Thierry está no Grandolense desde o verão do ano passado |
Passou pela formação do Cruzeiro,
chegou a estar alojado com 12 pessoas numa casa quando jogou pelo FC
Setúbal e recentemente foi eleito o melhor guarda-redes da I
Distrital da AF Setúbal. Apesar do reconhecimento, já renovou pelo O
Grandolense, que nas últimas épocas tem ficado a meio da tabela.
Em entrevista, o gigante
guarda-redes brasileiro conta como surgiu a possibilidade de jogar em Portugal,
revela as promessas que não lhe foram cumpridas e explica porque decidiu ficar
em Grândola e o que falta à equipa para se intrometer na luta pela subida de
divisão.
DAVID PEREIRA - O Thierry
foi eleito o melhor guarda-redes da I Distrital da AF Setúbal pelos treinadores
que disputaram a competição. Como recebeu a notícia? Ficou surpreendido?
THIERRY – Fiquei a saber porque
tenho um grupo de amigos no WhatsApp e eles puseram lá e, na brincadeira, disseram
que tinha sido comprado e que paguei para ser distinguido. O campeonato não foi
o melhor para nós, tivemos uma fase má e depois conseguimos dar a volta. Fico
contente, porque o trabalho individual foi visto, pois foi uma votação dos
treinadores.
Já tinha a impressão que era
assim tão apreciado?
Sinceramente, não. Também havia
os guarda-redes dos clubes de topo, o do Barreirense
e os do Olímpico
do Montijo e do Comércio
e Indústria. Supostamente, toda a gente pensava que fosse um deles, por
terem andado lá em cima e por fazerem parte de equipas que perderam poucos
jogos e sofreram poucos golos. Fiquei surpreendido, mas contente, levaram em
conta não o número de golos sofridos, mas as exibições que fiz. Quem via só os
resultados devia pensar que O
Grandolense não tinha jogadores de qualidade, sobretudo porque tivemos uma
sequência de derrotas no início do campeonato e vários golos sofridos.
Apesar desta distinção
individual, O
Grandolense concluiu o campeonato a meio da tabela, em 9.º lugar, o que de
certa forma ainda reforça mais o mérito do Thierry em ser eleito o melhor
guarda-redes. Que balanço faz desta temporada tanto a nível individual quanto
coletivo?
A nível individual faço um
balanço de crescimento. Desde que cheguei a Portugal, e não o digo para me
vangloriar, sempre estive em equipas que lutavam para subir e que subiram de
divisão. Não conhecia a realidade da dificuldade em conquistar pontos e ganhar
jogos. Foi uma época de aprendizagem.
A nível coletivo, o grupo do Grandolense
foi fantástico. Inicialmente as coisas não estavam a correr muito bem, mas puxámos
por nós e conseguimos um feito fantástico. Acabámos a primeira volta em 12.º [com
19 pontos, os mesmos do 13.º e do 14.º], mas se valessem apenas os pontos [28]
da segunda volta ficaríamos em 6.º lugar. No final da primeira volta fizemos um
balanço e dissemos que não podíamos estar naquela situação, tendo em conta os
jogadores que tínhamos no plantel. Se a primeira volta fosse como a segunda,
estaríamos lá em cima na luta.
Embora tenha sido eleito o
melhor guarda-redes, o Thierry já anunciou a renovação pelo Grandolense,
que nas últimas épocas não tem passado do meio da tabela, numa fase em que
quase todas as equipas do Campeonato
de Portugal e dos campeonatos distritais ainda não anunciaram reforços.
Porque tomou a decisão tão cedo e não esperou que uma oportunidade batesse à
porta?
Primeiramente, eu acredito muito
no projeto. Se parar para analisar os meus últimos clubes, foram clubes em que
eu segui projetos. Não sou de ir jogar aqui num ano e no outro ano jogar ali, a
não ser que o clube não me queira encaixar no projeto. Faço sempre questão de
continuar. O projeto que O
Grandolense me apresentou é muito interessante e acredito nele. Cheguei a
receber alguns telefonemas de alguns clubes do Campeonato
de Portugal antes de terminar o campeonato, mas depois disso nada. Então
decidi continuar no projeto em que estava.
O
Grandolense tem no seu plantel alguns jogadores que recentemente
conquistaram o título distrital da AF
Setúbal, como os casos do Thierry e do Jorge Iguarán, e outros que
competiram no Campeonato
de Portugal nas últimas épocas, como o Raul Avinte. Que projeto é esse de que
o Thierry falou e o que falta à equipa para se intrometer na luta pela subida
de divisão?
O
Grandolense mudou recentemente de direção e há uma direção nova, com pessoas
com os pés assentes no chão e muito humildes. O projeto não é dizer que vamos
lutar pela subida, o projeto passa por ter uma base de jogadores para engrenar e
dar consistência para o campeonato e gerar retorno financeiro através de
patrocinadores, o que só acontece se a equipa estiver bem. É um projeto a longo
prazo que vai ser muito engraçado. Pode ser que daqui a uns anos apareça um Grandolense
a lutar para subir de divisão e maior do que é hoje. Com os jogadores que já
estão no clube e os que vão chegar, O
Grandolense vai apresentar-se muito forte e poderá lutar pelos primeiros
lugares.
“Clubes do Campeonato de Portugal treinam de manhã, mas não pagam para isso”
Thierry esteve três anos no Comércio e Indústria |
E ao Thierry, o que julga que
tem faltado para chegar ao Campeonato
de Portugal? Já foi campeão da I
Distrital por duas vezes e tem estado em equipas que lutam pela subida de
divisão…
Falta um clube com um projeto.
Não sou de me vangloriar, mas acho que tenho condições para estar lá. Os clubes
do Campeonato
de Portugal pecam um bocadinho por não ter um projeto, porque falta
estabilidade às equipas, porque não se mantém um grupo que já tem entrosamento
nem se dá oportunidade aos jogadores. Nós não somos profissionais, nós trabalhamos
e jogamos. Os clubes treinam de manhã, mas não pagam para isso, não dão um suporte
que uma pessoa precisa para viver. Falta um bocadinho de projeto em relação aos
jogadores, não em relação ao campeonato. Acredito muito nos projetos, acredito
que para as coisas avançarem é preciso terem início, meio e fim. Os jogadores
até podem pensar em largar o trabalho para ir para um clube do Campeonato
de Portugal, mas é só uma época. E como vai ser depois? Falta dar
estabilidade aos jogadores.
O que o Thierry faz
profissionalmente e como concilia essa atividade com o futebol?
Trabalho numa fábrica em Setúbal,
que me permite ter um horário bom, de segunda a sexta das 8:00 às 17:00. Consigo
ir treinar à noite e ter os fins de semana livres.
Voltemos tudo atrás na
carreira do Thierry. Como é que se tornou guarda-redes?
Tudo começou com um ex-treinador
meu no Ipatinga, Clayton. Eu sempre fui muito alto, mas tinha a desvantagem de ser
lento a correr. Aos meus 15 anos, ele pediu-me para experimentar ir para a
baliza. Disse que podia experimentar, porque temos que fazer o que o treinador
pede. Inicialmente não estava a correr bem, porque eu não sabia cair e chegava
a casa muito magoado. Entretanto fomos disputar um torneio de uma semana no
qual participava o Flamengo
e toda a gente queria defrontar o Flamengo,
que na altura tinha o Lucas Paquetá e o Vinícius
Júnior. Para me motivar, o treinador levou-me para esse torneio apesar de
eu não ter ainda grande experiência nem jeito para ir para a baliza. Ele
confiou em mim e a partir daí ganhei motivação para ser guarda-redes. Embora fosse
um torneio juvenil e eu não tivesse jogado, o estádio encheu só por ser o Flamengo
e isso deu-me uma grande motivação.
Ficava “babando” a ver os craques do Cruzeiro a treinar
Sou de Ipatinga, que fica a 200
quilómetros de Belo Horizonte. Conquistámos um campeonato no Ipatinga, apesar
de jogarmos num escalão acima do nosso, e isso deu visibilidade a vários
jogadores. O Cruzeiro
tinha sempre observadores em todo o lado, em quase todas as cidades de Minas
Gerais, porque estão sempre à procura dos melhores jogadores. Tive a oportunidade
de ir, estive quinze dias em testes, fui aprovado e estive lá um ano (2013),
nos sub-17. Num clube grande é complicado porque temos sempre grande
concorrência, chegam jogadores todos os dias, e há uma competitividade que nos
obriga a manter em alto nível. Foi uma experiência diferente do que eu estava
habituado e foi muito bom, porque chegámos a treinar no centro de treinos do
futebol profissional quando não havia espaço no centro de treinos da formação, e
recordo-me de ver jogadores profissionais a treinar no campo ao lado. Chegava a
estar a treinar e a ficar parado e babando a ver os profissionais no campo ao
lado. Eram jogadores que eu só via na televisão e o treinador tinha que me chamar
à atenção. Estava lá o guarda-redes Fábio, que está agora no Fluminense, e o
Éverton Ribeiro, que hoje é jogador do Flamengo.
São essas experiências que eu guardo.
Foi companheiro de equipa ou
defrontou algum jogador que esteja agora na alta-roda do futebol?
Um dos jogadores que tem feito
melhor carreira é o Lucas França, que agora é guarda-redes do Nacional
da Madeira. Admiro-o muito porque é alguém que consegue chutar igualmente
bem com as duas pernas. O número de camisola que eu uso, o 37, é em homenagem a
ele, pela cumplicidade que tinha com ele. Também fui colega do Fabrício Bruno,
que hoje é central do Flamengo.
Também havia o Judivan, que foi internacional jovem pela seleção brasileira e
hoje está na Tailândia.
O Thierry vinha a jogar em
algumas equipas dos campeonatos mineiros até se mudar em 2016 para Portugal,
para vir jogar para o FC
Setúbal, que na altura estava na II Distrital, a quinta divisão do futebol
português. Como é que surgiu a abordagem e porque decidiu largar tudo e vir
para Portugal ainda que para jogar num patamar baixo?
A minha melhor fase foi após ser
dispensado do Cruzeiro
e voltei para Ipatinga, para o Novo Esporte. No meu terceiro ano lá fomos ao
hexagonal final e isso deu-me visibilidade, pois foram feitas matérias de
televisão e jornais. Tive propostas do Brasil, mas o que me interessava era ir
para o estrangeiro.
Entretanto conheci um rapaz que
estava em Portugal e ele disse para eu lhe enviar vídeos. Ele mostrou esse
material ao Mário
Leandro [então treinador e presidente do FC
Setúbal], que me ligou, fez uma abordagem e prometeu um valor, casa e
condições. Ouvindo isso, fiquei a pensar que uma quinta divisão em Portugal era
a mesma coisa que no Brasil, uma coisa profissional, a treinar de manhã e ter
um salário.
Falei com ele numa quinta-feira e
viajei no domingo. Tinha 19 anos na altura. A minha mãe desconfiou, mas quando
viu o bilhete de avião percebeu que era uma coisa certa. Vim com o sonho de ir
para um clube profissional, que me desse condições, mas a minha maior desilusão
foi chegar cá e ver que não era assim. Nos primeiros três meses ele não me pagou
o valor que estava prometido, deu-me sempre a desculpa de que estava sem
dinheiro, mas eu já tinha a ideia de não voltar ao Brasil caso o futebol não
desse certo, mas sim de me desenrascar. Tive o azar de me lesionar pouco tempo
depois de chegar cá, parti o perónio depois de seis meses aqui e creio que
perdi oportunidades por causa desse problema, porque o FC
Setúbal estava a ser bem falado e os jogadores também.
“Chegámos a ser 13 num apartamento com três quartos”
Thierry nos tempos do FC Setúbal |
Como é que ficou alojado, como
era o seu dia-a-dia e, tendo em conta que não lhe pagavam, como fazia para
sobreviver?
O que me tinham prometido era um
valor em dinheiro, a casa, um carro para rodar entre nós e ginásio. Tínhamos
tudo menos os pagamentos. A rotina era fazer ginásio de manhã, voltar a casa
para almoçar e treinar à tarde. Era uma rotina de profissional, só não tínhamos
certas condições e o dinheiro que nos tinham prometido. Éramos alguns jogadores
de vários países, do Brasil, da Argentina, da Colômbia e de África: uns tiveram
a mesma mentalidade que eu e ficaram por aqui, outros voltaram para casa.
Imagino que na altura dividia casa
com mais jogadores…
Sim, chegámos a ser 13 num
apartamento com três quartos. Ajudou-nos muito o facto de termos união. Éramos
muitos e às vezes havia intrigas normais do dia-a-dia, mas éramos unidos a
gerir a comida e o dinheiro entre todos. Ainda hoje há uma amizade fantástica
entre os que por cá ficaram.
Como é que foi a sua adaptação
a Portugal? Tem-se sentido bem recebido ou já sentiu na pele algum tipo de
xenofobia?
Desde o primeiro dia que aqui
estou que tem sido fantástica. Nunca senti preconceito ou xenofobia, apenas
aquelas provocações normais durante os jogos. Tenho bastantes amigos portugueses.
A minha filha é portuguesa e a mãe dela também.
Embora o idioma seja o mesmo,
há algumas diferenças entre o português de Portugal e o português do Brasil. Já
passou por alguma situação engraçada em que não percebeu o que lhe disseram ou
alguém não percebeu o que o Thierry disse?
Na altura em que ainda eu estava
a conhecer a mãe da minha filha, fomos tomar uma cerveja junto à praia. No Brasil
“fazer um bico” significa “fazer um biscate” e se eu perguntar a alguém se quer
“dar um bico” na minha cerveja significa que estou a perguntar se quer “dar um
gole”. E eu estava a beber a cerveja a perguntei-lhe “quer dar um bico?”.
Quando perguntei isto toda a gente começou a olhar para mim e pensei “o que é
que eu disse de mal?”. Ela disse-me que eu não podia dizer aquilo. Eu disse-lhe
que “dar um bico” é “dar um gole”, mas ela lá me explicou que “bico” aqui é
outra coisa.
“Amora é topo de gama. No Fabril não cumpriram a palavra”
Thierry esteve no Fabril no segundo semestre de 2018 |
O Thierry já foi campeão
distrital ao serviço do Amora
e do Fabril
e também passou por Estrela
de Vendas Novas, Comércio
e Indústria e O
Grandolense. Quais as principais diferenças que encontrou entre estes
clubes ao nível da sua organização e de infraestruturas?
De todos, aquele que para mim era
topo de gama, e isso nota-se por onde está hoje, é o Amora.
O Amora
é um clube fantástico, as pessoas que lá estavam eram muito profissionais,
comprometidas com o futebol, honestas e sinceras, que cumpriram o que
prometeram. Fenomenal!
Por onde passei não tive
problemas. A minha saída do Fabril
foi uma saída precoce por falta de detalhes: no início da época acordámos uma
coisa e não cumpriram a palavra. A minha passagem pelo Comércio
e Indústria foi fantástica e no Estrela
de Vendas Novas as pessoas eram muito acolhedoras.
Para terminar, quem são os guarda-redes
do futebol mundial que mais admira e que qualidades mais aprecia neles? Se me
permite a opinião, dos guardiões de topo, a nível de características considero
que o Thierry se assemelha mais ao Courtois…
A nível de estatura, posso dizer
que sim, o Courtois é um guarda-redes fenomenal, de topo de gama. Mas aquele
que considero completo e para mim o melhor guarda-redes do mundo é o Ederson. É
a inspiração de qualquer guarda-redes. Dentro da baliza é muito seguro e a
jogar com os pés tem uma frieza de outro mundo.
ResponderEliminarPush 1 gram disposable.
Best stizzy pods.
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