Protagonista de um percurso
ascendente no futebol português, desde a II Divisão Distrital da AF
Braga ao Campeonato
de Portugal, Muacir começou 2019-20 ao serviço do Pedras Salgadas, mas
reforçou o Amora
logo nos primeiros meses da temporada, mas uma infeção na córnea afastou-lhe
dos relvados durante mês e meio e retirou-lhe confiança.
Em entrevista, este avançado de
elevada estatura (1,91 m) filho de mãe angolana
e pai guineense passa a carreira em revista e traça os objetivos para os
próximos anos.
ROMILSON TEIXEIRA - Dividiu a última época entre Pedras Salgadas e Amora,
ambos no Campeonato
de Portugal. Que análise faz à sua temporada?
MUACIR - Fui para o Amora
praticamente no início do campeonato, logo na 4.ª jornada. Felizmente comecei
logo com a titularidade e um golo. Consegui ter uma sequência boa nesses
primeiros cinco jogos pelo Amora,
nos quais fiz três golos e acabei por ter uma grave infeção na córnea, que me
impossibilitou de ver de uma das vistas durante sensivelmente uma semana e que
me afastou dos relvados cerca de mês e meio, devido ao lento processo de
recuperação de visão. Quando voltei, não foi fácil recuperar os mesmos níveis
de confiança. Fico, claramente, com uma sensação de insatisfação porque creio
que, a nível pessoal, passou ao lado de ser a época que prometia ser, dado o
bom início.
O Amora
viveu uma época atribulada, com três treinadores, mas conseguiu acabar a meio da
tabela na Série
D do Campeonato de Portugal. Que balanço faz da temporada dos amorenses,
apesar de já ter chegado ao clube com o campeonato em andamento?
Como disse, cheguei ao Amora
ainda no início da época e o balanço acaba por ser semelhante ao balanço
individual. Tínhamos uma equipa extremamente qualificada, mas por fatores do
próprio futebol, as coisas não funcionaram. Muitas vezes, no futebol, e por
isso é o desporto apaixonante que é, equipas de muita valia acabam por não
encontrar uma sequência regular, a nível de resultados, por conta da falta de
inspiração e foi o que aconteceu com a nossa equipa durante o decorrer de
praticamente toda a época. Tive a felicidade, neste campeonato, de só jogar em
equipas de muita qualidade e, a meu ver, o plantel do Amora
desta temporada era o melhor e mais experiente em que estive mas, por
infortúnio, as coisas nunca resultaram de forma sequencialmente positiva para
nós. Por vezes, é assim.
Quais as diferenças entre os três treinadores que conheceu no Amora,
Pedro Russiano, Tuck e Rui Narciso?
Muito sinceramente, tenho pena de
não ter podido trabalhar mais tempo com cada um deles e sem dúvida que aprendi
muito com cada um. Fica até difícil fazer uma avaliação justa pelo pouco tempo
de trabalho com cada um.
“Adeptos do Amora mereciam mais”
Muacir festeja o golo apontado ao Fabril em outubro de 2019 |
O que distingue o Amora
dos outros clubes que representou? Como é a estrutura e a massa adepta?
A principal diferença do Amora
em comparação com os outros clubes que representei é, precisamente, a ambição e
a vontade que os adeptos têm de comparecer e estar próximos do clube.
Infelizmente, este ano não foi condizente com o que todos ambicionávamos. É uma
massa adepta que comparece e é muito ambiciosa. Mereciam mais.
Já sabe onde vai jogar na próxima época?
Não. É uma questão que está a ser
avaliada, mas que, para já, está em aberto, mediante as opções que já tenho ou
as que podem ainda chegar.
Começou a jogar futebol na formação do Sp.
Braga. Que recordações tem desses tempos?
Enquanto praticante deste
desporto, as melhores. Fui muito feliz no Sporting
Clube de Braga. Foram as primeiras experiências com o futebol, os primeiros
ensinamentos, as primeiras amizades do futebol, os torneios fora do país e
muitas histórias. Muito boas recordações. Felizmente, fui colega de equipa de
muito boa gente, no Sp.
Braga. Ainda hoje tenho muito boa amizade com os companheiros e treinadores
que me acompanharam nesse período, mesmo tendo já passado muitos anos.
Quando esteve no Sp.
Braga que perspetivas tinha acerca da sua carreira? Acha que poderia estar noutros
patamares?
Na altura era muito novo. Tinha muita
crença nas minhas capacidades para ter sucesso no futebol mas nunca com a
perspetiva e compromisso que tenho hoje, talvez por conta da imaturidade que
advinha da idade muito jovem.
“O meu percurso tem sido sempre a subir”
Avançado marcou oito golos ao serviço do Amarante em 2018-19 |
Tem feito uma carreira sempre a subir, desde a II Distrital da AF
Braga até ao Campeonato
de Portugal. Até onde vai chegar o Muacir?
É, até, algo de que me orgulho
muito. Felizmente o meu percurso tem sido sempre a subir. Claro que ambiciono
ganhar títulos mas não tenho como não valorizar o facto de ter um percurso
sempre em crescendo. Acredito muito nas minhas capacidades para chegar a
patamares profissionais e é para além de um sonho, o meu grande objetivo.
Enquanto o meu percurso e a minha condição física me mostrarem que há essa
possibilidade, é o que vou ambicionar.
É sobrinho de Sabu, antigo defesa central de Vitória
de Setúbal e Beira-Mar. Que memórias tem do seu tio?
O meu tio, irmão mais velho da
minha mãe, jogou em Portugal numa altura muito anterior ao meu nascimento. Ele
hoje não reside em Portugal, então acabo por não ter memórias dele. O que
guardo dele são as histórias que a minha mãe me conta sobre ele e até mesmo as
histórias que me contava o meu treinador no Sporting
Clube de Braga. O meu treinador, à época, era o Lito, ex-jogador e
internacional português, curiosamente natural de Angola,
como o meu tio. Ele tinha sido também companheiro de equipa do meu tio e além
disso tinham uma relação de amizade e ele falava-me muitas vezes da relação que
partilhavam. Infelizmente, nunca privei com o meu tio Sabu pessoalmente.
Passou por vários clubes durante o seu percurso. Qual deles foi o mais
marcante para si e por que motivo?
Sim, tive o prazer de jogar em
alguns clubes e vou mencionar dois. Primeiramente, o Cabreiros, marcou porque
foi o primeiro clube a dar-me um papel de destaque, creio que também por mérito
meu, mais foi ali que se proporcionou muito do que tenho hoje. A nível de
amizades, incutiram-me uma conduta vencedora e, felizmente, em três épocas que
lá estive, acabámos o campeonato no pódio da classificação, tendo subido de
divisão no último desses três anos. Fiz lá também muitos golos e principalmente
amigos. Tínhamos o melhor balneário que alguma vez já experienciei. Sou muito
grato por ter lá jogado.
Depois, é impossível para mim não
mencionar o Amarante. Cumpriu com todas as expectativas que eu tinha, privei
com ótimos jogadores e homens; um clube de muita tradição e com infraestruturas
de top quando falamos deste
campeonato; uma cidade incrível, super acolhedora, onde fui muito bem recebido
por todos os adeptos e pessoas ligadas ao clube. Fico muito marcado pela minha
passagem por Amarante, sobretudo pelo facto de ter sido a época em que senti
que pratiquei o melhor futebol e por ter feito amizades com aqueles que, ainda
hoje, considero serem alguns dos meus melhores amigos. São dois clubes que
apoio e apoiarei sempre.
Muacir quando atuava nas camadas jovens do Sp. Braga |
Sou um rapaz calmo, gosto muito
de rir e de fazer os outros rir. Passo grande parte do meu tempo ligado a tudo
o que envolva futebol, estou sempre atento a notícias e ao desenvolver do
futebol um pouco por todos os países. Também gosto muito de passar o tempo rodeado
dos meus amigos mais chegados, estou constantemente a ouvir música nova,
maioritariamente de hip-hop, é algo
que também faço muito como hobby.
Nasceu em Braga. Como descreve a sua infância?
Quando falo da minha infância,
falo da minha maior vaidade, que é ter vivido os meus primeiros 18 anos na
Ponte Pedrinha, em Braga. Raramente estava em casa, fazia um pouco de tudo o
que um rapaz 'de rua' faz. Muita asneira, muito futebol, muita traquinice de
miúdo, muitas histórias e, sem dúvida, o melhor de tudo, um sentido de amizade
e lealdade que eu acredito que, se não fosse a rua, eu não teria. Sou muito
feliz por ter passado grande parte da minha infância e mesmo a adolescência com
o meu grupo de amigos da rua. Os meus amigos chegados de há 18/19 anos são os
meus de agora e isso é algo que não troco por nada. Sou amigo de longa data
deles, dos irmãos deles, dos pais deles e isso é algo que me envaidece muito.
Qual a sua ligação com Angola?
Eu sou filho de mãe angolana,
natural de Malanje. O meu pai, embora nascido na Guiné-Bissau,
trabalhou sensivelmente oito anos em Angola.
Por muita pena minha, nunca fui a Angola
mas é algo que tenho também como um grande objetivo ou sonho, poder conhecer as
minhas raízes. Gosto muito de tudo o que é a cultura angolana,
principalmente comida e música. Curiosamente, na minha playlist de dia de jogo tenho muitas músicas do artista Paulo
Flores. Aprecio muito.
“Jogar por Angola seria algo que eu e os meus familiares veríamos com muito agrado”
Tem o desejo de jogar por Angola?
Já cheguei a confessar ao meu
empresário, numa conversa ou outra, que seria algo que eu e os meus familiares
veríamos com muito agrado, embora nunca tenha sido contactado pela FAF.
Confesso que seria um prazer, e que a minha família e eu ficaríamos muito
felizes se isso acontecesse.
Aqui em Portugal é-me um bocado
difícil acompanhar os jogos com frequência mas sim, costumo ver os resumos dos
jogos, quando possível, e estou sempre atualizado sobre a tabela classificativa
do Girabola,
inclusive depois de os campeonatos europeus terem parado, houve um período,
creio que de uma semana, em que o Girabola
ainda teve continuidade e aí houve a transmissão e a possibilidade de
acompanhar um bocado mais. Penso que a seleção
passa por um momento em que, comparativamente a outros países de África, há
ainda um futebol não tão eficaz mas que com a vinda de jogadores experientes a
nível europeu como Bastos Quissanga, Núrio, Bruno Gaspar, Wilson Eduardo, Fábio
Abreu, entre outros, pode ajudar a acrescentar a qualidade necessária para se
igualar a estas seleções.
Sempre sonhou em ser futebolista ou tinha outros sonhos em mente? Qual
é o seu grande sonho enquanto jogador de futebol?
Sempre quis ser futebolista e
acredito que, seja neste patamar ou num patamar profissional, vou continuar a
jogar futebol por muitos mais anos e ligado ao futebol posteriormente.
Quais são os seus ídolos?
Sinceramente, não tenho uma
referência que possa destacar. Se tivesse de destacar os que mais me atraíram
para gostar futebol, escolho dois: o Robinho pela ousadia, qualidade e por
trazer um pouco daquele futebol de rua para os grandes palcos e o Ronaldo Fenómeno, para mim é intocável, tirando Messi
e Cristiano
Ronaldo, é o melhor de todos, na minha conceção.
“Sou forte no jogo aéreo e de boa finalização com ambos os pés”
Muacir foi muito feliz no Cabreiros |
Descrevo-me com um jogador forte
no jogo aéreo e de boa finalização com ambos os pés. Sinceramente, não me
consigo rever em nenhum jogador de top mundial.
Qual acha foi o momento mais alto da sua carreira? Como se imagina
daqui a três anos?
De entre alguns momentos altos
que tive tanto a nível coletivo e pessoal, não destaco o mais alto mas sim o
mais bonito a nível individual, que foi o golo contra o Leixões, na época
passada para a Taça
de Portugal, jogando pelo Amarante. Foi, seguramente, um dos golos mais
bonitos que marquei e teve também algum destaque por parte principais jornais a
nível nacional como sendo um momento de grande inspiração, fico muito feliz por
isso. Foi um momento em que tinha os meus amigos chegados e os meus dois irmãos
mais velhos presentes e poder partilhar com eles esse momento é algo que me
deixou igualmente feliz. Tenho como principal objetivo nos próximos três anos
atingir um patamar profissional, seja em Portugal ou no estrangeiro.
Como está a viver esta fase de pandemia? O que faz para manter a forma
física?
Tento levar toda esta situação
com positivismo e focando com ainda mais seriedade nos propósitos e objetivos
que tenho estipulados tanto dentro como fora do futebol, quer a nível pessoal
como profissional. Como guia de treino, de momento sigo os vários planos de
treino propostos pelo Madalena Ginásio, ginásio que frequentava em Amarante
quando lá jogava, atentando e respeitando as limitações que toda esta situação
nos impõe mas sempre com muita vontade de regressar ao que mais gosto, que é
jogar futebol. Quero aproveitar para agradecer a oportunidade de conversar um
bocado sobre mim e o meu percurso no futebol. Desejo as maiores felicidades e
progressos.
Entrevista realizada por Romilson Teixeira
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