Berlusconi segura um troféu europeu ganho pelo AC Milan |
Chelsea,
Manchester
City e Paris
Saint-Germain passaram, nas duas últimas décadas, de clubes de pouca
relevância nacional e internacional para crónicos candidatos ao título europeu.
Os londrinos,
que dos três são hoje os que estão mais longe dos melhores dias, contam já com
duas orelhudas no palmarés desde que o magnata russo Roman Abramovich se tornou
proprietário em 2003. Os citizens
já conquistaram uma Champions
e atingiram outra final desde que a propriedade passou para Sheikh Mansour, dos
Emirados Árabes Unidos, em 2008. Por sua vez, os parisienses
têm o fundo governamental qatari Qatar Sports Investments como acionista
maioritário desde 2011, chegaram a uma final da Liga
dos Campeões e têm dominado o futebol francês.
Juventus à boleia da Fiat, Milan salvo por Berlusconi
Comecemos por Itália.
Juventus.
Vecchia
signora, não é? Clube lendário, não é? Dois títulos europeus, três Taças
UEFA, uma Taça das Taças e sete finais perdidas da Taça/Liga
dos Campeões. Zoff, Platini,
Del Piero, Zidane
e Buffon.
Mas desde 1923 que tem uma ligação umbilical com a FIAT e sua dona, a família
Agnelli. De 1900 até então havia conquistado um campeonato, desde então foram
35. Graças a esta relação entre clube e investidor, o emblema
de Turim tornou-se no primeiro clube profissional em Itália,
no sentido literal do termo.
Também viajando por Itália
se percebe que o saudoso Parma
abrilhantou o Calcio
na década de 1990 quando foi comprado pela multinacional Parmalat, do ramo
alimentar, mas que esse brilho se perdeu quando a empresa entrou em bancarrota
no início do século XX.
Os melhores períodos de Fiorentina
(Cecchi Gori) e Lazio
(Sergio Cragnotti) também estiveram associados a investidores. É necessário
recordar que o emblema
laziale chegou a bater o recorde mundial de transferências em 2000, poucas
semanas após se sagrar campeão de Itália
pela segunda vez na história, ao contratar Hernán Crespo ao Parma
por 56,81 milhões de euros – cerca de duas semanas depois, o Real
Madrid pagou ao Barcelona
os 60 milhões da cláusula de rescisão de Luís Figo.
Onze do AC Milan na final da Champions em 1989-90 |
Continuando em solo transalpino,
o AC
Milan estabeleceu-se desde cedo como um dos principais clubes de Itália
e da Europa, tendo vencido a Taça
dos Campeões Europeus em 1962-63 e 1968-69, depois de ter perdido a final
de 1957-58, e conquistou também a Taça das Taças em 1967-68 e em 1972-73. Mas
depois entrou num período de declínio, envolveu-se no escândalo Totonero,
foi relegado para a Série B como castigo em 1980 e foi despromovido novamente,
mas desportivamente, em 1982. Perante o fantasma da bancarrota, os rossoneri
foram adquiridos em 1986 pelo magnata Silvio Berlusconi, dono da Fininvest e da
Mediaset, que salvou o clube
milanês e investiu rios de dinheiro para o tornar pujante. O ponto alto
deste investimento foram as contratações dos holandeses Ruud Gullit, Marco van
Basten e Frank Rijkaard e as conquistas da Taça/Liga
dos Campeões Europeus em 1988-89, 1989-90 e 1993-94, tendo ainda perdido as
finais de 1992-93 e 1994-95.
Newcastle teve "Hall" de entrada para a elite
Mesmo em Inglaterra, até um clube
antigo e tradicional como o Manchester
United contou com ajuda externa até se estabelecer como um dos
principais emblemas do país. Foi fundado em 1878 sob a designação Newton Heath
LYR Football Club e pertencia à companha ferroviária Lancashire and Yorkshire
Railway e só ao fim de dez anos se tornou independente. Mais tarde, contou com
a ajuda de empresários, que promoveram injeções de capital em 1902, 1908 e 1931
para impedir a bancarrota.Onze-tipo do Newcastle em 1995-96 |
Também o Newcastle
cresceu desde que John Hall se tornou proprietário em 1992. Contratou Kevin
Keegan para treinador, deu-lhe carta branca para contratar os jogadores que
quisesse, evitou que os magpies
caíssem na Third Division durante a época de estreia e guiou-os ao topo do
futebol inglês, nomeadamente ao segundo lugar na Premier
League, em 1995-96 e 1996-97. Ao longo desse período, o clube bateu o
recorde mundial de transferências, ao contratar Alan Shearer ao Blackburn
Rovers por uma verba equivalente a 18 milhões de euros em 1996.
Abriram-se A(u)las para o Lyon
Em França, antes de haver um PSG
hegemónico, houve um Lyon
dominante. Esse domínio doméstico está associado a um homem, Jean-Michel Aulas,
que se tornou proprietário do clube em 1987 e investiu fortemente com o
objetivo de tornar num emblema estabilizado na Ligue
1 (onde não estava) e de o levar às competições europeias, tendo inclusivamente
apresentado um plano intitulado “OL
– Europe”. A promoção ao primeiro
escalão foi conseguida em 1988-89, numa época em que Aulas deu ao treinador
Raymond Domenech carta branca para contratar quem quisesse. Em termos de transferências
sonantes, a primeira remonta a 1999, quando o Lyon
contratou o brasileiro Sonny Anderson ao Barcelona
por 17 milhões de euros, uma verba recorde na altura por parte de um clube
francês. Entre 2001-02 e 2007-08 os leões
foram sempre campeões gauleses, tendo conquistado nesse período os únicos sete
campeonatos que têm no palmarés.Equipa-tipo do Marselha em 1992-93 |
A história do Marselha
também está associada a dois homens que acrescentaram dinheiro aos cofres do
clube, Marcel Leclerc (1965-1972) e Bernard Tapie (1986-1994), sobretudo este
último, que contratou jogadores de gabarito internacional e guiou o emblema
do sul de França à conquista da Liga
dos Campeões em 1992-93, a única Champions
do futebol gaulês.
Transferência recorde já foi do... Betis
Em Espanha
também houve fenómenos de crescimento artificial. O Betis
constituiu uma SAD em 1992, o seu presidente Manuel Ruiz de Lopera tornou-se
acionista maioritário, e as épocas que se seguiram foram de alguma pujança. Em
1994-95 coroou o regresso à Primeira
Liga Espanhola com a qualificação para a Taça
UEFA, em 1997 atingiu a final da Taça do Rei, nos anos que se somou mais
participações nas competições europeias e em 1998 bateu o recorde mundial de
transferências ao pagar 30 milhões de euros ao São
Paulo pela contratação do extremo brasileiro Denílson.
Pelos Países
Baixos há o exemplo do PSV,
que foi fundado pela companhia multinacional Philips, em 1913. Inicialmente o
clube estava apenas aberto a funcionários da empresa e só contratava jogadores
que fossem trabalhar para a Phillips, mas essa regra acabou por ser quebrada. A
Philips foi a principal sponsor nas camisolas do emblema
de Eindhoven entre 1982 e 2016, pagando anualmente 7,5 milhões de euros
pela publicidade. Em 1987-88 venceu a Taça
dos Campeões Europeus. Na cidade, o FC Eindhoven, que até nasceu uns anos
antes, declara-se o “clube do povo”.
No leste europeu era comum a
existência de clubes associados às forças armadas do seu país. O exemplo mais
sonante será o do Steaua
Bucareste, com uma ligação umbilical ao exército romeno, campeão
europeu em 1986.
O futebol português também tem
tido os seus casos de crescimento artificial. O mais sonante será certamente o
da CUF,
que tinha o mesmo nome da empresa Companhia União Fabril (CUF). Com condições
invejáveis, alcançou um brilhante 3.º lugar na I
Divisão em 1964-65, construiu um estádio e um complexo desportivo do mais
moderno que existia em Portugal, somou várias presenças nas competições
europeias e alcançou sucesso também em modalidades como ciclismo e hóquei em
patins. A nacionalização do grupo CUF, em 1975, na consequência da Revolução de
Abril ocorrida no ano anterior, coincidiu com a queda do Grupo
Desportivo da CUF, que, entretanto, se tornou Quimigal
e posteriormente Fabril.
Há ainda o caso do Riopele,
clube-empresa de Vila Nova de Famalicão que participou na I
Divisão em 1977-78, e que tão depressa apareceu como desapareceu.
E será que o Campomaiorense,
situado numa vila alentejana, alguma vez teria atingido as ligas profissionais e
a final da Taça
de Portugal sem o dinheiro investido pela família proprietária da Delta? E
os clubes madeirenses, que por diversas ocasiões nas competições europeias,
teriam sido tão competitivos sem o dinheiro do governo regional?
Equipa-tipo do Wolfsburgo em 2008-09 |
Na Alemanha,
mesmo sob regras apertadas que obrigam os clubes a deter pelo menos 50% mais
uma ação da totalidade das suas ações, o Wolfsburg,
campeão nacional em 2008-09, é subsidiário do Grupo Volkswagen. Mais
recentemente, o RB Leipzig nasceu por iniciativa da Red Bull, que
comprou os direitos desportivos do Markranstädt, do quinto escalão germânico.
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