quarta-feira, 18 de setembro de 2024

Este já não é o Sporting Comédia de Portugal

Sporting bateu o Lille em Alvalade no arranque da Champions
Durante cerca de duas décadas o Sporting foi sendo alvo de chacota e, verdade seja dita, os responsáveis leoninos e a equipa principal de futebol iam-se metendo a jeito. Lembro-me, assim de repente, do agregado de 1-12 numa eliminatória com o Bayern Munique, do 7.º lugar em 2012-13, de vitórias sofridas em Alvalade diante de adversários modestos que eram parodiadas como se da final da Liga dos Campeões se tratasse, de uma incapacidade brutal para vender jogadores, do desaparecimento de Shikabala, do termo casa de banho para descrever o estádio, dos extensos e recorrentes comunicados de Bruno de Carvalho, da invasão à Academia e de apontamentos musicais como “Baza correr com o Paulo Bento” de Valete e de “Sporting That I Used to Know” de Diogo Sena.
 
Agora, “Já não és o Sporting That I Used to Know” dirão os adolescentes e até jovens adultos que estavam habituados ao título nacional ser uma miragem logo pelo Natal, às vitórias morais, aos recordes negativos de distância pontual para o primeiro lugar, a transferências de jogadores importantes por verbas miseráveis, a um estádio com uma estética que pouco tinha a ver com o clube e com o que deve ser um recinto moderno e funcional. Agora, a nova realidade é de recorde de pontos e de aproximação aos recordes de golos, vendas e contratações cirúrgicas e um Alvalade cada vez mais moderno, bonito e identificado com o clube.

 
Durante anos e anos o Sporting foi um clube cujos jovens jogadores oriundos da formação batiam o pé para sair, o que motivou algum mal-estar, a dada altura, entre atletas como Miguel Veloso, João Moutinho, Rui Patrício, Adrien Silva e William Carvalho e a massa associativa. Agora, alguns desses jogadores têm manifestado vontade de voltar a Alvalade, mas sem sucesso, porque o projeto desportivo não encontra espaço para eles.
 
O Sporting que se viu obrigado a vender Moutinho a um rival e que por tuta e meia se desfez de titulares como Insúa, Matías Fernández ou Cédric é hoje um clube recheado de jogadores vendáveis. Há tanta juventude e talento que não é descabido dizer que é possível encaixar 50 milhões de euros em vendas sem incluir indiscutíveis no onze de Rúben Amorim, entre Edwards, Nuno Santos, Daniel Bragança e outros. Gyokeres, o expoente máximo da equipa, está nas bocas de meia Europa – basta passar por jornais e páginas de redes sociais de outros países, como a do jornalista Fabrizio Romano, para se perceber que o sueco é um fenómeno que já galgou fronteiras.
 
 
Antes, quando o Sporting competia na Liga dos Campeões, esperava-se uma participação modesta. Mas nesta terça-feira os leões entraram em campo, na receção a uma equipa de uma liga superior, e a expetativa mesmo entre adeptos rivais era de uma vitória convincente dos verde e brancos. O que antes seria considerado um ótimo resultado no arranque da competição acabou por ser falado, no rescaldo, como uma exibição q.b. No fundo, uma mudança de paradigma.
 
Num dos períodos mais negros da história do clube, provavelmente no período da presidência de Godinho Lopes, as redes sociais estavam inundadas de páginas de sátira e de piadas sobre o Sporting. Uma delas chamava-se Sporting Comédia de Portugal. Ainda existe, mantendo a tenda de circo no Estádio José de Alvalade como foto de capa, mas tem uma atividade cada vez mais residual. Porque este já não é o Sporting Comédia de Portugal. Este é um Sporting forte, temido e com ativos valiosos, saúde financeira e aspirações legítimas à conquista do bicampeonato que escapa desde a década de 1950 e a uma campanha europeia bastante digna. Quem diria, não é?
 
 
Até à invasão da Academia, tinham passado 16 anos sem o campeonato nacional. E três anos depois daquele rombo, o Sporting voltou a sagrar-se campeão em 2020-21, repetindo a proeza, de forma até muito mais categórica, em 2023-24.
 
Beneficiando de uma acalmia da contestação à direção de Frederico Varandas imposta pela pandemia de covid-19 e tirando enorme proveito da sabedoria e competência de Rúben Amorim, o Sporting está agora a reaproximar-se dos desígnios de José de Alvalade aquando da fundação do clube, em 1906, quando o fundador manifestou o desejo de o tornar num “clube tão grande como os maiores da Europa”. 


 




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