Tudo a postos na Rússia para o 21.º Campeonato do Mundo |
Contudo, não
deixo de reparar que essas grandes memórias de Mundiais são cada vez mais
longínquas, o que me faz pensar que os últimas edições foram uma desilusão – ou então,
ainda não houve distanciamento temporal suficiente para as avaliar. Talvez desde Ronaldo em 2002 que uma grande estrela do futebol não brilha de forma cintilante no grande
palco. Ainda não houve o Mundial de Cristiano
Ronaldo ou de Lionel
Messi, ainda que o argentino já tivesse chegado a uma final (2014) e sido
eleito (de forma controversa) o melhor jogador do torneio.
Os grandes
jogos, aqueles que são recordados sempre que se fala em Mundiais, também são
lembranças cada vez mais antigas. É verdade que há quatro anos, no Brasil, a
goleada por 7-1 imposta pela Alemanha à seleção anfitriã foi um marco muito
importante, mas mais pela expressão dos números. As equipas têm chegado às
fases finais já algo cansadas e optado cada vez mais por um estilo
pragmático, fazendo das partidas espetaculares uma raridade.
Ainda assim, o
entusiasmo mantém-se, as bandeiras voltam a agitar-se e tudo o resto vai ser
esquecido durante o mês da competição, que se inicia já na quinta-feira, com o encontro inaugural
da fase de grupos. Uma fase de grupos que terá como principais ausências Itália
e Holanda, ainda que também seja de lamentar a não participação de seleções que
se apresentaram a um bom nível em 2014, como Chile ou Estados Unidos.
Grupo A: O favoritismo uruguaio e os fatores casa e… Salah
O valor de
mercado (segundo o portal transfermarkt), o ranking FIFA e a perceção dos amantes de futebol não escondem o
favoritismo do Uruguai em passar à fase seguinte. A seleção celeste foi também
a segunda melhor da sempre muito competitiva zona de qualificação sul-americana,
em que o avançado Edinson Cavani mostrou a veia goleadora exibida semanalmente
ao serviço do PSG. Cavani, tal como o companheiro Luis Suárez, têm neste grupo
uma boa oportunidade de começar a ganhar alguma vantagem na corrida ao troféu
de melhor marcador do Mundial.
Campeão em 1930 e 1950, o Uruguai é favorito ao primeiro lugar do grupo |
A grande
incerteza, à primeira vista, é perceber quem vai acompanhar o conjunto
uruguaio. A Rússia tem desiludido nos últimos anos e também na
preparação, pois não triunfou em qualquer um dos sete últimos jogos. No
entanto, a tradição favorece a seleção anfitriã: só por uma vez é que os da
casa não passaram da fase de grupos, em 2010, quando a África do Sul organizou o
torneio. E quem tem um plantel composto quase na totalidade por jogadores que
alinham nos principais emblemas do campeonato russo tem que ter alguma
qualidade. Outro fator a ter em conta é o calendário: defrontar primeiro a
Arábia Saudita poderá ser positivo, pois somar três pontos no encontro
inaugural permitirá jogar com a pontuação e a classificação nas rondas
seguintes. Tudo isto faz-me aposta na Rússia.
Por outro lado,
a seleção do leste europeu não tem um jogador em tão boa forma como Mohamed
Salah, a grande estrela do Egito. Desde 1986, há sempre pelo menos uma
equipa africana a ultrapassar a fase de grupos. Quem está incluído num dos
grupos aparentemente menos fortes do Mundial e tem um
candidato a estar no pódio da Bola de Ouro, tem direito a sonhar. Em termos
de valor de mercado e de ranking FIFA, os faraós estão melhor colocados do que
a Rússia.
Com menos
expetativas está a Arábia Saudita, provavelmente a seleção mais frágil do
Campeonato do Mundo. Um ponto somado já será motivo de orgulho.
Grupo B: Portugal e Espanha, mas sem direito a excessos de confiança
Portugal
e Espanha são claríssimos favoritos, não só em passar à fase seguinte
mas também em ultrapassar o adversário que se seguir nos oitavos de final, pois
vão cruzar-se com os primeiros do Grupo A. São duas seleções recheadas de bons
jogadores, variadíssimas opções para cada posição e têm confirmado o poderio
nos encontros a doer.
Mundial 2018 poderá ser o último da carreira para Cristiano Ronaldo |
Contudo, os
vizinhos ibéricos medem forças logo no primeiro jogo, o que poderá significar
que um entrará na segunda jornada com três pontos e outro com zero. E o que
poderá significar também que Marrocos ou Irão poderão entrar nessa mesma
segunda ronda com três pontos, cenário que permitirá a um underdog jogar com a classificação nas derradeiras duas partidas.
Os marroquinos
vão apresentar-se na Rússia com nove jogadores que atuam nas cinco principais
ligas europeias e outros nove que competem noutros campeonatos europeus muito
competitivos. Aparentemente, Marrocos é a seleção africana que melhor consegue
fazer coabitar o talento individual e a organização coletiva, graças a um
selecionador, Hervé Renard, bastante conhecedor do futebol do continente negro.
Já o Irão não
tem qualquer jogador nos cinco principais europeus, mas tem o melhor marcador
da liga holandesa, Alireza Jahanbakhsh, e outros futebolistas que competem a um
nível bastante aceitável. Em relação a 2014, nota-se um upgrade no contexto competitivo do selecionado iraniano, que parece
apostar tudo no know-how do
selecionador Carlos Queiroz, na força do coletivo e na organização – foram a
primeira seleção a chegar à Rússia.
Grupo C: França e… mais um
Face a uma
geração recheada de grandes futebolistas em todas as posições, França
surge como principal candidata à vitória no grupo e como uma das favoritas a
conquistar o Mundial.
Seleção gaulesa é uma das principais favoritas à vitória final |
Confirmando-se o
poderio gaulês, resta saber quem vai acompanhar a seleção de Didier Deschamps
no apuramento para os oitavos de final. Ao contrário dos dois primeiros grupos,
este contempla a presença de três seleções das principais confederações: UEFA e
CONMEBOL. Ao olharmos para o valor de mercado dos 23 convocados, a Dinamarca
tem clara vantagem sobre Peru e Austrália. Contudo, os peruanos têm ligeira
vantagem no que ao ranking FIFA diz respeito – estão na 11.ª posição, uma acima
dos nórdicos. No entanto, a grande aposta de José Mourinho é… a Austrália.
Embora o Peru
tenha ultrapassado um desafio bem mais exigente na qualificação, prevejo a
qualificação da promissora Dinamarca, que estará representada por uma
geração de futebolistas muito interessante.
Grupo D: Argentina gera dúvidas e há potenciais surpresas à espreita
Olhando rapidamente
para os nomes das seleções deste grupo e para os jogadores que as compõem, a Croácia
e sobretudo a Argentina são as grandes favoritas em seguir em frente. Se
tivesse de apostar o meu dinheiro, era nelas que apostaria. Contudo, ao
recolher e juntar alguma informação, o grupo que aparentemente tem duas
seleções bem mais fortes do que as restantes poderá tornar-se no… grupo da
morte.
A Argentina foi
duas vezes campeã (1978 e 1986) e finalista do último Mundial, mas chega a
Rússia após uma qualificação bastante sofrida, apenas garantida na
última jornada e com a ajuda de terceiros, pois já não dependia apenas de si. A
seleção que tem Messi,
Higuaín e Dybala para o ataque, tem opções não muito convincentes para a baliza
e para a defesa – ao ponto de Salvio e Acuña serem os laterais de serviço - e o terceiro conjunto mais envelhecido, apenas superado por México e Costa Rica. Da albiceleste, é de esperar o 8 e o 80…
Argentina teve fase de qualificação bastante sofrida |
Já a Croácia
chega ao Mundial com uma segunda geração de ouro, depois da que brilhou no
final dos anos 1990 e era composta por craques como Suker, Boban, Stanic, Tudor
ou Vlaovic. Agora, há Modric,
Rakitic, Mandzukic ou Kovacic. No entanto, a seleção croata necessitou de ir ao
play-off para se qualificar para o
Campeonato do Mundo, depois de no seu grupo ter ficado atrás da… Islândia,
precisamente uma das adversárias na Rússia e que há dois anos atingiu os
quartos de final do Euro 2016.
Resta a Nigéria,
que na fase de apuramento venceu um grupo que incluía algumas das principais seleções
do continente negro: Zâmbia, Camarões e Argélia. Embora os grandes futebolistas
africanos habitualmente sejam oriundos de outros países, as super águias
aparentam reinar na produção de talentos em quantidade. Assim se explica a
participação em seis dos últimos sete Campeonatos do Mundo, a presença nos oitavos
de final do último torneio e o recorde de títulos mundiais em sub-17: cinco,
três dos quais nos últimos 11 anos. Em recente previsão à RT Sports, José Mourinho escolheu mesmo o selecionado de Gernot
Rohr como o acompanhante da Argentina na passagem à fase seguinte.
Grupo E: O favorito-mor no grupo da morte
Imparável desde
a chegada de Tite para selecionador, o Brasil é apontado pelas casas de
apostas como o principal favorito ao título – algo que, a confirmar-se, seria
apenas o segundo de um conjunto sul-americano em solo europeu. Com uma seleção francamente melhor do que a de 2014 em praticamente todos os setores, o escrete mistura criatividade e equilíbrio, um pouco à imagem de
1994 e 2002. Neymar
já deu sinais de que está totalmente recuperado da lesão, mas pelo sim pelo não
há Gabriel Jesus, Roberto Firmino, Coutinho ou Willian a assegurarem qualidade
no ataque. Bem diferente de ter Fred, Oscar ou Hulk, como foi o caso de há
quatro anos.
Neymar está a ganhar ritmo após lesão sofrida no início do ano |
Contudo, o grupo
da seleção canarinha é, em teoria, o mais complicado. A Suíça ganhou 10
dos 12 jogos da qualificação, perdendo apenas um dos duelos com Portugal e
empatando a zero com a Irlanda do Norte na segunda mão do play-off. Tem vindo a crescer e a consolidar-se, de tal forma que
está em 6.º lugar no ranking FIFA. O cenário mais provável é que seja a acompanhante do Brasil na passagem aos oitavos.
No entanto, se o ranking FIFA dá favoritismo à Suíça, é a
Sérvia a segunda seleção mais valiosa do grupo – 267,45 milhões de
euros, contra os 218,1 M dos helvéticos e os 40,98 M da Costa Rica. Individualmente,
os sérvios sempre contaram com jogadores muito talentosos, que agora aparentam
funcionar como equipa, depois de terem superado três equipas que estiveram no
Euro 2016 durante a qualificação: República da Irlanda, País de Gales e
Áustria. Matic, Zivkovic e companhia poderão beneficiar do duelo entre
brasileiros e suíços na primeira jornada.
Resta a Costa
Rica, que não pode ser excluída da equação. Há quatro anos, era vista como saco
de pancada de Uruguai, Inglaterra e Itália, mas foi primeira classificada do
grupo e só foi afastada da competições num desempate por grandes penalidades
diante da Holanda, nos quartos de final.
Grupo F: A maldição do campeão, a tradição mexicana e o carrasco de Holanda e Itália
A Alemanha
é campeã do mundo, foi implacável durante a qualificação e pelo meio ainda
venceu a Taça das Confederações com uma espécie de equipa B, mas curiosamente
não é apontada como a grande favorita a vencer o torneio. Talvez por não ter
uma grande individualidade, penso eu. Mas precisamente por não estar dependente
de um ou dois jogadores é que devia ser levada (ainda) mais a sério. Ainda
assim, a formação de Joachim Low tem uma espécie de maldição para se ver livre,
uma vez que em três dos últimos quatro Mundiais, o campeão em título não passou
da fase de grupos – foi assim com a França em 2002, a Itália em 2010 e a
Espanha em 2014. Também há a maldição de nenhuma seleção ainda ter juntado o
Campeonato do Mundo à Taça das Confederações, mas isso é lá mais para a frente,
na fase das decisões.
Alemanha e México defrontaram-se há um ano, para a Taça das Confederações |
Claramente favoritos
a seguir em frente, a dúvida de muitos é saber quem vai acompanhar os
germânicos. O ranking FIFA, o valor
de mercado do lote de convocados e as casas de apostas apontam o México
como principal candidato, algo que iria ao encontro do que tem sido a tradição
da tricolor – desde 1994 que a
eliminação mexicana ocorre nos oitavos de final. É o que vejo a acontecer.
Contudo, a Suécia
que pode parecer banal sem Zlatan Ibrahimovic é a mesma que derrubou Holanda e
Itália para marcar presença na Rússia, conta com 14 jogadores que atuam nas
cinco principais ligas europeias e seis campeões da Europa de sub-21 em 2005 –
sim, os que bateram Portugal na final. Jogar primeiro com a Coreia do Sul,
enquanto o México enfrenta a Alemanha, poderá ser favorável.
Para completar o
grupo, uma Coreia do Sul que já viveu melhores dias. Tem apenas cinco jogadores
a atuar na Europa, e quatro nas cinco principais ligas, dois dos quais
despromovidos na temporada que agora findou.
Grupo G: Abram alas para Bélgica e Inglaterra
Só uma hecatombe
poderá impedir o apuramento de Bélgica e Inglaterra, ficando
apenas por saber quem será primeiro e segundo. E como apenas se defrontam na
última jornada, o mais provável até é irem para esse jogo já com a passagem aos
oitavos de final garantida. Perante estas previsíveis facilidades, os belgas
terão a oportunidade de consolidar em competição o 3x4x3 de sempre difícil implementação.
Bélgica em 3x4x3 para que os craques coabitem em campo |
De acordo com o
portal transfermarkt,
o Panamá é a seleção mundialista com o valor de mercado mais baixo: 8,43 M €.
Segundo a mesma fonte, o valor médio de um jogador de Inglaterra e Bélgica
supera os 30 M €.
Pelo meio, mas
bem mais próximo dos norte-americanos do que dos europeus, anda a Tunísia, que
tem o 7.º plantel menos valioso do Mundial, apesar do 14.º lugar no ranking
FIFA.
Grupo H: Equilíbrio como nota dominante
Quatro
continentes estão representados naquele que é, em perspetiva, o grupo mais
equilibrado. A seleção mais valiosa, segundo o transfermarkt, é o Senegal. E a melhor classificada no ranking FIFA é a Polónia. Mas de
acordo com as casas de apostas, a Colômbia é a favorita a passar aos oitavos de final. O Japão aparece como underdog, mas ainda assim como o mais
assíduo nestas andanças: vai para o sexto Mundial consecutivo.
Olhando para a composição dos plantéis de cada seleção, os polacos são os que têm mais jogadores nas cinco principais ligas europeias (16), mas apenas com ligeira vantagem para colombianos (15) e senegaleses (também 15), e com os nipónicos a morder os calcanhares (11).
Olhando para a composição dos plantéis de cada seleção, os polacos são os que têm mais jogadores nas cinco principais ligas europeias (16), mas apenas com ligeira vantagem para colombianos (15) e senegaleses (também 15), e com os nipónicos a morder os calcanhares (11).
Colômbia e Japão vão repetir duelo do Mundial 2014 |
A escolha é
difícil, mas voto na Polónia de Lewandowski e no Senegal de Sadio Mané, com o
palpite de que sairá deste grupo a grande surpresa deste Campeonato do Mundo.
Portugal a cair nos quartos e estrelas a sair da sombra
Olhando para os
possíveis adversários em caso qualificação para os oitavos de final, Portugal
acaba por ter a obrigação de atingir os quartos de final. Tudo o que for
aquém dessa meta, será um fracasso. E tudo o que for além dessa fase, será um
êxito. A equipa das quinas tem todas as condições para ultrapassar não só o seu
grupo como o oponente que se seguir: Uruguai, Rússia, Egito ou Arábia Saudita.
Depois, poderá aparecer a França ou o Brasil, e aí a música é outra.
Por falar em
Brasil, reconheço o enorme upgrade em
relação a 2014, mas quando olho para o desfecho dos últimos Campeonatos do
Mundo, vejo que levou a melhor uma seleção com vários titulares do mesmo clube.
Foi assim com a Alemanha em 2014 (Bayern), a Espanha em 2010 (Barcelona e Real
Madrid) e a Itália em 2006 (Juventus). E talvez não seja apenas por mero acaso que apenas uma seleção não europeia tenha vencido um Mundial na Europa - precisamente o Brasil, no longínquo ano de 1958, em solo sueco. Por esta linha de raciocínio, prevejo
a Alemanha a sagrar-se bicampeã mundial.
No plano
individual, não espero que seja este, finalmente, o Mundial de Cristiano
Ronaldo ou de Lionel
Messi. Acredito que serão jogadores que habitualmente vivem na sombra
destes dois que vão brilhar de forma mais cintilante. O alemão Thomas Muller já
mostrou que tem apetência para desatar a marcar em Campeonatos do Mundo, o
francês Antoine Griezmann fez saber no Euro 2016 que pode guiar a sua seleção à
final, o inglês Harry Kane e o uruguaio Edinson Cavani estão incluídos em grupos
cujo graus de dificuldade baixos convidam a golos em catadupa, Eden
Hazard e Neymar
são os homens certos para desatar os nós com que Bélgica e Brasil se poderão
vir a deparar e a camisola da seleção espanhola poderá ser o traje perfeito
para Isco
e Marco Asensio mostrarem o que valem ao novo treinador do Real Madrid.
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