Vídeo de "best of", hora de recolher e copo de leite na cama. Como Futre levou Porfírio para o West Ham e cuidou dele
Porfírio marcou quatro golos em 27 jogos pelo West Ham em 1996-97
Depois de uma birra por causa da
camisola 10, Paulo
Futre estreou-se pelo West
Ham como suplente utilizado num empate caseiro com o Coventry City, a 21 de
agosto de 1996, na 2.ª jornada da Premier
League. Seguiram-se quatro jogos seguidos como titular, sendo que no último
deles, numa receção ao Wimbledon, teve de ser substituído ainda no decorrer da
primeira parte devido a uma lesão no joelho direito, após ter levado uma
pancada.
Tendo em conta que o seu contrato
previa prémios de jogo especiais quer jogasse ou ficasse no banco, o extremo
internacional português, então com 30 anos, teve uma ideia para continuar a
ir ao banco… mesmo estando lesionado: sugerir a contratação de Hugo Porfírio,
que vinha de uma grande época na União
de Leiria por empréstimo do Sporting,
e tornar-se tutor dele. “Está um puto em Portugal,
extremo esquerdo, que vai ser muito melhor do que eu. O meu substituto natural”,
disse Futre
ao treinador Harry
Redknapp. “Estás louco? Como vai ser melhor do que tu?”, questionou de
volta o técnico
inglês. “Daqui por uns dias vou a Portugal e trago-te vários jogos para
veres com os teus olhos”, respondeu a estrela
lusa. Só que Futre
não levou jogos completos a Redknapp.
Em vez disso, fez um compacto com o “best of” de Porfírio. “Porque nos
jogos podia ver-se algum defeito, mas no compacto era sempre tudo perfeito. Sem
falhas. E quem visse aquele vídeo não tinha dúvidas em afirmar que o Porfírio
iria ser melhor do que eu. Grandes pormenores, grandes fintas, grandes golos”,
explicou o montijense
no livro El Portugués.
O plano correu conforme o
esperado. No dia seguinte, Redknapp
chamou Futre
e aprovou Porfírio: “Paulo,
que jogador fantástico. Meu Deus. Quais são as condições dele?” “Dois dias depois, o Porfírio
estava comigo em Londres. A viver em minha casa. Mas preparei todo o esquema
antes dele chegar, e falei com o Redknapp
para poder ficar no banco e continuar a receber os prémios de jogo. ‘Atenção,
este miúdo é um grande jogador, mas tem um feitio complicado. Vou ter de estar
sempre em cima dele para o poder orientar da melhor forma. E temos de criar
aqui uma sintonia entre os dois. Tu és o treinador da equipa, mas tens de me
deixar ser o treinador do Porfírio. Só assim podemos tirar o máximo rendimento
dele.’ O Redknapp,
como eu esperava, concordou. A partir desse momento deixei de ser apenas
jogador. Era, acima de tudo, o treinador pessoal do Porfírio. Ele vivia comigo
e com o meu amigo César”, contou Futre
no livro.
Entre as regras que Futre
impunha ao compatriota era a hora de recolher obrigatório: “Às dez e meia da
noite era a hora do Porfírio ir para a cama. Muito contrariado e a pedir mais
um bocadinho, tal como as crianças. Mas não tinha hipótese. ‘Porfírio, está na
hora de recolher. Caminha’, dizia eu. ‘Paulo,
vá lá, mais uma horinha’, implorava ele. ‘Não pode ser. Vai lá para a caminha
que já te vou levar um copinho de leite’. Não estava a gozar. Passado um
bocado, eu e o César íamos ao quarto do Porfírio, dávamos-lhe o copo de leite,
ele bebia, apagávamos a luz e íamos embora.”
Também nos treinos a autoridade
de Futre
sobre Porfírio estava exposta. “Quando ele não passava a bola a ninguém, eu
mandava parar a sessão e discutia com ele à frente de toda a gente: ‘passa a
merda da bola.’”, recordou o antigo craque de Sporting,
FC
Porto, Benfica
e Atlético
Madrid.
“Nesses três meses que esteve
comigo, o Porfírio partiu tudo [quatro golos e várias assistências em 27 jogos
pelos hammers].
Foi o único período em que jogou futebol total. Tonou-se o ídolo dos adeptos do
West
Ham e parecia que ia disparar para uma grande carreira, mas nunca mais
voltou a atingir semelhante nível. Ainda coincidimos algumas vezes dentro de
campo e, num desses jogos, o meu joelho disse: ‘Chega, Paulinho.’”, lembrou Futre,
sobre a primeira vez em que anunciou o fim de carreira.
Sem comentários:
Enviar um comentário