quinta-feira, 21 de março de 2019

Wu Lei. O Maradona chinês que brilha no Espanyol e goleou Messi nas redes sociais

Extremo chinês Wu Lei chegou ao Espanyol no final de janeiro
Foi há quase oito anos que Paulo Futre anteviu, numa conferência de imprensa memorável, o impacto que a vinda de um jogador chinês para o Sporting poderia ter para o clube. Mas nem Dias Ferreira ganhou essas eleições de 2011 nem um clube português seguiu a ideia. Hoje, porém, é em Espanha que joga "o melhor jogador chinês da atualidade", Wu Lei, que em mês e meio não só tornou o Espanyol um dos clubes mais vistos daquela liga mas também o seu contributo desportivo tem merecido elogios.


Conhecido como o Maradona chinês, estreou-se pelo clube de Barcelona a 3 de fevereiro de 2019, num empate a dois golos no terreno do Villarreal. Entrou apenas aos 78 minutos, mas, mesmo assim, a sua estreia foi vista por 40 milhões de pessoas na China. Um número impressionante, até se tivermos em conta que Espanha só tem 46 milhões de habitantes e apenas 177 mil pessoas assistiram ao encontro em solo espanhol. Curiosamente, dias depois ocorreu um clássico entre Barcelona e Real Madrid que não foi além dos dez milhões.

A isto junta-se um total de 350 milhões de telespectadores que assistiram à apresentação do jogador pelo emblema catalão, a 29 de janeiro. A Kelme, marca de equipamentos que patrocina o Espanyol, diz que foram vendidas mais de 400 camisolas de lei nas suas lojas, mas estima-se que tenham sido encomendadas cinco mil. É de ficar com os olhos em bico. "Temos um proprietário chinês [Chen Yansheng, do Rastar Group] e uma história que agora devemos construir noutro lugar", considerou o diretor para o futebol profissional Francisco Rufete. E segundo escreveu no início de fevereiro o portal Palco 23, especializado em informação económica do negócio desportivo, o Rastar Group já se encontra no terreno para colocar o club Blanquiazul cotado em bolsa no mercado de Hong Kong. Mas Wu Lei, de 27 anos, tem mostrado que não é apenas um fenómeno mediático e de marketing, embora tenha mais seguidores nas redes sociais (1,5 milhões) do que o clube (400 mil) e do que qualquer companheiro - o guarda-redes Diego López é quem mais se aproxima, com 134 mil. O extremo asiático também tem qualidade para jogar numa das melhores ligas do mundo. Conquistou a titularidade ao terceiro jogo, num empate a zero a Valência, tornando-se o primeiro jogador chinês a começar um jogo da liga espanhola, e voltou a figurar no onze nos três jogos que se seguiram. "Desde que chegou jogou duas vezes como suplente e quatro como titular e desde então o Espanyol não perdeu um único jogo", frisou ao DN Maria Carmen Juárez, jornalista que acompanha o Espanyol no jornal Mundo Deportivo desde 1991.

Melhor marcador da Superliga chinesa nas última três temporadas e campeão na época passada sob a orientação do treinador português Vítor Pereira, no Shangai SIPG, Wu Lei já mostrou a veia goleadora em Espanha, tornando-se o primeiro jogador daquele país a marcar em La Liga. A vítima foi o Valladolid, numa vitória caseira por 3-1, a 2 de março, mas a repercussão do golo constituiu uma autêntica goleada quando comparados com os números habituais da competição.


"As redes sociais ficaram loucas e a conta de La Liga, da Weibo, uma plataforma semelhante ao Twitter, bastante popular na China, gerou 28 mil reações (comentários, partilhas e gostos). Para comparar com outras grandes figuras desta conta, um golo de Messi tem habitualmente duas mil reações, ou seja, o de Wu Lei teve 14 vezes mais", explicou o responsável pela comunicação da liga espanhola na Ásia à Esports COPE, Javier Ibañez. "Chamam-lhe a grande esperança do país e isso é notório. Queremos que continue bem no Espanyol e na liga espanhola. É uma grande estrela aqui, ao ponto de ser o capitão da seleção. É o jogador que se via a dar o salto para a Europa e que, além disso, o faria bem. Têm muitas esperanças em que Wu Lei seja o ponta-de-lança do desenvolvimento do futebol chinês e que haja mais jogadores a dar o salto", prosseguiu.

A estreia goleadora de Wu Lei, que foi vista por 25 milhões de pessoas na China, mereceu também uma reação de Cristiano Ronaldo, que na rede social Weibo publicou uma fotografia de ambos tirada numa ação promocional no verão de 2017, acompanhada da legenda: "Um golo em Espanha, um grande marco para a China!"

Assistência para Ferreyra

Não satisfeito com o golo apontado no início do mês, o extremo chinês voltou à carga na última sexta-feira, desta vez com uma brilhante assistência para o golo do Espanyol no empate no campo do Athletic Bilbao, apontado por... Facundo Ferreyra, jogador emprestado pelo Benfica. Depois de se ter desmarcado nas costas da defesa adversária por Granero, Wu Lei viu o argentino em melhor posição e passou-lhe a bola de cabeça.

Camisolas de Wu Lei têm sido um sucesso na loja do Espanyol
Aos números mediáticos, golos e assistências, junta-se o trabalho defensivo e a vontade de se adaptar rapidamente a um novo futebol, algo que tem gerado muito agrado ao treinador Rubi e a todos os que laboram em prol do clube catalão. "Entende o jogo e tem capacidade para finalizar as jogadas, como os dados o demonstram. Nestas situações há sempre uma componente de risco, mas o futebolista tem feito a sua parte", elogiou Rufete. "Dá-nos muito, é rápido, inteligente e marca golos", elogiou o companheiro Borja Iglesias. "Tem muitíssima mobilidade e é difícil de marcar para os adversários. É vertical e por isso está aqui, porque acreditamos que é um grande jogador", salientou o técnico dos azuis e brancos. "É muito bom jogador, um avançado muito rápido, que se desmarca muito bem e sabe ler o jogo. Adaptou-se muito bem aos companheiros. É um jogador que tem ganas a jogar, procura o golo e já marcou um. Está sempre muito ativo no campo", descreveu ao nosso jornal Maria Carmen Juárez, que cobriu duas finais da Taça do Rei (2000 e 2006) e uma da Taça UEFA (2007) em que o emblema catalão participou.

Fora das quatro linhas, o esforço para integrar-se na equipa e na cidade é bem evidente. No domingo, por exemplo, fez questão de ir às ruas de Barcelona, juntamente com o companheiro Javi López, para apoiar todos os participantes da Maratona que decorreu na cidade espanhola.

Porém, não foi fácil levar o atacante da Ásia para a Europa. O salário dele era de dez milhões de euros brutos, um valor incomportável para o Espanyol, cujo teto salarial é cinco vezes inferior. Valeu um pacto entre Rastar Group (proprietário do Espanyol), o Porto de Xangai (proprietário do Shangai SIPG, ex-clube de Wu Lei) e o governo chinês. A ideia é potenciar o futebol no país, que aspira a organizar o Mundial 2030.

Dérbi aguardado com ansiedade

Se compatriotas não perdem os jogos de Wu Lei frente a equipas que não as que lutam pelo título em Espanha e independentemente do horário dos encontros, o dérbi com o Barcelona do próximo dia 30 está a ser aguardado com grande expectativa em solo chinês. Além de ser um encontro diante de uma equipa muito mediática, de opor formações da mesma cidade e do frente a frente com Lionel Messi, com quem é recorrentemente comparado na China, o jogo vai disputar-se às 15.15 de Lisboa (23.15 em Pequim), ou seja, será num dos horários menos problemáticos para o público daquele país, que só terá de ficar acordado até um pouco depois da 01.00 local.
Extremo chinês tem sido acompanhado por muitos compatriotas

O dérbi da Cidade Condal será o segundo confronto entre Wu Lei e Piqué em menos de um mês. Há cerca de uma semana, os dois lutavam pela distinção de melhor futebolista da 26.ª jornada da liga espanhola e o chinês venceu por goleada, com 56 800 votos contra 14 mil do central. Bem mais atrás ficaram Morata do Atlético de Madrid (4400) e Stuani do Girona (3600).

Os antecedentes nas big five

Wu Lei tornou-se o segundo jogador chinês a atuar na liga espanhola, sucedendo a Zhang Chengdong, que em 2015-2016 disputou um jogo pelo Rayo Vallecano, depois de ter passado por Mafra - apontou um hat trick ao Sporting num jogo da Taça de Portugal -, União de Leiria e Beira-Mar entre 2009 e 2012. O seu treinador, Paco Jémez, chegou a dizer que a contratação lhe "caiu como um tiro".

Porém, há mais antecedentes nas principais ligas europeias. Um dos mais conhecidos é o antigo lateral direito Sun Jihai, que representou os ingleses do Manchester City entre 2002 e 2008, tendo sido o primeiro chinês a jogar e a marcar na liga inglesa. Também em Inglaterra jogaram o ponta-de-lança Dong Fangzhuou, flop do Manchester United em 2007 antes de passar pelo Portimonense em 2010-2011; e o médio defensivo Zheng Zhi, em 2006-2007, ao serviço do Charlton.

O que marcou mais golos, porém, foi Yang Chen, autor de 16 remates certeiros (e dez assistências) pelos alemães do Eintracht Frankfurt entre 1998 e 2001. Igualmente pela Alemanha passaram o médio Shao Jiayi, que representou o 1860 Munique e o Energie Cottbus entre 2002 e 2009, e o extremo Hao Junmin, que passou pelo Schalke em 2010 e 2011 e terá sido o jogador a que Paulo Futre se referia na conferência de imprensa.













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