marcada pela pior classificação da história do Sporting, o 7.º lugar.
O facto de ser um dos jogadores mais caros do plantel levou a que a direção do recém-eleito Bruno de Carvalho o colocasse na lista de futebolistas negociáveis, tendo sido vendido ao PSV por 842 mil euros no verão de 2013.
“Vivi grandes momentos no Sporting: no meu primeiro ano tínhamos uma excelente equipa e um bom treinador, o Domingos Paciência, assim como um bom adjunto, o Miguel Cardoso. Não percebi a razão do seu despedimento, mas são coisas que acontecem no futebol. É verdade que nessa época perdemos a final da Taça de Portugal [0-1, contra a Académica], mas também fizemos uma grande campanha na Liga Europa, onde eliminámos o Manchester City e outras equipas de qualidade, como o Metalist. As meias-finais com o Athletic Bilbau são outro dos momentos marcantes, apesar de não termos conseguido passar à final (…). Aos adeptos do Sporting, quero dizer que continuo a ser um de vós, que gostei muito de ter jogador em Portugal e que foi aí que passei os melhores anos da minha carreira. Desejo-lhes felicidades e que o Sporting possa conquistar muito no futuro”, afirmou, em entrevista ao jornal O Jogo, em setembro de 2019.
 
 
 
Ricky Van Wolfswinkel
O outro holandês que reforçou o Sporting no verão de 2011 foi Ricky van Wolfswinkel. Avançado esguio e rápido contratado ao Utrecht por 5,4 milhões de euros, foi o dono do ataque leonino durante duas temporadas, tendo amealhado 45 golos em 88 jogos de leão ao peito.
Apesar dos golos que marcou, não era propriamente uma figura consensual entre os adeptos, descontentes pelas oportunidades que desperdiçava.
Numa altura em que os leões atravessavam uma grave crise financeira e desportiva, o presidente demissionário Godinho Lopes vendeu os direitos desportivos do futebolista aos ingleses do Norwich em março de 2013, em vésperas das eleições que viriam a ser ganhas por Bruno de Carvalho.
No verão de 2015, quando Jorge Jesus assumiu o comando técnico do Sporting, Van Wolfswinkel chegou a estar em Lisboa para assinar novamente contrato com o clube, mas o acordo falhou em cima da hora.
 
 
 
Khalid Boulahrouz
Quem se cruzou com Schaars e Wolfswinkel, mas deixou menos saudades apesar de ter mais nome foi o central Khalid Boulahrouz, que tinha passado por clubes como Hamburgo, Chelsea, Sevilha e Estugarda e marcado presença em competições como os Mundiais 2006 e 2010 e os Campeonatos da Europa de 2008 e 2012.
No entanto, no Sporting não foi além de 19 jogos em 2012-13, 17 dos quais até janeiro de 2013.
Apelidado de “Khalid der Kannibale” [Khalid, o Canibal] pela forma agressiva como defendia, chegou ao clube a custo zero e acabou por deixar Alvalade após chegar a acordo com a SAD então já liderada por Bruno de Carvalho para rescindir contrato.
 
 
 
Marvin Zeegelaar
Após dois anos e meio sem holandeses, o então treinador leonino Jorge Jesus pediu a contratação do possante lateral esquerdo Marvin Zeegelaar, que jogava no Rio Ave e tinha sido formado no Ajax, em janeiro de 2016.
Apesar de ter chegado a meio da época, destronou rapidamente Jefferson e foi alternando a titularidade com Bruno César. Na temporada seguinte, a tendência manteve-se. Ao longo desse ano e meio, totalizou 39 partidas e um golo de leão ao peito, tendo ainda sido convocado dois jogos da seleção da Holanda em novembro de 2016, embora não tenha chegado a estrear-se.
Ainda assim, saiu pela porta pequena, tendo sido colocado na lista de dispensas antes de se transferir para os ingleses do Watford no verão de 2017, num negócio que rendeu três milhões de euros aos cofres verde e brancos.
 
 
 
Zeegelaar contou com a companhia de três compatriotas no plantel na segunda temporada em Alvalade, mas apenas um deles vingou.
 
Douglas
Douglas, um central luso-holandês campeão da Holanda em 2009-10 ao serviço do Twente e que chegou a ser convocado para a seleção laranja em outubro de 2012, ainda que sem conseguir estrear-se, era um namoro antigo de Jesus e chegou a Alvalade proveniente dos turcos do Trabzonspor. No entanto, não foi além de sete jogos pela equipa principal e um pela equipa B dos leões em 2016-17 e de zero minutos de utilização na temporada seguinte.
Em fevereiro de 2018, revelou que acusou positivo num controlo antidoping realizado em finais de abril do ano anterior, explicando que tomou um medicamento (diurético) sem conhecimento do departamento médico do Sporting.
“Saí do Trabzonspor por causa de um projeto que me foi oferecido pelo Sporting. Não fui para o Sporting para ganhar dinheiro, até porque na verdade abri mão de mais de 500 mil euros por ano. Fui para Portugal para fazer história com a camisa do Sporting. Quando cheguei, muita gente disse que eu estava acima de peso. De facto, cheguei acima do peso. O Jorge Jesus, no entanto, sabia da minha condição física, visto que eu não tinha participado da pré-temporada do Trabzonspor. Recuperei o peso ideal num período de quatro a cinco semanas. O próprio Jesus elogiou-me pelo esforço, mas ainda assim pediu para que eu perdesse mais alguns quilos. Mas, no geral, ele estava satisfeito. Esforcei-me, fiz de tudo... Mas não demorou muito tempo para o Sporting não ser leal comigo e não cumprir o projeto acordado. Fui muito desrespeitado no Sporting, a maneira como me trataram... cheguei ao clube com 28 anos, experiente, com uma história, mas trataram-me como um miúdo de 15 anos”, afirmou ao site Goal em outubro de 2018.
“Passei a ser muito julgado depois do jogo contra Vitória de Setúbal, logo no início de janeiro de 2017. Já não estava a ter muitas oportunidades, mas ali mudou tudo. Depois daquele jogo nunca mais tive uma oportunidade e o Jorge Jesus também mudou a forma como se relacionou comigo. Tudo mudou. Nunca entendi ao certo o que aconteceu, ninguém nunca me explicou nada. Eu não sou de perguntar por que estou no banco, assim como também não pergunto por que sou ou serei titular. O Sporting desanimou-me muito. Depois, em maio, quando faltava uma semana para o grupo voltar a apresentar-se, recebi uma mensagem. Uma mensagem! A mensagem dizia para que eu me apresentasse numa data tal, isso porque já não fazia parte da equipa principal. Como é que um clube do nível do Sporting, e também levando em conta a minha história no futebol, age desta forma? Uma mensagem! Poderiam ter telefonado para mim, para o meu empresário... Mas, convém lembrar, não fui afastado sozinho, também afastaram o Bryan Ruiz, o Schelotto, o Zeegelaar e o Castaignos. O Jorge Jesus, que sempre insistiu para que eu fosse para o Sporting, nunca mais me procurou, nem mesmo um telefonema ou uma mensagem. Não entendi e ainda não entendo por que fui tratado assim”, acrescentou.
 
 
Luc Castaignos
Um desfecho muito semelhante teve a passagem de Luc Castaignos pelo Sporting. Possante avançado internacional jovem pela Holanda e com passagens por Feyenoord, Inter de Milão, Twente e Eintracht Frankfurt, chegou a Alvalade no início da temporada 2016-17, numa altura em que Islam Slimani e Hernán Barcos deixaram o clube e Lukas Spalvis tinha contraído uma grave lesão na pré-época.
Na primeira época de leão ao peito, atuou em 13 partidas, mas não conseguiu marcar qualquer golo. Em 2017-18 foi emprestado ao Vitesse e na temporada que se seguiu regressou a Lisboa para atuar em mais quatro partidas, mais uma vez sem golos para amostra, mas com uma pequena participação numa campanha que culminou na conquista da Taça de Portugal.
 
 
 
Bas Dost
Melhor sorte teve o outro holandês a reforçar o Sporting nesse verão de 2016, Bas Dost. Contratação sonante, pelos 11,85 milhões de euros que custou aos leões e que rendeu aos cofres do Wolfsburgo, tinha o estatuto de internacional pela Holanda e de melhor marcador da Eredivisie em 2011-12, quando vestia a camisola do Heerenveen.
Em três épocas e o início de uma quarta em Alvalade amealhou 127 encontros e 93 golos de leão ao peito, registo que faz dele o terceiro estrangeiro com mais golos pelo clube, apenas atrás de Liedson (172) e Yazalde (126), e que o coloca no top 20 do ranking global.
Além de melhor marcador do campeonato português logo na época de estreia, com 34 golos em 30 jogos, venceu duas Taças da Liga (2017-18 e 2018-19) e uma Taça de Portugal (2018-19).
Pelo meio, recebeu os prémios Leões Honoris Sporting e Stromp na categoria Futebolista em 2017 e chegou a rescindir contrato unilateralmente na sequência do ataque à Academia levado a cabo por um grupo de encapuçados que agrediriam jogadores, mas voltou atrás na decisão, apesar de ter sido o futebolista com mais marcas das agressões.
No verão de 2019 foi vendido ao Eintracht Frankfurt por sete milhões de euros.
 
 
 
Marcel Keizer
Curiosamente, Bas Dost foi perdendo espaço no onze do Sporting após a chegada de um treinador holandês, Marcel Keizer, na altura um desconhecido no futebol português que tinha orientado o Ajax e estava no Al Jazira (Emirados Árabes Unidos).
Nos primeiros sete jogos à frente da equipa, somou sete vitórias, dando nas vistas por um futebol ofensivo e uma pressão alta eficaz. Quando se acabou o estado de graça, os leões passaram para um estilo mais pragmático, tendo conquistado Taça da Liga e Taça de Portugal em 2018-19.
No entanto, a época seguinte começou com uma goleada sofrida às mãos do rival Benfica na Supertaça Cândido de Oliveira (0-5), o que lhe fragilizou a posição. Menos de um mês depois, foi despedindo após uma derrota em casa ante o Rio Ave (2-3).
“Nós entendemos que hoje se fecha um ciclo. Keizer entrou no Sporting em novembro de 2018, lembramo-nos muito bem como estava o clube, lembramo-nos que quase ninguém queria vir e ele teve coragem para o fazer. Cumpriu a missão com distinção, venceu dois títulos, o Sporting está agradecido pelo que Marcel Keizer fez. Fecha-se um ciclo, Keizer foi sempre um grande senhor e até na saída foi um grande senhor”, afirmou o presidente Frederico Varandas na altura da saída do técnico.
 








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