quarta-feira, 9 de outubro de 2024

O marcador improvável numa goleada do Benfica em Alvalade. Quem se lembra de Sousa?

José Sousa disputou 45 jogos pelo Benfica e 78 pelo Belenenses
José Sousa apenas marcou seis golos em quase uma década e meia de carreira, mas um deles ajudou a decidir um Sporting-Benfica. A 21 de fevereiro de 1998, desmarcou-se pelo corredor direito e aproveitou um grande passe a rasgar de Brian Deane para se isolar e bater Tiago. Na altura, fez o 2-0 numa goleada por 4-1 das águias em Alvalade. É, ainda hoje, considerado um dos marcadores mais improváveis na história dos dérbis.
 
Curiosamente, até é sobrinho de um antigo jogador do Sporting (e do FC Porto), o antigo médio internacional português António Sousa. Nasceu e cresceu em São João da Madeira e, tal como o tio e o primo Ricardo, começou a jogar futebol na Sanjoanense, embora o seu sonho fosse ser economista.
 
Aos 15 anos, depois de se ter sagrado melhor marcador do Torneio Lopes da Silva, e numa altura em que já jogava pelos juvenis, foi convidado para ir para o Benfica por Peres Bandeira, que o havia observado no torneio interassociações. E, apesar de reticências em se mudar para tão longe da casa dos pais e do interesse do FC Porto, acabou por aceitar.
 
Embora fosse asmático, fazia o corredor direito com grande pulmão. Nas camadas jovens ainda enquanto extremo, mas a partir do segundo ano de júnior como lateral direito, posição à qual foi adaptado por José Augusto. Foi a saída que encontrou quando estava na iminência de ser dispensado. “Tu como avançado, comigo, não tens hipóteses aqui no Benfica, é para dispensar. Se tu quiseres ser defesa direito, comigo, vais ser titular e mais, um dia ainda vais ser defesa direito titular do Benfica”, disse-lhe o magriço, contou Sousa numa entrevista à Tribuna Expresso.
 
Quando transitou para sénior, rumou ao Alverca, então clube satélite do Benfica, tendo realizado uma temporada muito positiva na II Liga em 1997-98. “Nem joguei como lateral direito, joguei como médio centro e acabou novamente por ser o professor Arnaldo Cunha e o João Santos, que me apanharam. Joguei praticamente a época inteira”, recordou.
 
Sousa nas seleções jovens
No início da temporada seguinte, permaneceu no emblema ribatejano, mas a 31 de agosto de 1997 disputou o jogo que lhe mudou o rumo da carreira. “Iniciei da mesma forma, a correr bem, com assistências, com o Mário Wilson, Veloso, uma equipa técnica diferente. O Manuel José [então treinador da equipa principal do Benfica] estava na bancada no dia em que estamos a jogar contra o Paços de Ferreira e faço golo. Chamou-me na semana seguinte para ir treinar com a equipa principal do Benfica. No encontro contra a Arábia Saudita, um jogo-treino a meio da semana, ele chama-me e diz que vou jogar a defesa direito”, contou.
 
O jogo particular diante da Arábia Saudita serviu para Manuel José confirmar o que tinha visto no Ribatejo. “O jogo começa e eu já não jogava há algum tempo a defesa direito. O Manuel José diz-me: ‘Vais jogar nesta posição, não te preocupes, é só para atacares, defenderes, trabalha, dá tudo e não te preocupes com nada’. Eu assim fiz. Começou o jogo, ao início as coisas não me estavam a correr bem porque estava nervoso, falhei um passe, dois, estava muito nervoso, sofremos um golo e ainda por cima foi do meu lado e pensei: ‘Isto está mesmo a correr mal, isto vai correr mal’. Só que sempre tive ao longo da minha vida uma característica, que é uma certa resiliência e perante a dificuldade cresço nas situações. Depois de pensar que aquilo estava a correr mal, quase a seguir, faço o cruzamento para o Martin Pringle fazer o golo de cabeça. Fica 1-1 e passado um pouco, há um livre à entrada da área. Eu no Alverca batia os livres e cantos, batia as bolas paradas todas. Aquele livre, era à entrada da área sobre o lado esquerdo, o pé direito seria o ideal para bater. Claro que quem estava lá para bater, era só o João Pinto, nada mais do que João Pinto. E eu cheguei lá e pedi-lhe: ‘Posso bater?’ (…) O João Pinto com a bola na mão, olhou para mim, desatou-se a rir e disse-me: ‘Toma lá miúdo, bate lá esse livre’. Peguei na bola, coloquei a bola no chão, bati o livre e... um golo fantástico. Claro, levei logo calduços de todos os lados, eles gozarem-me pela ousadia de miúdo de pedir ao João Pinto para bater aquele livre. No dia a seguir, já era o lateral das Arábias, patati, aquelas coisas. Digamos que foi um momento de viragem na minha carreira”, revelou.
 
Entretanto, começou a jogar como titular na equipa principal do Benfica, tendo começado os 30 jogos que disputou de águia ao peito durante essa temporada de 1997-98. A estreia foi com a Académica, a 13 de setembro de 1997, mas o jogo mais marcante foi a 21 de fevereiro do ano seguinte, quando faturou na goleada sobre o Sporting em Alvalade (4-1). Na altura, era chamado regularmente às seleções nacionais jovens (sub-20 ou sub-21) e ganhava apenas 150 contos por mês (750 euros). O treinador dos encarnados já era Graeme Souness.
 
 
Apesar de ter mantido a titularidade às ordens do técnico escocês, em 1998-99 sofreu uma fratura no quinto metatarso e esteve quase quatro meses sem jogar: “Acabou por marcar negativamente o ano para mim.”
 
Embora não há muito tempo fosse um habitual titular, rescindiu contrato no verão de 1999 após uma desavença com Vale e Azevedo e resolveu voltar a Alverca: “Ele queria que eu fosse para Guimarães, para ser uma moeda de troca no negócio com o Nandinho, com o Pedro Espinha e eu acabei por dizer que não, porque não era vantajoso para mim o negócio. O Vale e Azevedo disse-me imediatamente: ‘Não tens mais possibilidade de estar cá na próxima temporada’; ‘OK, você é que sabe’. Exaltámo-nos um pouco, na altura o meu empresário era o Jorge Mendes, o doutor Pimenta Machado, que também estava presente na reunião acalmou um pouco as coisas, mas acabou por ser uma época que não correu da melhor forma e, claro, mal acabou a temporada rescindi contrato com o Benfica, porque ele disse que eu poderia ser emprestado e como só me faltava um ano de contrato, eu disse-lhe: ‘Então prefiro rescindir e tenho toda a liberdade’. Rescindo e vou à minha vida. ‘Não quero dinheiro nenhum, não quero nada’. E fui para o Alverca uma temporada.”
 
No Ribatejo voltou a jogar com regularidade em 1999-00, às ordens de José Romão, tendo no final dessa época assinado pelo FC Porto, que por sua vez o emprestou imediatamente ao Sp. Braga. Depois de uma luxação clavicular que o levou à mesa de operações e a dois meses de paragem, fez uma grande segunda volta no emblema bracarense em 2000-01, com Manuel Cajuda como treinador.
 
 
Na temporada seguinte, fez a pré-época no FC Porto às ordens de Octávio Machado, mas as lesões voltaram a bater-lhe à porta: “No terceiro dia de treinos rebentei o meu joelho todo. Estive dois meses e meio parado, e claro, acabei por não ser inscrito na Liga, não fui inscrito na Liga dos Campeões, fiquei para segundo plano.”
 
Quando voltou da lesão sofreu outra, no outro joelho, e chegou lesionado ao Farense, clube ao qual foi cedido no primeiro semestre de 2002. Jogou pouco e não conseguiu impedir a despromoção à II Liga.
 
Em 2002-03 foi emprestado pelos dragões ao Belenenses, clube ao qual haveria de ficar vinculado, a título definitivo, até 2007. Nem sempre um habitual titular, somou 78 jogos e três golos pelo emblema da Cruz de Cristo, dando um pequeno contributo para o apuramento europeu alcançado em 2007, às ordens de Jorge Jesus, com quem se incompatibilizou: “Tive um problema com ele que não vou revelar, para não ser deselegante, mas a partir percebi que nunca mais iria jogar com Jorge Jesus. (…) Para mim é dos melhores treinadores que tive, e digo-o sempre à boca cheia. Foi dos melhores treinadores que tive na carreira, não misturo aquilo que ele foi para mim do ponto de vista pessoal com aquilo que foi como treinador. Assumo que é o melhor treinador que tive, mas depois tem o outro lado que é insuportável, que não dá para mim.”
 
 
Antes, havia tido como treinador no Restelo figuras como Marinho Peres, Manuel José, Augusto Inácio e Carlos Carvalhal. “Tive muitas lesões. Na segunda época tive um problema no menisco e estive dois meses parado. Na época seguinte um problema no cruzado anterior, seis meses parado”, recordou, em jeito de balanço.
 
 
Nos últimos de carreira vestiu as camisolas dos cipriotas do Olympiakos Nicósia ao lado do primo Ricardo Sousa, do Beira-Mar às ordens do tio António Sousa e do emergente Arouca, último clube que representou, em 2009-10, despedindo-se da carreira de futebolista com a subida à II Liga.
 
Entretanto tornou-se comentador da Sport TV e treinador, estando atualmente a comandar o Belenenses na Liga 3. 



 
 
 




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