terça-feira, 9 de junho de 2020

A formação no Benfica e no Sporting, a estreia pelo Vitória aos 17 anos e o Jogo Duplo. Pedro Mendes em entrevista

Médio luso-angolano Pedro Mendes jogou pelo Fabril em 2019-20
Foi treinado por Bruno Lage na formação do Benfica, passou pela Academia do Sporting, estreou-se na I Liga portuguesa com a camisola do Vitória de Setúbal aos 17 anos, viu o seu nome envolvido – e, entretanto, absolvido – num esquema de resultados combinados quando jogava no Oriental, experimentou os campeonatos de Roménia e Letónia e, depois de ter representado o Fabril na segunda metade da época 2019-20, o médio luso-angolano Pedro Mendes prepara-se para voltar ao estrangeiro aos 26 anos.

Todos estes temas e mais alguns numa entrevista a não perder.



Em 2019-20 fez apenas seis jogos pelo Fabril, clube ao qual chegou apenas nas primeiras semanas de 2020. Que balanço faz da sua passagem pelos fabrilistas?
O balanço foi muito positivo. Desde que cheguei ao clube joguei sempre e era esse o objetivo.

O que passou para ter ficado tanto tempo sem clube?
Eu estava na Roménia, no Universitatea Cluj, e deu confusão porque éramos uma equipa supostamente para subir, mas os resultados foram negativos e acabou por sobrar para os estrangeiros e até pela violência dos adeptos tivemos de passar. Passados dois meses saí do clube e como já estava no final da janela de transferências não consegui arranjar nada no último dia.  Daí ter ido para o Fabril só no final de janeiro.

Já sabe onde vai jogar na próxima época? Pretende continuar no Fabril ou tem outras propostas?
Já tenho um pré-contrato assinado com um clube estrangeiro, mas só irei revelar quando assinar mesmo o contrato

Bruno Lage não apostou em mim e pedi para sair”

Pedro Mendes em ação pelos iniciados do Benfica, em 2006-07
Voltando ao início da carreira, passou pela formação do Benfica. Que memórias tem desses tempos? E como descreve a sua passagem pelos encarnados?
Estive um ano e meio no Benfica. O primeiro ano foi perfeito, joguei sempre, fomos campeões e fiz uma época muito boa, de tal forma que, de uma equipa de 20 e tal jogadores, ficaram seis e fui um deles. Na época seguinte apanhei o atual treinador do Benfica, Bruno Lage, que não apostou em mim e acabei por pedir para sair para jogar mais.

Como é que era o Bruno Lage naquela altura? Alguma vez pensou que um dia ele ia chegar à equipa principal do Benfica e ser campeão?
Sinceramente não, porque ele não tinha assumido nenhuma equipa como treinador principal na I Liga e não o via a assumir o Benfica. Como pessoa era tranquilo, como se vê hoje em dia.

Também foi companheiro de equipa de João Cancelo, atualmente ao serviço da Juventus. Como era ele na altura como pessoa e jogador? Já se destacava em relação aos demais?
Naquela altura via-se que era muito bom jogador como muitos outros, mas acabou por evoluir ainda mais e chegar onde chegou. Pessoalmente sempre foi atrevido e isso passa para o campo, ele não tem medo de driblar mesmo com jogadores de topo ao lado dele.

Sporting? Ricardo Pereira foi dispensado e Dier nem sempre era primeira opção”

Depois passou por Corroios e Sporting. Como correu a passagem pela Academia de Alcochete?
Saí do Corroios porque tinha o interesse do Benfica e Sporting e acabei por escolher o Sporting porque já tinha jogado no Benfica e naquela altura o Sporting era considerado o melhor na formação. Acabei por não jogar tanto como queria no Sporting e algumas vezes injustamente, porque estava melhor do que alguns, mas mesmo assim não tinha as oportunidades.

No Sporting foi companheiro de equipa de jogadores que hoje atuam ao mais alto nível, como Ricardo Pereira, Eric Dier, João Mário e Bruma. Como eram eles naquela altura?
Eram e são jogadores de muita qualidade, já se via naquele tempo. Havia jogadores que se destacavam, se calhar mais do que eles, mas que por uma razão ou por outra não chegaram a um nível tão alto. O Ricardo Pereira naquela altura jogava pouco e acabou por ser dispensado, o Eric Dier nem sempre era a primeira opção e chegaram mais longe do que outros. Eu nessa altura acabei por ser dispensado e no ano a seguir era júnior e jogava na I Liga em Portugal.

“Nunca vou esquecer o Vitória

Pedro Mendes no jogo de estreia na I Liga, em novembro de 2011
Seguiu-se o Vitória de Setúbal, clube pelo qual se estreou no futebol sénior e na I Liga. Que balanço faz dessa aventura e que significado tem o emblema sadino para si?
Nunca vou esquecer o Vitória, porque foi lá que me estreei na I Liga, ainda júnior, e tornei-me no jogador mais novo de sempre a estrear-se na I Liga pelo Vitória.

Quais as melhores memórias e as histórias mais engraçadas que tem do tempo em que passou pelo Vitória de Setúbal?
Foi a estreia na Taça da Liga e na I Liga. Acabei por jogar primeiro na Taça da Liga. Ainda hoje vejo muitas vezes esses jogos porque foram muito importantes para mim e porque com 17 anos entrei nesses jogos e consegui fazer a diferença.

Entre 2012 e 2014 esteve vinculado ao Recreativo do Libolo. Como correu a aventura no futebol angolano?
Não foi muito boa porque só estive lá seis meses a jogar. Fomos campeões, mas acabei por não ter muitas oportunidades numa equipa que já vinha de alguns anos e que já tinha sido campeã. Eu era muito jovem e acabei por não jogar muito, e por isso pedi para sair para jogar porque era jovem e ia acabar por desaparecer.

“Fui campeão do Girabola, mas não tive muita influência”

Pedro Mendes (à esquerda) nos tempos do Recreativo do Libolo
Como foi a sensação de ser campeão do Girabola?
Fiquei contente claro, mas podia ter sido melhor se tivesse jogado mais. Fui campeão, mas não tive muita influência no título.

Quais são as maiores diferenças entre o futebol angolano e o futebol português?
Há muitas diferenças, começando logo pelo calor e pela humidade de Angola, que torna muito mais difícil um europeu vingar em Angola, depois o futebol português é muito tático, o que não acontece tanto em Angola.

Esteve emprestado pelo Recreativo do Libolo ao Mirandela e ao Moura e depois representou Oriental e Pinhalnovense. Como foi regressar ao futebol português e como sentiu a progressão na sua carreira?
Ao Mirandela fui emprestado porque estava a tratar da nacionalidade angolana e o Bruno Vicente, diretor desportivo do Libolo, tinha ligação ao do Mirandela, e acabei por ir para o Mirandela a mando do Bruno Vicente e também para fazer minutos. O Moura foi um pedido meu para voltar a Portugal e voltar a aparecer, tanto que na época seguinte fui para o Oriental na II Liga e passados dois anos fui para a I Liga da Roménia.

Foi orientado por Bruno Ribeiro no Vitória de Setúbal e no Moura. Que significado este treinador teve para a sua carreira?
Foi muito importante por me te estreado na I Liga com ele.

“Jogo duplo? Ficou provado que não tive nada a ver com corrupção”

Pedro Mendes jogou na II Liga com a camisola do Oriental
Em 2017 foi detido por suspeitas de envolvimento em combinações de resultados desportivos quando jogava no Oriental, no âmbito do processo Jogo Duplo. O que se passou ao certo?
Infelizmente fui metido nessa situação, mas como sempre disse, a verdade viria ao de cima e assim foi, ficou provado que não tive nada a ver com corrupção.

Sente que a sua carreira ficou marcada por isso?
Marcada só se for em Portugal, porque enquanto esse processo decorria eu joguei I Liga da Roménia e da Letônia e na Liga Europa, por isso a minha carreira continuou e bem lá fora.

Que balanço faz das aventuras na Roménia e na Letónia? Quais foram as maiores dificuldades a nível desportivo, cultural, climático e gastronómico?
O primeiro ano na Roménia foi muito bom, porque joguei, marquei golos, fiz algumas assistências e ainda fiz história no clube, entrando na fase final. Na Letónia correu muito bem, joguei sempre até me lesionar, joguei na Liga Europa contra o Bordéus e correram-me muito bem esses jogos. Cheguei ao clube a 13 pontos do primeiro e até me lesionar estávamos a dois pontos e fomos à final da taça, onde perdemos nos penáltis. Dificuldades só mesmo as temperaturas negativas, de resto gostei muito de morar nos dois países e senti-me muito bem nos clubes.

Nasceu no Barreiro, mas tem nacionalidade angolana. Já foi chamado por Lito Vidigal para um estágio dos Palancas Negras em 2014, mas nunca chegou a estrear-se pela seleção angolana. É um sonho que tem?
Gostava muito, desde essa chamada que mostrei interesse. Na altura era um jovem a jogar na I Liga portuguesa e disse logo que gostava de jogar por Angola, mas depois disso não houve mais nenhuma chamada, infelizmente, e até podia ter sido chamado por duas vezes quando estava muito bem nos clubes e a jogar em primeiras ligas.

Qual é a sua ligação genealógica com Angola?
Pai e mãe, avós e tios angolanos.

FAF ligou-me antes do CAN 2019 a dizer que tinha sido observado”

Pedro Mendes num jogo-treino ao serviço do Fabril Barreiro
Tem sido contactado pela FAF? Sente que a FAF está atenta à sua evolução?
Antes do CAN 2019 ligaram-me a dizer que era um dos jogadores que tinha sido observado e perguntaram se tinha os documentos todos em dia caso fosse chamado, mas infelizmente passado um mês fui operado ao joelho e não sei se seria ou não chamado.

Acompanha o futebol angolano? O que acha do nível atual do Girabola e da seleção nacional? Quais são os atletas angolanos que mais admira?
Acho que o Girabola baixou muito a qualidade, pelo que acompanhei do meu tempo e pelo que vejo agora. A seleção nacional tem bons jogadores e tem de fazer mais com os jogadores que tem. Gosto muito do Gelson Dala e o Fredy.

É filho de Álvaro Mendes, ex-jogador do Barreirense e atual treinador. Que influência tem o seu pai na sua carreira?
Muita influência porque desde pequeno que o via jogar e claro que ele depois também puxou sempre para esse lado do futebol. Lembro-me que, quando comecei a jogar, mais ou menos aos oito anos, sempre me ensinou tudo. Com essa idade ele já me punha a analisar os meus jogos, porque ele filmava para me mostrar o que fazia de errado. E sempre me acompanhou até ir para fora, depois passou a ver só pela televisão ou pela internet e mesmo assim liga-me sempre a seguir aos treinos a perguntar como foi e a seguir aos jogos analisa-os comigo.

O seu pai jogou pelo Barreirense durante 14 épocas e foi treinador adjunto do Fabril, clube que o Pedro representou em 2019-20. Qual deles é o clube do coração da família Mendes?
Para o meu pai é o Barreirense, claro, jogou muitos anos lá desde a formação e foi capitão muitos anos também.

O seu pai também é treinador e orientou o União de Santiago em 2019-20. Gostava de ser treinado por ele?
Gostava porque quase tudo que sei de futebol e da minha maneira de jogar foi ele que ensinou, Claro que gostava de ser treinado por ele outra vez, já fui em miúdo e com ele sai para o Benfica, por isso seria bom.

Quem é o Pedro Rafael Amado Mendes? Como se define?
Sou tranquilo, calmo, não gosto de confusões e gosto muito de estar em família ou com amigos.

Como descreve a sua infância? Quais são as melhores memórias que tem da sua infância?
A minha infância foi feliz. Jogava muito futebol na rua, não ficava em casa nos computadores como hoje em dia. Estava sempre na rua a brincar e nunca me faltou nada da parte dos meus pais.

Pedro Mendes iniciou-se no Barreirense
Com que idade começou a dar os primeiros toques na bola? Em que clube começou?
Foi no Barreirense, por causa do meu pai. Tinha uns oito anos. Isto numa equipa porque na rua e na escola comecei muito antes.

Como se define enquanto jogador? Quais são as suas maiores referências?
Sou um jogador de equipa. Muitas vezes o meu pai, colegas e treinadores dizem para chutar mais à baliza porque tenho um bom remate, mas sou mais de fazer último passe. Acho que tenho qualidade técnica, jogo com os dois pés e tenho qualidade de passe curto e longo. A minha referência em miúdo era o Quaresma, tínhamos estilos parecidos no um contra um, mas com o passar do tempo fiquei um jogador diferente e comecei a seguir o Aimar.

Qual é o seu grande sonho enquanto futebolista?
Gostava de jogar num grande em Portugal.

Como está a viver esta fase de pandemia? Oque tem feito para manter a forma física?
Bem, porque fui pai há dois meses, então tenho estado mais em casa com a bebé, mas continuo a correr e a fazer musculação.



Entrevista realizada por Romilson Teixeira

























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