Rui Sá está no comando técnico do Amora B desde 2021-22 |
Por vezes fica a saber no sábado
à tarde alguns jogadores que devem jogar no domingo, é obrigado a olhar para as
idades quando formula um onze e está sujeito a perder atletas para a equipa
principal e recrutar juniores a qualquer momento.
Em entrevista, Rui Sá admite que é
“duro” e “aliciente” ser treinador de uma equipa B, neste caso a do Amora,
diz não perceber os motivos de uma eventual exclusão dos bês amorenses
da Taça AF
Setúbal, traça os objetivos para a próxima época e revela se sentiu ou não
que poderia ter uma oportunidade como técnico do plantel principal quando João
Pereira saiu.
DAVID PEREIRA - O Rui Sá tem
sido o treinador do Amora
B praticamente desde que o projeto foi retomado, em 2021-22, tendo conquistado o título da
II Distrital na primeira época e assegurado a permanência na I
Distrital na segunda. Que balanço faz destes dois anos?
RUI SÁ – Foram dois anos muito
duros. Trabalhar com jovens jogadores que rapidamente deixam de ter idade para
jogar em contexto de equipa B, estar sempre a reformular equipas, levar
jogadores acima e trazer jogadores de baixo (sub-19) são projetos muito duros. É
duro e é aliciante trabalhar com jogadores mais jovens e tentar potenciá-los ao
máximo de forma a poderem chegar mais acima e fazerem carreiras de excelência.
E qual é o próximo passo?
O próximo passo da equipa B é
estar cada vez mais capaz e com jogadores com mais capacidade para alimentar
cada vez mais a equipa A. Esse é o grande objetivo. Queremos uma equipa a jogar
com cada vez mais qualidade, com melhores princípios e dotar os jogadores de
todas as valências para quando chegarem acima, para a distância entre a I
Distrital e a Liga 3 não ser tão grande.
Mas a diferença entre a Liga 3
e o Campeonato
de Portugal ainda é menor. O objetivo também não passa por colocar os
jogadores a competir num contexto competitivo mais elevado?
Isso seria ótimo, mas naturalmente
não deixa de ser uma ideia difícil. O nosso princípio não passa pelo resultado,
o nosso princípio passa pela qualidade e no que queremos incutir nos nossos
jogadores. Não nos preocupamos em ganhar a qualquer custo. Gostamos de ganhar e
de ter sucesso, mas naturalmente muitas vezes a procura do aperfeiçoamento condiciona
esse mesmo processo desportivo. O adquirir da maturidade para estarem mais
acima muitas vezes é inimiga do sucesso desportivo. Claro que, se fosse uma
possibilidade, não enjeitaríamos, mas o principal foco está nos jogadores e na
potenciação desses mesmos jogadores.
As equipas B nos clubes de I
Liga contribuem para uma transição mais suave de júnior para sénior de
jogadores que normalmente têm contrato por alguns anos e que teriam como
alternativa os empréstimos. No caso do Amora,
cuja equipa principal está na Liga 3 e que normalmente oferece contratos mais
curtos, quais são as principais vantagens de ter uma equipa B?
A mais valia é que ter uma equipa
de sub-19 nos campeonatos nacionais permite que a transição para o futebol
sénior, que é muito grande, não se perca. A equipa B, acolhendo alguns desses
sub-19, é um espaço de transição e de maturação que, caso não existisse,
dificilmente conseguiriam chegar à equipa A o maior número de jogadores. Num ou
em dois anos será possível perceber se têm condições para dar o salto. No ano
passado tivemos três ou quatro jogadores que viveram esse contexto que
conseguiram contratos profissionais e isso só foi possível porque existia este
espaço de crescimento. Hoje em dia fala-se muito do José Mário, mas começou a
época começou na equipa B e terminou na equipa A, e o Guilherme Magalhães fez o
mesmo percurso. Ou seja, tem um espaço de crescimento em baixo que, se não
existisse, não sei qual teria sido a opção para crescer e evoluir para depois
serem aproveitados em cima.
Esses jogadores estavam
inscritos nas duas competições? Como funciona essa burocracia?
Fala-se muito de as equipas B
irem buscar acima para jogar abaixo. Os espaços das equipas B, em termos de
regulamento, têm as faixas etárias muito bem definidas e identificadas. Quando
um jogador vem de cima para baixo, passando de uma competição profissional para
uma amadora, visa somente recuperar lesões. Não vem à procura do sucesso
desportivo, vem à procura de aproveitar esse jogador em contexto de equipa B,
porque vem de parado, por lesão ou castigo, ou não foi utilizado nesse fim de
semana, e vai para a equipa B para ter esses minutos para estar mais apto para
quando for chamado a competir pela equipa A. Não podem vir todos, mas é
devidamente pensado durante a semana.
E, por outro lado, qualquer
jogador da equipa B está elegível para jogar pela equipa A?
Todos os jogadores da equipa B do
Amora
estão inscritos na Liga 3. Não há jogadores inscritos na competição distrital,
todos eles fazem parte do lote de inscritos da equipa A, uns com contrato
profissional e outros com contrato amador. Naturalmente que todos os jogadores
que foram contratos para a equipa A estão no espaço da equipa A em treino.
“Somos informados no sábado à tarde de jogadores que devem competir no domingo”
Rui Sá levou Amora B ao 12.º lugar na I Distrital em 2022-23 |
Há sempre um limitado número
de jogadores que, em termos etários, podem ser a exceção numa equipa B. É quase
um Sudoku. O Rui tem muitas dores de cabeça para escolher a equipa tendo em
conta todas essas condicionantes?
É complicado, é uma gestão
complicada. É contra tudo aquilo que aprendemos, que é o processo, a repetição e
o trabalho em equipa. Mas é um processo normal e natural. Há jogadores que nos
chegam para ser opção sem terem trabalhado durante a semana connosco e somos
informados no sábado à tarde que devem competir no domingo. É o processo normal
das equipas B. Não visa nunca a componente desportiva na procura do resultado.
Tem a ver sim com esses jogadores terem minutos, por virem de lesão e
precisarem de um espaço para ganharem rotinas e ritmo. O mesmo se passa quando
temos juniores em contexto de equipa B. São jovens que não trabalham connosco,
mas que estão identificados e que achamos que devem competir num nível
competitivo sénior, mais exigente, para poder crescer. Se fizermos as contas
aos sub-19 e aos jogadores de equipa A que jogaram na equipa B, foram muitos
mais os sub-19.
Em termos de modelo de jogo e
sistema tático, é o Rui que escolhe o que pretende implementar ou existem
diretrizes que tem de respeitar?
Geralmente, é definido pela
equipa técnica, mas normalmente há uma orientação para equipa B, sub-19 e
sub-18 jogarem sempre no mesmo sistema. A equipa A, que é uma equipa de
rendimento, tem a possibilidade de alterar consoante o entendimento da equipa
técnica. Sem sermos rígidos ao máximo, temos uma linha de orientação que
seguimos, para ser mais fácil a transição de baixo para cima.
Tenho falado com outros
treinadores de equipas da I
Distrital e todos têm grande influência na construção do plantel. Isso
também acontece com o treinador de uma equipa B?
Temos um departamento de scouting,
que durante toda a época vai identificando jogadores com potencial para
integrar a estrutura do Amora,
e depois vamos discutindo entre equipa técnica e departamento de scouting, que
vai identificando e recrutando jogadores. Não sou eu que os escolho todos, naturalmente.
Tenho a minha opinião, como tem o diretor do departamento, e depois chegamos a
um consenso no sentido de encontrar aquilo que melhor serve os interesses do Amora,
tendo em conta o perfil técnico, físico e a personalidade que procuramos.
Como está a correr a
construção do plantel? A grande maioria são ex-juniores ou jogadores
recém-chegados ao Amora?
Estamos a falar de alguns
jogadores que vamos manter da época passada, de jogadores sub-19 que transitam
e outros jogadores que temos identificados e fomos recrutar porque acreditamos
que vão ser mais-valias na equipa B, mas com os olhos na equipa A. Alguns
jogadores vão ter que nos deixar porque atingiram o limite de idade e não vão
transitar para a equipa A.
“Não vejo o motivo pelo qual não possamos participar na Taça AF Setúbal”
Rui Sá foi jogador do Amora em 1995-96 |
Ao contrário das restantes
equipas da I
Distrital, na época passada o Amora
B não pôde participar na Taça AF
Setúbal, cuja fase de grupos antecede o início do campeonato. Já tem a
indicação se isso vai voltar a acontecer nesta temporada?
Não tenho. Foi uma situação com
que nos deparámos no início da época passada. Se seguirem a linha de orientação
da época passada, não participaremos. Para nós é um problema grande, porque
perdemos duas semanas sem equipas para competir enquanto as outras equipas
estavam em competição. Para nós vai ser complicado. Não vejo o motivo pelo qual
não possamos participar. Temos apenas uma equipa A que está noutra competição.
A não participação na Taça
significa que o Amora
B vai iniciar a pré-época mais tarde?
Exatamente. Estamos à espera que
saem todos os quadros competitivos para agendarmos todos os jogos de treino que
queremos fazer.
Na época passada não
conseguiram agendar nenhum jogo de preparação?
Não conseguimos. Todas as equipas
estavam em competição. Tínhamos outra equipa B no nosso distrito [Fabril], mas
não foi possível realizar esse jogo.
Vão jogar sempre no Serrado ou
existe a hipótese de fazerem alguns jogos na Medideira?
Quando a equipa A está em
competição, jogamos sempre no Serrado. Quando a equipa A termina a competição,
e aconteceu isso nas últimas jornadas da época passada, passámos para o relvado
da Medideira. No primeiro da equipa B, jogámos sempre na Medideira, porque a
equipa A jogava sempre no Complexo Carla Sacramento.
“Oportunidade na equipa principal? Não é coisa que me passe pela cabeça…”
A equipa principal do Amora
mudou de treinador. Quando soube que João Pereira não ia continuar, chegou a sentir
que poderia ter a sua oportunidade?
Honestamente, não é coisa que me
preocupe ou que me passe pela cabeça. Sou bem tratado e acarinhado e estou num
projeto sólido e consistente. Creio que o facto de estar a renovar ano após ano
significa que as pessoas estão contentes com o meu trabalho. Estou ali para servir
o Amora.
No que acharem que eu possa ser uma mais-valia, podem contar comigo.
Honestamente, não senti que pudesse possibilidade de eu ser ou deixar de ser.
Nada me foi dito. Não foi tema.
Mas é normal, se analisarmos o
que acontece em Portugal e não só, o treinador de uma equipa B ser sempre um
potencial candidato ao cargo de treinador da equipa principal…
Admito que sim, mas não tive isso
em mente e nada me foi apresentado. Estou a trabalhar na equipa B já há largos
meses a preparar a próxima época.
Já falou com o Pedro Duarte? O
que conhece do novo treinador da equipa principal do Amora?
Ainda não falámos. Foi
recentemente apresentado, mas vamos ter muito tempo para conversar e alinharmos
a estratégia do Amora.
Sei que já teve no estrangeiro, na II
Liga e já treinou os escalões de formação do Sp.
Braga. O feedback que eu tenho é de que é uma pessoa de trabalho e que vai
ter todo o sucesso do mundo, tal como teve o João Pereira, e terá todas as
condições para que o Amora
faça, no mínimo, o mesmo que fez no ano passado.
O Rui Sá foi jogador do Amora
em 1995-96, numa época em que a equipa desceu da II Divisão B à III Divisão,
poucos anos após ter estado na II
Liga. Quais são as principais diferenças entre o clube que deixou há 27
anos e aquele em que trabalha atualmente?
Na principal dimensão que define
um clube, a massa crítica e a massa adepta presente e viva, não notei muita diferença.
O Amora
continua vivo, bem vivo, com muitos adeptos, muita gente e com a localidade
muito envolvida no clube. Em termos de infraestruturas, está muito mais dotado
do que quando passei pelo Amora
como jogador, a todos os níveis: tem um complexo de treinos excelente, tem um
estádio com melhorias diárias e está muito mais capaz para estar um nível muito
mais elevado.
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