quinta-feira, 25 de julho de 2024

“El Loco? Das hipóteses previstas no dicionário, escolheram a mais suave”. O mundo encantado de Bielsa

Imagem típica de Bielsa sentado na geleira no limite da área técnica
Marcelo Bielsa é um treinador com uma montra de títulos bastante modesta para os mais de trinta anos de carreira que já leva, mas há muito que é um técnico conceituado e reconhecido, sobretudo pelas suas ideias românticas e pelo futebol atrativo que as suas equipas praticam. Pep Guardiola considera-o uma referência, tendo até sido categórico ao elegê-lo como o melhor treinador do mundo. Quando ainda era um jogador recém-retirado, o agora homem do leme do Manchester City passou onze horas a conversar com ele na casa de Bielsa, na Argentina, um encontro decisivo para que o catalão seguisse a carreira de treinador.
 
Nascido a 21 de julho de 1955 no seio de uma família burguesa da cidade de Rosario, Marcelo Alberto Bielsa Caldera era filho e neto de advogados, enquanto os irmãos chegaram a ministro e vice-governador. Algo imaginável quando o vemos com um jeito simplório a ver os jogos das suas equipas quase sempre de fato de treino e sentado em cima de uma geleira no limite da área técnica.
 
Bielsa saiu de casa dos pais aos 16 anos e tornou-se num bom defesa, tendo representado o Newell's Old Boys e a seleção de sub-23 da Argentina. Mas retirou-se aos 25 anos para se dedicar ao treino.
 
Com o seu jeito filósofo, tem um discurso complexo e é capaz de alimentar conferências de imprensa durante várias horas, o que, aliado a um modelo de jogo arrojado, lhe valem a alcunha de “El Loco”. “Das hipóteses previstas no dicionário, elegeram a mais suave”, comentou numa ocasião.
 
Depois de quase uma década como olheiro e treinador de equipas jovens do Newell’s Old Boys, assumiu o comando da equipa principal em 1990 e o impacto foi imediato: venceu o Torneio Abertura em 1990 e o Torneio Clausura em 1992 e chegou ainda à final da Taça Libertadores em 1992. Esses dois anos correram tão bem que, em 2009, o estádio dos leprosos foi batizado de Estádio Marcelo Bielsa, depois de 98 anos sem qualquer nome oficial.
 
Uma das fases mais marcantes da sua carreira foi quando vestiu a pele de selecionador da Argentina, entre 1998 e 2004. Um dia, um dos seus irmãos encontrou-o sozinho num jardim, absorvido pelos pensamentos, e perguntou-lhe o que se passava. “Estou a pensar como fazer o Ortega entender em cinco minutos um conceito futebolístico que demora meia hora a explicar”, respondeu.
 
Numa altura em que o país vivia numa crise financeira profunda, a seleção albiceleste foi eliminada logo na fase de grupos do Mundial 2002, disputado na Coreia do Sul e no Japão. Quando voltou para casa, isolou-se durante três meses numa quinta, sem televisão, rádio nem telefone. Só ele e os livros. Corria dez quilómetros, lia e refletia. Assim eram os seus dias. Um dia o jornal Olé descobriu-o, mas o melhor que conseguiu foi tirar-lhe uma foto enquanto corria, pois Bielsa mandou-os embora e virou costas. No dia seguinte, o diário desportivo argentino fez uma manchete histórica: “Marcelo, somos teus amigos.”
 
O povo argentino entendeu que ninguém sofreu mais com aquela eliminação precoce do que Bielsa e aplaudiu-o quando em 2004 voltou para ganhar o ouro olímpico.
 
Depois tornou-se selecionador do Chile, derrotou a sua Argentina (com Messi em campo) e o Olé fez outra manchete histórica, talvez em jeito de correção da que tinha feito uns anos antes: “Não somos nada.”
 
O Chile de Bielsa, além de ter vencido pela primeira vez a Argentina num jogo oficial e de ter despedido o então selecionador albiceleste Alfio Basile, venceu pela primeira vez no Peru desde 1985 e somou o primeiro triunfo no Paraguai em quase 30 anos e a primeira vitória de sempre na Colômbia, conseguindo o apuramento para o Mundial 2010.
 
 
 
No verão de 2011, Bielsa regressou à Europa e mais concretamente a Espanha depois de uma curta passagem pelo Espanyol em 1998. Voltou a encantar, guiando o Athletic Bilbao às finais da Liga Europa e da Taça do Rei em 2011-12 e valorizando ativos como Javi Martínez e Fernando Llorente.
 
 
 
Mais recentemente, guiou o Leeds United à Premier League em 2020 e até viu uma rua da cidade ganhar o nome de Marcelo Bielsa Way.
 
No ano anterior também esteve perto da subida de divisão, mas depois de o Leeds marcar um golo ao Aston Villa com um jogador da equipa de Birmingham lesionado no relvado, ordenou aos seus jogadores para que deixassem o adversário marcar, estabelecendo o 1-1 final. Esse resultado impediu o Leeds de alcançar o segundo lugar que dava direito a promoção direta, mas a atitude do treinador argentino valeu-lhe o prémio Fair Play da FIFA.
 
 
Meses antes, admitiu que enviou um espião para o centro de treinos do Derby County, o que resultou numa multa de 200 mil libras por violar os regulamentos da Liga Inglesa.
 
Atualmente é selecionador do Uruguai. Tem 69 anos e está aí para as curvas.



 



  

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