Suk, aqui abraçado por André Horta, foi o homem do jogo |
O futebol é, provavelmente, o
desporto coletivo mais aleatório que existe. É aquele onde há menos golos/pontos
e, por isso, é aquele onde é mais provável que as performances das equipas não se traduzam no resultado final.
Aleatório acabou por ser, também,
o desfecho que aquele grande remate de Suk teve. Se o tentar mais 29 vezes, é
bastante provável que não faça 29 golos. Nem 20, nem 10 e se calhar nem cinco. Por
isso é que se diz que «tentou a sorte». Provavelmente, no jogo de sábado frente
ao Rio Ave vai tentar algo semelhante e a bola vai acabar na bancada.
Aquele lance teve ainda outros
pormenores curiosos. Bateu na trave e entrou. Se tivesse batido no ferro mas
dois ou três centímetros mais acima, provavelmente voltaria ao terreno de jogo
ou ia para fora do campo. Se tivesse corrido mal, também seria bastante
provável que o treinador reclamasse com o coreano por não ter passado a um
colega em melhor posição.
Mas a bola entrou mesmo e foi um
grande golo. Talvez até venha a ser o melhor de toda a época. E, num desporto tão
aleatório como é o futebol, deu vantagem a uma equipa, que assim pôde gerir esse
resultado. E a Académica, por sua vez, foi obrigada a fazer mais para não
acabar com zero pontos no final do dia. O efeito de um golo, seja mais ou menos
aleatório, é mesmo esse: mexe com o jogo e com a abordagem das equipas ao
mesmo.
Claro que não é apenas por aí que
se justifica um triunfo, sobretudo quando se trata de uma goleada. O Vitória,
apesar de ter tido no onze um sénior de primeiro ano (André Horta), um jogador
que tinha vindo da Liga2 (Fábio Pacheco) e outros dois oriundos do CNS
(Costinha e Ruca) foi, durante os 90 minutos, uma equipa mais madura do que a
Académica. Mais madura porque, com muito mérito para a leitura de Quim Machado,
esteve ciente das suas potencialidades, das suas limitações e das limitações do
adversário.
Um dos momentos da pressão alta do Vitória |
Defensivamente, pressionou em
terrenos muito adiantados – quanto maior a probabilidade de roubar o esférico,
mais intensa foi a pressão -, aproveitando as fragilidades técnicas dos defesas
coimbrenses para recuperar a bola perto da área contrária. E, quando a turma de
José Viterbo conseguia jogar no meio-campo sadino, vimos os setubalenses a
defender como um bloco, de uma forma muito compacta, com todos os jogadores a
darem uma ajudinha para tapar os caminhos para a baliza de Raeder. Quando existe
essa harmonia e solidariedade, está-se mais perto de alcançar um bom resultado.
No plano ofensivo, o Vitória foi
também uma equipa bastante consciente. No início do jogo, tentou ter a bola e
praticar um futebol apoiado desde o seu meio-campo defensivo, mas as limitações
técnicas de alguns jogadores resultaram em maus passes em zonas sensíveis do
campo. No entanto,
Lance do 0-4, com Suk a ganhar a primeira bola e servir Costinha |
Vitória na segunda parte |
Além da forma como organizou e
potenciou a equipa, Quim Machado deve ser também elogiado pela substituição que
efetuou ao intervalo. Com a entrada de Rúben Semedo, alterou o sistema tático
para 4x1x4x1, com o central/trinco cedido pelo Sporting à frente da defesa.
Paulo Tavares, que já estava amarelado, adiantou-se no terreno, para uma
posição onde teria menos necessidade de recorrer à falta (precavendo uma
eventual expulsão) e onde podia ajudar a manter a posse de bola no meio-campo
adversário. Na mesma linha do capitão, estiveram Costinha (à direita), André
Horta (também ao meio) e André Claro (à esquerda). Os Andrés, contudo, foram
fazendo algumas trocas posicionais, o que confundiu marcações na defesa academista.
Toda essa lucidez, aliada ao
desempenho dos atletas e à tal componente aleatória do primeiro golo, ganhou o
encontro. Por o adversário ser a Académica e o jogo ter sido em Coimbra é inevitável
dizer que o Vitória passou com nota alta neste exame.
Ficha de jogo
I Liga – 2.ª jornada
Estádio Cidade de Coimbra, em Coimbra
Académica (4x2x3x1): Pedro Trigueira (Lee, 25); Aderlan, João Real c, Fernando Alexandre e Emídio Rafael; Leandro Silva e
Obiora; Ivanildo, Rui Pedro (Rafael Lopes, 64) e Selim Bouadla (Hugo Seco, 59);
Gonçalo Paciência
Suplentes não utilizados: Nii
Plange, William Gustavo, Nuno Piloto e Rabiola
Sadinos repetiram onze da 1.ª jornada |
Treinador: José Viterbo
Disciplina: Cartão amarelo
a Obiora (33’ ),
Gonçalo Paciência (58’ )
e Hugo Seco (89’ )
Vitória (4x1x3x2): Raeder; William Alves, Frederico Venâncio, Fábio
Pacheco e Nuno Pinto; Paulo Tavares c; Costinha
(Arnold, 87), André Horta (Dani, 80) e Ruca (Rúben Semedo, int.); Suk e André
Claro
Suplentes não utilizados:
Miguel Lázaro (GR), François, Zequinha e Uli Dávila
Treinador: Quim Machado
Disciplina: Cartão amarelo
a Paulo Tavares (35’ ),
Fábio Pacheco (52’
e 78’ ) e
William Alves (61’ );
Cartão vermelho por acumulação a Fábio Pacheco (78’ )
Árbitro: Cosme Machado (AF Braga), assistido por Alfredo Braga e Pedro
Fernandes e com Duarte Oliveira como 4.º árbitro
Golos
0-1, por Suk (17’ ). Depois de um livre
favorável à Académica e de algumas tentativas de chuveirinho para a área do
Vitória, Nuno Pinto consegue aliviar a bola de cabeça e acaba por colocá-la em
Suk, que foi progredindo com o esférico desde o seu meio-campo defensivo, tirou
Leandro Silva do caminho e ainda de muito longe, rematou forte de pé direito para
o fundo das redes. A bola ainda bateu na trave antes de entrar.
0-2, por Suk (55’ ). André Claro pegou na bola
à entrada do meio-campo da Académica, descaído para o lado esquerdo, foi
fletindo para o centro e passou para Costinha, também no corredor central, mas
mais adiantado. Este último endossou-a a Suk, que com um drible tirou Fernando
Alexandre do caminho, já na área adversária, e na cara de Lee fez golo com o pé
esquerdo.
0-3, por André Claro (57’ ). William Alves combinou
com Suk na direita e apareceu no flanco direito, em boa posição, a cruzar
rasteiro para o coração da área, onde André Claro, mais rápido a chegar a bola
do que os defesas da Académica, aumentou a vantagem para os sadinos com um belo
remate.
0-4, por Costinha (81’ ). Pontapé de baliza de
Raeder marcado para o meio-campo adversário onde Suk ganhou a primeira bola no
ar a Leandro Silva e assim serviu Costinha (em posição irregular), que se
isolou e com um remate forte que ainda embateu no guarda-redes Lee fechou a
goleada.
Estatísticas (Académica-Vitória)
Posse de bola (%): 54-46
Ataques: 38-25
Remates: 16-15
Cantos: 6-2
Faltas cometidas: 17-17
Foras de jogo: 0-2
Apreciação individual
Raeder: Quando teve a bola
nos pés, não facilitou. Cerrou os dentes e pontapeou-a para o mais longe
possível. Os pontapés de baliza não foram exceção, tendo até iniciado por essa
via o lance do 0-4 (81’ ).
Embora tenha vindo do Bayern,
onde era suplente de Neuer, deixa muito a desejar como guarda-redes. Aos 48’ , ficou nas covas quando
Leandro Silva, na execução de um livre lateral, colocou o esférico na área de
baliza e, aos 75’ ,
saiu em falso a canto na esquerda. A grande defesa que efetuou aos 74’ , a remate forte de Gonçalo
Paciência, serviu para enganar quem não o conhece bem.
William Alves: Quim
Machado voltou a apostar nele para o lado da direita apesar de ser central e do
croata Gorupec já estar integrado na equipa há mais de uma semana. Os adeptos
desconfiaram, mas exibiu-se a bom nível, tanto defensivamente como
ofensivamente. Deu alguma profundidade ao corredor direito e até acabou por
fazer a assistência para o 0-3 (57’ ).
Frederico Venâncio: A sua
capacidade de passe foi uma ajuda para que o Vitória mantivesse a bola durante
algum tempo. Bem colocado, pouco ou nada há a apontar-lhe.
Fábio Pacheco podia ter evitado expulsão |
Amarelado aos 52’ , por falta a meio-campo
sobre Rui Pedro e expulso por acumulação aos 78’ , após infração sobre
Gonçalo Paciência. Com o placard a
assinalar 0-3 e com pouco mais de dez minutos por jogar, podia ter tomado outro
tipo de decisão.
Nuno Pinto: Mais
solicitado do que na partida com o Boavista, criou perigo com alguns
cruzamentos venenosos para a zona entre o guarda-redes e os defesas. Pela sua
capacidade de colocação do esférico foi, mais uma vez, o homem das bolas
paradas. Acabou por iniciar a jogada do primeiro golo com um alívio de cabeça (17’ ). A experiência que tem de
Liga é muito importante para a equipa.
Paulo Tavares: Bom de
bola, mesmo em situações de aperto evitou o pontapé para a frente e tentou que
a equipa saísse a jogar. É uma mais-valia ter um médio assim. Já amarelado,
adiantou-se alguns metros no segundo tempo, para uma posição onde teve menos
necessidade de recorrer à falta e onde podia ajudar a manter a posse no
meio-campo adversário. Tentou o golo com um remate à entrada área, quando já
estava 0-3, mas Lee negou-o (66’ ).
Costinha: Melhorou o seu
desempenho da primeira para a segunda parte, ganhando confiança com o decorrer
do encontro. Viu coroada a melhoria exibicional com o golo que fechou a goleada
(81’).
Defensivamente foi sempre competente,
ao ajudar a fechar o flanco direito e também a preencher zonas mais interiores.
Embora tivesse atuado nas alas, apareceu também por várias vezes na zona
central durante a manobra ofensiva, tendo até, a partir daí, feito a
assistência para o 0-2 (55’ ).
André Horta tem apenas 18 anos |
No segundo tempo, com a alteração
tática, manteve-se na zona central mas acabou por protagonizar algumas trocas
posicionais com André Claro, que estava na esquerda, confundindo as marcações
da defesa academista.
Tentou um momento de glória
quando, aos 74’ ,
mesmo com Costinha em boa posição, rematou para defesa fácil de Lee. Tal é
normal, para quem está a jogar com os mais velhos e quer criar impacto. Foi o
sacrificado quando o Vitória ficou reduzido a dez.
Ruca: Quase que
comprometia aos 6’, quando atrasou uma bola e acabou por isolar Rui Pedro. Para
alguém que atua a médio-ala/extremo, não entusiasmou no aspeto ofensivo,
mostrando pouca qualidade técnica e de passe. Decidiu poucas vezes bem quando
teve o esférico e foi substituído com naturalidade ao intervalo.
Suk: Foi o homem do jogo. Praticamente
construiu sozinho o lance do primeiro golo (17’ ), certamente candidato a um dos melhores da
temporada, e tirou muito bem Fernando Alexandre no caminho no lance do 0-2, que
o próprio apontou (55’ ).
Esteve também na jogada do 0-3, ao desmarcar William Alves no corredor direito
(57’ ). Mais
uma vez, foi a grande referência dos sadinos nas primeiras bolas, como se viu
no lance do 0-4 (82’ ),
e uma valiosa ajuda na área sadina nos cantos e livres da Académica.
André Claro: Incansável na
tal pressão na primeira fase de construção do adversário. Ajudou, nem que fosse
a atrapalhar os adversários, a recuperar a bola no meio-campo da Académica.
Foi deslocado para o lado
esquerdo no segundo tempo, mas sem deixar de aparecer na zona central e de
defender, mesmo já com uma vantagem confortável no marcador. Numa das incursões
que fez da esquerda para o meio que acabou por iniciar a jogada do 0-2 (55’ ).
Apontou o terceiro tento dos
sadinos com um belo remate (57’ ).
Viu-se, pelo golo frente ao Boavista e por um remate aos 46’ , que gosta de tentar a sorte
de meia distância.
Rúben Semedo: Reforçou o
miolo, acrescentando músculo e equilíbrio defensivo à zona intermédia. Sempre
que teve a bola, tentou deixá-la jogável num companheiro. Recuou para central
após a expulsão de Fábio Pacheco e não seria de estranhar que jogasse nessa
posição frente ao Rio Ave, no sábado.
Dani: Entrou após a
expulsão de Fábio Pacheco para ocupar o lugar à frente da defesa, uma vez que
Rúben Semedo recuou para central. Pouco a dizer.
Arnold: Reforço para a
nova época, teve direito a alguns minutos em campo. Algo importante
na sua integração na equipa.
Outras notas
O antigo guarda-redes da
Académica Ricardo, agora vinculado ao FC Porto, é apontado como reforço do
Vitória, onde deve chegar por empréstimo. Se Diego não é opção e tendo em conta
que Raeder tem bastantes fragilidades, creio que é uma boa notícia.
Por falar no Diego, sei por fonte
segura que o motivo da sua ausência não é falta de forma física – as aparências
iludem e retiro o que disse após o jogo com o Boavista - mas sim opção técnica.
O brasileiro até tem menos três quilos do que os tinha na primeira passagem
pelo Bonfim.
Ainda não chegou o certificado
internacional dos dois reforços líbios, Mohamed El Gadi e Hamdou Elhouni.
Miguel Lourenço era, há cerca de
dois, visto como uma grande promessa do futebol português e falava-se que era
pretendido por Istambul BB, Corunha e, salvo erro, Arsenal. Corrijam-me se
estiver enganado. No entanto, na partida de Coimbra nem sequer se sentou no
banco. O que se tem passado com ele?
Fábio Pacheco foi expulso por
acumulação de cartões amarelos e vai falhar a receção ao Rio Ave, no sábado.
Não me surpreenderia se perdesse o lugar em definitivo para Rúben Semedo (ou
François).
‘Opta Vitória’
O Vitória já não vencia em
Coimbra desde 28 de janeiro de 2007. Na altura, valeu um golo solitário de
Binho, aos 52 minutos.
Depois de apenas ter conquistado
apenas uma vitória fora na época passada, em Guimarães (1-0), à 25.ª jornada,
em 2015/16 os sadinos conseguiram um triunfo longe do Bonfim logo no primeiro
jogo como visitante.
A última vez que os setubalenses
obtiveram um triunfo tão volumoso para a Liga foi a 23 de fevereiro de 2014,
tendo goleado em casa o Paços de Ferreira também por 4-0. Se contemplarmos
apenas os jogos fora, então a última goleada pela mesma ou maior diferença de
golos remonta a 22 de setembro de 2002, quando os sadinos foram aos Barreiros
vencer o Marítimo por 5-0. Nessa época, contudo, os setubalenses desceram de
divisão e terminaram mesmo em último lugar. Por isso, há que rejeitar euforias.
A última vez que o Vitória
conseguiu quatro ou mais pontos à 2.ª jornada foi em 2011/12. Começou a vencer
o Paços de Ferreira no Bonfim (2-1) e depois foi empatar ao terreno da
Olhanense (2-2). Essa foi também a última vez que um jogador vitoriano - João
Silva, agora no Palermo - levava dois golos à 2.ª jornada. Nessa época o
emblema do Bomfim terminou em 11.º lugar.
O Vitória soma, ao final da 2.ª
jornada, seis golos e é, neste momento, o melhor ataque na Liga. Os sadinos não
marcavam tanto nas duas primeiras rondas desde 2004/05 (igualmente seis golos).
Dos seis golos que a equipa
marcou na Liga, Suk esteve diretamente envolvido em quatro: dois golos e duas
assistências. Decisivo.
Achei bastante interssante, o trabalho demonstra dedicação, acho que deve continuar, é sempre bom ter uma analise sobre o Vitória
ResponderEliminarObrigado amigo, volte mais vezes!
EliminarOlá David Pereira!
ResponderEliminarVejo que tem muito sucesso pelas várias matérias publicadas. Parabéns pelo trabalho de jornalista e pelo sucesso!
Sou brasileiro e publico em meu blog as notícias com melhores momentos e gols dos clubes brasileiros nas competições nacionais e internacionais, juntamente com crônicas e minhas opiniões sobre o futebol.
Caso goste e aceite parceria na lista de blogs, me avise!
Um abraço aqui do Brasil!
Luís Sérgio Carvalho
http://FuteAki.com.br