Oriundo do Vilafranquense
(Campeonato de Portugal) e com passagem pela formação do Benfica, Alfa
Semedo chegou há dois anos à I Liga pela porta do Moreirense, pegou
de estaca na equipa, foi
uma das revelações do campeonato e adquiriu
o bilhete de regresso à Luz no início da temporada passada. Viveu na sombra
de Fejsa, acabou por perder espaço até para Samaris, ao ponto de ser emprestado
em janeiro ao Espanyol e agora ao Nottingham Forest, mas ninguém duvida que
ainda poderá ser bastante útil ao clube encarnado.
As declarações do seu então
treinador Sérgio
Vieira, em janeiro de 2018, dizem quase tudo sobre ele: “Não tenho dúvidas
de que vai ser jogador de clube grande e ainda o vamos aplaudir na Seleção
Nacional. (…) Mas não nos podemos esquecer que tem 20 anos e veio do Campeonato
de Portugal. Ainda não tem maturidade na tomada de decisão.”
Entretanto, o médio já completou
21 anos, mas os argumentos continuam válidos. Desconstruindo o discurso do
agora técnico
do Farense, o jovem futebolista tem potencial “de clube grande” não porque
foi apenas mais um a fazer uma excelente temporada num emblema mais pequeno –
até porque ainda tem lacunas consideráveis e acumulou alguns erros, próprios de
quem ainda está verde -, mas pelo tipo de qualidades que vai exibindo. Como
médio defensivo, não é um mero destruidor de jogo. Mostra grande capacidade na
construção e oferece à equipa a possibilidade de sair a jogar com segurança
desde três.
“É um jogador muito corajoso. Por
vezes, corria alguns riscos desnecessários, mas sabe ter bola. Joga bem porque
sabe. Para a idade, era de admirar o que fazia com aquela idade. Ele tinha
capacidade para assumir as coisas. Não tinha medo, não se escondia”, afirmou ao
Record um dos seus antigos
treinadores no Vilafranquense, Vasco Matos, por altura da transferência para o
Benfica.
São valências semelhantes que
fazem com que Danilo Pereira e William
Carvalho, por exemplo, estejam no patamar em que estão. Contudo, Alfa
Semedo ainda não tem a tal “maturidade na tomada de decisão”, pelo que
ainda não consegue traduzir toda a sua qualidade técnica em ações eficientes,
que permitam à equipa reter a bola e progredir no terreno, consoante as
necessidades. Evoluir nesse aspeto e manter a concentração durante os 90
minutos são as missões que, quando cumpridas, certamente o catapultarão para um
papel de destaque num clube de maior dimensão. O potencial está bem patente.
"Privilegiado" pela estampa física
Por outro lado, no que concerne
aos momentos defensivos, vai igualmente revelando características muito interessantes
quando se pensa num ‘6’ de clube grande. Tem agilidade, velocidade e estampa
física acima da média (1,90 m), é forte nos duelos (aéreos e à flor da relva) e
rápido a recuperar a posição, algo fundamental nas transições ataque-defesa.
A capacidade atlética do
futebolista nascido em Bissau faz a diferença nas bolas paradas, tanto
defensivas como ofensivas. Exemplo disso é o número de golos que tem valido por
época: apontou
três em 2017/18, na estreia na I Liga; marcou quatro da temporada anterior;
e, antes faturou dez pelos juniores do Benfica. “O físico que ele tem é uma
ajuda muito grande para o futebol moderno, até porque poucos a têm até a um
nível alto. É um privilegiado nesse aspeto”, considera Vasco Matos.
Transportador de jogo por excelência
Percebendo que tinha aqui um
diamante ainda longe de estar completamente lapidado, mas ainda assim cada vez
menos em estado bruto, as águias bateram a concorrência de clubes como
Marselha, Celta de Vigo e Club Brugge e avançaram
para a contratação do médio que ajudaram a formar, por cinco temporadas.
Aquando da sua passagem pelo
Vilafranquense, os companheiros chamavam-lhe ‘Pogba guineense’, até porque na
altura era um ‘8’ com capacidade de chegada área - e transporta bem jogo,
qualidade que continua notória. Contudo, em
Moreira de Cónegos recuou uns metros, para a posição de médio defensivo, e
pensando nos ‘6’ que passaram pela Luz nas últimas temporadas, é com o estilo
de Matic – curiosamente outro jogador do Manchester United - com que mais se
assemelha.
Depois de uma primeira temporada
sem grande tempo de competição, primeiro às
ordens de Rui Vitória no Benfica e depois no empréstimo
ao Espanyol, vai agora ganhar rodagem no histórico Nottingham Forest, clube
que milita no Championship, uma II liga (inglesa) que em nada fica a dever a
grande parte das primeiras ligas da Europa.
De Bissau para o mundo
Alfa
vivia com um tio em Bissau. Segundo uma reportagem do MaisFutebol
em julho do ano passado, “era um miúdo envergonhado, educado e com uma aparente
boa estrutura familiar. Sem grandes luxos, mas com a estabilidade que faltava a
muitos colegas da mesma idade e com os quais seguia de manhã para os treinos
que começavam às 7 de terminavam às 9. Havia quem comesse só uma vez por dia;
duas a contar com a refeição que lhes era entregue no final de cada sessão:
pão, ovo e garrafas de água ou sumos.”
Aos 15 anos, depois de ter
passado com distinção nas captações de uma recém-criada academia de Bissau,
participou num torneio em abril de 2013 em que estiveram presentes
representantes do Benfica, da Gestifute e de outras empresas de agenciamento.
Os relatos dizem que já se destacava
da maioria dos restantes companheiros, por ser “dotado de boas capacidades
físicas e técnicas” e por apresentar “boas noções táticas”, assimilando “com
facilidade os conceitos que lhe eram passados pelos treinadores”, jogasse a
central ou médio.
Aos 16 anos, foi colocado na
equipa sénior do Balantas de Mansoa, filial do Belenenses que era na altura o
campeão guineense.
Cerca de um ano depois, em
fevereiro de 2015, após alguns meses a viver em Portugal, ultrapassou barreiras
burocráticas e assinou pelo Benfica - apesar do interesse do Liverpool -,
fazendo parte da equipa de juniores onde se destacam nomes como Ferro, Rúben
Dias e Renato
Sanches.
Seguiu-se o empréstimo ao
Vilafranquense de Filipe Coelho, que já o tinha debaixo de olho. “Observei-o e
chamou-me à atenção na fase final do campeonato de juniores. Ele jogou a
avançado e creio que até foi o melhor marcador do Benfica nessa fase”, recordou
ao MaisFutebol.
No Ribatejo, Alfa
foi titular indiscutível. “Creio que só falhou um jogo. Começou a jogar a ‘8’
comigo e algumas vezes a ‘6’, mas mais vezes na posição ‘8’. O que saltava logo
à vista? Já tinha uma capacidade física acima da média, era um jogador muito
focado no treino e com níveis competitivos muito elevados. Via-se que tinha uma
margem de progressão enorme e potencial para estar ao nível de uma I divisão,
mas talvez não esperasse que ele tivesse uma ascensão tão rápida. Confesso que
me surpreendeu o facto de o professor Manuel Machado ter apostado tão cedo num
miúdo com 19 anos”, lembrou Filipe Coelho.
“Ele podia estar no CNS, mas
sabia que queria sair dali rapidamente. Cheguei a conversar com ele porque
podia ter ficado abalado pela forma como saiu do Benfica. Depois de ser o
melhor marcador da equipa de juniores, era normal que achasse que podia ficar
na equipa B. Mas ele não se deixou abalar minimamente, até porque confiava
muitos nas próprias capacidades e sabia que tinha, mas do que potencial para
chegar à Liga”, contou o treinador.
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