Chamam-lhe o Clássico dos Milhões porque é um dos clássicos dos que envolve um
maior número de adeptos no Brasil. Flamengo
e Vasco
da Gama protagonizam uma das mais acesas rivalidades do futebol brasileiro
e que vai além do futebol: começou no remo ainda no remo na década de 1910 e
estende-se a outras modalidades como basquetebol, natação, voleibol, judo ou
futebol americano.
Embora a existência dos dois
clubes remonte ao século XIX, o primeiro duelo no desporto-rei foi em 1922,
intensificando-se nos anos seguintes, com a subida dos vascaínos à primeira
divisão carioca.
Além de vários clássicos
emocionantes que decidiram vários troféus estaduais, os dois clubes do Rio de
Janeiro já se defrontaram na final da Copa do Brasil e em meias-finais do
Campeonato Brasileiro, somando mais de 400 confrontos entre eles.
Zico, Bebeto, Romário e Edmundo
foram algumas das estrelas que brilharam naquele que é considerado um dos
encontros mais eletrizantes do futebol sul-americano. Entre centenas, veja aqui
a nossa seleção dos dez melhores, por ordem cronológica.
3 de dezembro de 1978 –
Campeonato Carioca (última jornada da Taça Rio)
O jogo que marcou o início de uma
série incrível de títulos conquistados pelo Flamengo,
que durou até 1983, naquela que ficou conhecida como a “Era Zico”. O mengão já tinha vencido a primeira volta
do Campeonato Carioca, a Taça Guanabara, o que no mínimo lhe garantia um lugar
na final do campeonato, contra o vencedor da segunda volta, a Taça Rio de
Janeiro.
Por coincidência do calendário,
na última jornada da segunda volta houve um encontro entre os dois primeiros e
que decidia o vencedor do torneio. O Vasco
entrava em campo na liderança, invicto, com dez vitórias em outras tantas
jornadas. O Flamengo
estava um ponto atrás, numa altura em que o triunfo valia apenas dois pontos. O
empate no Maracanã bastava ao Vasco,
mas o Flamengo
queria já sagrar-se campeão carioca perante 120 mil pessoas no seu estádio, sem
ter necessidade de disputar a final.
A igualdade prevaleceu até bem
perto do final, quando Rondinelli saltou mais alto do que toda a gente e
cabeceou para o fundo das redes na sequência de um canto de Zico do lado
direito (87’).
5 de outubro de 1996 –
Campeonato Brasileiro (13.ª jornada da primeira fase)
O Vasco
levava quatro jogos sem vencer o rival no Campeonato Brasileiro, enquanto o Flamengo
apresentava um reforço de luxo: Bebeto. Porém, o atacante que tinha passado os
quatro anos anteriores nos espanhóis do Deportivo da Corunha não teve uma
receção fácil no regresso ao mengão,
uma vez que a torcida não esqueceu que ele se tinha declarado vascaíno quando
deixou o Flamengo
para jogar no Vasco
em 1989.
Logo no início do jogo, Bebeto
viu um golo ser-lhe anulado. Entretanto, Edmundo bisou para o Vasco
(7’ e 34’) e, quando o Flamengo
teve a oportunidade de reduzir a desvantagem através de penálti, Bebeto atirou
ao poste, para gáudio dos torcedores
vascaínos, que entoaram em coro “Bebeto é vascaíno”. No segundo tempo, Macedo
(50’) e Edmundo (66’) aumentaram a diferença e, já na reta final, Bebeto fez o
golo de honra do Flamengo,
de grande penalidade (81’), e viu novamente um golo ser-lhe anulado.
3 de dezembro de 1997 –
Campeonato Brasileiro (5.ª jornada da segunda fase)
Numa altura em que o Brasileirão
ainda não se decidia em pontos corridos, os oito primeiros classificados da
primeira fase eram divididos em dois grupos de quatro, com os vencedores de
cada grupo a apurarem-se para final. O Flamengo
e o Vasco
ficaram no mesmo agrupamento e, a duas jornadas do fim, eram as únicas equipas
com hipóteses de chegar à final, estando separados por três pontos, com
vantagem para os vascaínos, que já não perdiam para o rival há cinco anos.
O Maracanã estava lotado, mas
nada que assustasse Edmundo, que voltou a ser protagonista. O “Animal”, como
era conhecido, inaugurou o marcador aos 16 minutos, mas o emblema cruz-maltino
ficou reduzido a dez ainda antes do intervalo, devido à expulsão de Nelson.
O Flamengo
entrou confiante na segunda parte, mas Edmundo voltou a marcar aos 54’. O
mengão reduziu a desvantagem a cerca de um quarto de hora do fim, através de um
penálti convertido por Junior Baiano, mas na reta final Edmundo voltou a
aparecer, assinando o hat trick. Já
em tempo de compensação, Maricá sentenciou o resultado em 1-4.
6 de junho 1999 – Taça Rio
(última jornada)
Mais uma vez por coincidência do
calendário, Flamengo
e Vasco
eram as únicas equipas a poder lutar pelo título e jogavam entre eles na última
jornada. Muitas vezes, este jogo é erradamente recordado como a final da Taça
Rio, mas não. Foi apenas a partida que decidiu o título.
O emblema cruz-maltino entrou no
Maracanã com mais dois pontos do que o rival, que tal como em 1978 pretendia
juntar a Taça Rio à Taça Guanabara e sagrar-se imediatamente campeão
carioca. Porém, o Vasco
não estava para aí virado e voltou a gelar o Maracanã com mais uma grande
exibição de Edmundo que apontou os dois golos dos vascaínos já no decorrer da
segunda parte (63’ e 90+3’) numa altura em que tinha regressado há pouco tempo
ao clube após passagem pelos italianos da Fiorentina.
Ainda assim, duas semanas depois
o Flamengo
acabou por se sagrar campeão carioca, ao vencer a final a duas mãos com o
rival: 1-1 em casa e 1-0 fora, embora ambos os jogos tivessem sido no Maracanã.
23 de abril de 2000 – Taça
Guanabara (última jornada)
Virtualmente o Vasco
tinha entrado como campeão para a última jornada, mas o Flamengo
alimentava a esperança de obter dois pontos na secretaria devido a um jogo
frente ao Cabo Frio, que tinha terminado empatado a zero, alegando que o
guarda-redes adversário foi utilizado irregularmente.
A decisão da Federação Carioca em
não atribuir os pontos ao mengão só
foi atribuída depois, pelo que mais uma vez um clássico na última jornada
ganhava contornos decisivos para a atribuição de um troféu. Isto apesar de o Vasco
já se considerar campeão, conforme tinha frisado o presidente Eurico Miranda: “Nós
não vamos fazer o Flamengo
botar a faixa, porque se o Flamengo
botar faixa no Vasco,
estraga a faixa.”
Naquela que seria apelidada de
final de chocolate, por acontecer em pleno domingo de Páscoa e por o presidente
vascaíno ter distribuído 40 mil ovos de chocolate pelos adeptos, o Vasco
deu chocolate em campo e goleou o rival por 5-1.
A equipa rubro-negra até
inaugurou o marcador pelo ex-avançado sportinguista Leandro Machado, logo aos 6
minutos. Porém, Felipe empatou aos 14’, antes do hat trick de Romário (25’, 50’ e 56’). Pedrinho sentenciou o
resultado aos 68 minutos, num encontro que teve seis expulsões, três para cada
lado: Odvan, Viola e Alex Oliveira para o Vasco;
Luís Alberto, Beto e Fábio Baiano para o Flamengo.
No final do jogo, os 40 mil
torcedores vascaínos no Maracanã festejaram a confirmação do título e entoaram
cânticos como “uh, é chocolate!” e “Urubu otário! Vem para o Maraca só para ver
gol do Romário!”.
26 de maio de 2001 –
Campeonato Carioca (segunda-mão da final)
Até quem não é brasileiro já
deverá ter ouvido o famoso vídeo em que um locutor vascaíno narra o golo de
livre direto que desvia o título do Vasco
para o Flamengo
nos últimos minutos. O vídeo é uma montagem, mas o desgosto dos torcedores cruzmaltinos foi bem real.
O Vasco
tinha vencido fora por 2-1 na primeira-mão, no Maracanã, que também foi palco
do segundo jogo do final. Segundo as regras da competição, os vascaínos até se
poderiam dar ao luxo de perder pela diferença de um golo, por terem obtido mais
pontos do que o rival nas duas primeiras fases, a Taça Guanabara (vencida pelo Flamengo)
e a Taça Rio (conquistada pelo Vasco).
O Gigante da Colina teve quase
sempre a situação controlada. Depois do flamenguista Edílson ter inaugurado o
marcador aos 21 minutos de penálti, Juninho Paulista empatou aos 40’. Edílson
voltou a marcar no início do segundo tempo (53’), mas o 1-2 servia as intenções
do Vasco.
Esse resultado persistiu até bem perto do final, quando uma execução magistral
de um livre direto por parte de Petkovic não deu qualquer hipótese ao goleiro
vascaíno Hélton (88’), que anos depois haveria de representar União de Leiria e
FC Porto. Por falar em guarda-redes, na outra baliza esteve um muito inspirado
Júlio César, que nessa tarde ajudou o Flamengo
a sagrar-se tricampeão carioca e que mais tarde passou por Inter de Milão e
Benfica.
26 de julho de 2006 – Copa do
Brasil (segunda-mão da final)
Pela primeira vez (e para já
única) na historia, os rivais cariocas defrontaram-se numa final nacional.
Renato Gaúcho estava invicto à
frente do Vasco
diante do Flamengo,
mas na primeira-mão foi surpreendido pelo sistema de três centrais apresentado
por Ney Franco, que guiou o mengão a
uma vitória por 2-0 em casa, no Maracanã, com golos de Obina (59’) e Luizão
(62’) já no decorrer da segunda parte.
No segundo jogo o Vasco
estava obrigado a ganhar por dois golos para atirar a decisão para grandes
penalidades ou por três para conquistar o troféu, mas quem acabou por vencer
novamente foi o Flamengo,
com um golo de Juan ainda na primeira parte (28’).
22 de abril de 2012 – Taça Rio
(meia-final)
Um clássico emocionante no
Engenhão, impróprio para cardíacos. Vagner Love inaugurou o marcador para o Flamengo
logo aos dois minutos, mas o Vasco
não acusou o golo e como resultado de uma pressão avassaladora deu a volta
ainda no primeiro tempo, pelo antigo atacando benfiquista Éder Luís (13’) e o
inspiradíssimo Felipe (40’), que se exibiu em grande nível.
Logo no arranque do segundo
tempo, Felipe (47’) fez o terceiro para os vascaínos e Kleberson reduziu logo depois
para o mengão (52’), que até ao final
do encontro alimentou a esperança de se tornar bicampeão carioca.
Num jogo bom demais para apenas
20 mil pessoas presentes no estádio, a torcida do Vasco
não perdoou o rival após o último apito do árbitro. “Eliminado” e “Adeus,
Mengo!”, ouvia-se das bancadas. O emblema cruz maltino seguiu para o jogo de
atribuição do troféu, onde foi derrotado pelo Botafogo (1-3).
24 de abril de 2016 – Campeonato
Carioca (meia-final)
Num jogo quentinho, que valeu o cartão
amarelo ao vascaíno Nenê e ao flamenguista Wallace logo aos três minutos, o Vasco
mostrou-se superior ao rival em Manaus e traduziu essa superioridade numa
vitória indiscutível. Andrezinho inaugurou o marcador aos 21’ para os cruzmaltinos,
numa jogada de insistência. No segundo tempo, um autogolo de Wallace fez o
segundo para o Vasco,
depois de remate de Riascos defendido por Paulo Victor contra o capitão do mengão, que antes do jogo fincou a
bandeira do clube no relvado.
Este foi o nono encontro
consecutivo em que os vascaínos não perderam para o rival e serviu para
carimbar o acesso a uma final onde se sagraram bicampeões cariocas pela
primeira vez desde 1993.
21 de abril 2019 – Campeonato
Carioca (segunda-mão da final)
Um jogo muito recente e que valeu
um despedimento. O Vasco
começou o Campeonato Carioca por vencer a Taça Guanabara e até chegou à final
da Taça Rio, onde perdeu para o Flamengo
apenas nas grandes penalidades.
Os rivais voltaram a encontrar-se
na final do Campeonato Carioca, onde a superioridade do Flamengo
foi clara nas duas mãos. Depois de triunfo por 2-0 fora (bis de Bruno Henrique),
no Estádio Nilton Santos, o mengão
foi novamente superior no Maracanã e repetiu o resultado, com golos de Willian
Arão (15’) e Vitinho (83’).
Perante tal humilhação, de nada
valeu ao treinador Alberto Valentim ter mantido os vascaínos na Série A do
Brasileirão, ter conquistado a Taça Guanabara e ter perdido a Taça Rio apenas
nos penáltis: foi demitido logo a seguir ao jogo.
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