A minha primeira memória de… um jogo entre Boavista e Estrela da Amadora
Rui Óscar pontapeia a bola perante a pressão de Semedo
Embora não tenha qualquer afinidade
com os clubes em causa, lembro-me bem dos dois jogos em que se defrontaram na I
Liga em 2003-04. Porquê? Porque o Estrela
da Amadora, apesar de ter vários futebolistas que nas épocas anteriores
haviam passado por alguns dos grandes, como os ex-benfiquistas
Paulo Madeira, Rui Baião e Sabry e o ex-sportinguista
Marcos, foi uma espécie de saco de pancada das outras equipas no campeonato.
Apenas somou 17 pontos em 34 jornadas – só o Penafiel
de 2005-06 fez pior com 34 jornadas e vitória a valer três pontos (15) –,
resultado de 25 derrotas, cinco empates e apenas quatro triunfos. E, desses
quatro triunfos, dois foram frente ao Boavista,
na Reboleira e no Bessa. Na altura achei tão curioso que não mais me esqueci.
Numa altura em que um homem da
casa, Miguel Quaresma, já havia sucedido ao “luvas pretas” João Alves no
comando técnico, os amadorenses
partiram para a 12.ª jornada no último classificado, com apenas quatro pontos,
ao passo que o Boavista
de Erwin Sánchez ocupava a um interessante quinto lugar, a dois pontos do
vice-líder Sporting.
Os axadrezados, que continuavam a ter na equipa os campeões William, Rui Óscar,
Martelinho, Duda, Frechaut e Jorge Silva e ainda contavam com Ricardo Silva, Raul
Meireles, Ricardo Sousa e Fary, entre outros, tinha uma equipa claramente
candidata a um lugar europeu e estavam a ter um bom início de época. Mas, na
Reboleira, o Estrela
agigantou-se, mostrando uma versão que pouco tinha sido avistada naquela época.
Logo aos seis minutos, Semedo
aproveitou uma escorregadela de Ricardo Silva para se isolar pela esquerda e,
perante a saída de William, endossar a bola a Júlio César, que fez o 1-0. O
empate chegou no início do segundo tempo, através de um remate forte e colocado
de Ricardo Sousa ao ângulo superior esquerdo da baliza de Veiga (56’). Mas,
menos de um quarto de hora depois, o recém-entrado Sabry devolveu a vantagem
aos estrelistas,
ao desviar a bola de William a passe de Bernardo Cariata (69’).
“Pelos vistos, o Estrela
da Amadora só encontra motivação frente àquelas que, em teoria, são as
melhores equipas do campeonato. Assim aconteceu frente
ao FC Porto, com um empate prometedor; diante do Marítimo, na primeira
vitória tricolor;
e agora contra o Boavista,
que ainda não tinha perdido fora de casa nesta edição da I
Liga. Ontem, o Estrela
pode ter ido de encontro a uma oportunidade que, a não se verificar, poderia
ter sido a última, uma vez que uma nova derrota deixaria a turma
da Amadora, em vésperas de receção ao Sporting,
cada vez mais afundada na classificação. Porventura irremediavelmente. Mas os
atletas da casa parecem ter entrado em campo conscientes disso mesmo. A equipa
revelou uma determinação fora do comum, foi incisiva e rápida na criação e
desenvolvimento das jogadas ofensivas, demonstrando que estava aplicada, mais
do que nunca, na conquista dos três pontos”, podia ler-se no jornal O Jogo.
A vitória do Estrela
pouco mudou para os amadorenses,
que até irem ao Bessa só haviam somado mais seis pontos em 16 jornadas e
poderiam sair da cidade do Porto com a despromoção assegurada em caso de derrota,
quando ainda faltariam disputar cinco jogos. No entanto, o Estrela
foi ao Bessa bater um Boavista
que estava a perder o comboio europeu, novamente por 2-1. Alex Garcia adiantou
os tricolores
aos 17 minutos, após grande cavalgada sobre a meia esquerda. Fary restabeleceu
a igualdade onze minutos depois, na sequência de um livre executado a partir da
esquerda. E Miran deu a vitória aos estrelistas
já na reta final da partida, também na sequência de um livre apontado pelo lado
esquerdo (84’). “A derrota do Boavista
não interessa para nada. O que importa de facto é realçar que o Estrela
da Amadora ganhou e com isso somou os primeiros pontos fora de casa e logo
num terreno onde apenas FC
Porto e Gil
Vicente haviam passado incólumes. Parece mentira? Não seria certamente este
o resultado que quase todos vaticinariam, mas a verdade é que nem é preciso
questionar a justiça sobre o resultado. Foi limpinho. Falar deste jogo na perspetiva
da derrota axadrezada será desvalorizar uma vitória clara e feita de algo que
faltou ao Boavista:
coletivo, espírito de grupo, capacidade de luta, vontade e todos os outros
adjetivos que normalmente são colocados à frente de uma equipa que vence
justamente... Talvez seja tarde para quem está tão atrasado na classificação,
mas é necessariamente um resultado que coloca dúvidas sobre os motivos de o Estrela
ser a equipa que carrega a lanterna vermelha desde os primórdios da I
Liga. Ontem, a equipa de Manuel Quaresma foi tão superior que no final
merecia mais as palmas do que o Boavista
os assobios que ouviu. Honestidade e ato de contrição: antes do apito final as
contas que se faziam incluíam sempre a derrota do Estrela
e a eventualidade de esse resultado ditar desde já a despromoção. Era natural
que assim fosse. Bastava um olhar rápido pela classificação. O apito para o
início trataria de mandar tal ideia para a reciclagem”, escreveu o jornal O
Jogo na edição do dia seguinte.
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