terça-feira, 25 de agosto de 2020

Belgas no Benfica. Os que deixaram saudades não foram campeões

Uma mão cheia de belgas jogou pelo Benfica antes de Vertonghen
É curta, relativamente recente e até um pouco irónica a história das passagens de futebolistas belgas pelo Benfica. Isto porque iniciou a meio da década de 1990, resume-se a uma mão cheia de jogadores até à chegada de Jan Vertonghen e tem a particularidade de não ter coroado como campeões nacionais os dois atletas que mais saudades deixaram aos benfiquistas.


Tudo começou no verão de 1994. O Benfica era campeão, procurava um guarda-redes que garantisse mais segurança do que o habitual titular na altura, o internacional português Neno.
Preud'homme
Depois de ter sido eleito o melhor guarda-redes do Mundial dos Estados Unidos, Michel Preud’homme decidiu romper com um passado de quase 20 épocas no futebol belga, entre Standard Liège e Malines, e emigrar pela primeira vez na carreira. O Estádio da Luz foi o destino escolhido do veterano guardião, então com 35 anos, que haveria de disputar 199 jogos de águia ao peito.
Com uma Taça das Taças e uma Supertaça Europeia no palmarés, comprometeu-se com as águias ainda antes do Campeonato do Mundo. E apesar da distinção que recebeu no torneio, os mais desconfiados continuavam a falar da idade. “Nem essa eleição chegou. Os jornalistas e os adeptos olharam para a minha idade e não quiseram saber de mais nada. Todos diziam: o gajo era bom, mas está velho. Só vinha para o Benfica preparar a reforma. Acho que em cinco temporadas provei precisamente o oposto. Deixei de jogar aos 40 e por mim continuava mais uns anitos”, contou, anos mais tarde, em entrevista ao Maisfutebol.
Ainda assim, a prioridade do belga não era o Benfica. “O que eu mais queria era Itália, porque sabia que lá era muito apreciado, tinha AC Milan, Torino e Brescia a seguirem-me. Era o campeonato mais bonito do mundo na altura e era perfeito para um guarda-redes com a minha idade. Havia outros clubes interessados, como o FC Porto, o Nottingham Forest e o Bordéus. Mas o problema era sempre o mesmo: o número de estrangeiros. Foi então que surgiu o Benfica, com Artur Jorge como novo treinador, que disse: 'Os outros treinadores preferem contratar avançados, eu, primeiro, quero ter um bom guarda-redes'”, revelou.
Embora se tenha tornado um ídolo para os adeptos, Preud’homme não conseguiu sagrar-se campeão nacional de águia ao peito, tendo apenas vencido uma Taça de Portugal, em 1996.
Após levantar o troféu, o guardião recebeu um convite aliciante do Real Madrid, mas o Benfica não o deixou aceitar. “Aos 37, é fabuloso! Tinha mais um ano de contrato com o Benfica, o Real tinha apalavrado dar-me três. Só que o Benfica me disse: 'Nesta situação, se não conseguirmos trazer um grande nome, os sócios matam-nos'. Andaram a tentar o Chilavert, se ele viesse, eu ia para o Real, mas isso não aconteceu e acabaram por contratar o Bodo Illgner”, contou, numa entrevista de carreira ao Yahoo.
Preud’homme acabou por ficar na Luz e não se arrependeu. “A ligação foi-se desenvolvendo e tornou-se muito grande. Após três anos e meio, findo os quais se colocou a possibilidade de sair, eu optei por ficar. Tomei, aliás, a decisão de viver aqui, no vosso país. O Benfica é, sem dúvida, o maior dos três clubes que representei. Tem uma dimensão impressionante e mexe com as pessoas de uma forma que não acontece na Bélgica. Merecerá sempre a minha preferência”, frisou.
Em 1999, quando já tinha 40 anos, pendurou as luvas após a época menos regular que viveu de águia ao peito, tendo visto Ovchinnikov ameaçar-lhe a titularidade. Com direito a jogo de despedida, foi ovacionado no momento aquando da substituição e durante a volta olímpica que ao relvado pelos 80 mil adeptos que encheram o Estádio da Luz.
Ainda assim, continuou no clube por mais ano e meio como dirigente, acabando mesmo por ser um dos responsáveis pela contratação de José Mourinho. Porém, saiu pouco depois, quando Manuel Vilarinho sucedeu a Vale e Azevedo como presidente.



Axel Witsel
Talvez por o legado de Preud’homme ter sido tão pesado, foi necessário esperar 12 anos para ver novamente um belga com a camisola dos encarnados. Desta feita, o médio Axel Witsel, contratado ao Standard Liège por 9 milhões de euros no verão de 2011.
“As primeiras duas ou três semanas foram um pouco estranhas. Se toquei duas vezes de seguida na bola já era muito... A intensidade era muito maior. Antes de receber a bola já tinha de saber onde jogar. Inicialmente tive de me adaptar a esse nível, mas depois de três semanas já estava adaptado. Não tive dúvidas, mas tinha saudades de casa. Não me sentia bem, porque tinha a noção de que não estava a treinar bem o suficiente. Sou alguém que precisa de ter a bola e atuar como número 10. Lembro-me de ter dito ao meu pai 'não percebo. Mal consigo ter a bola e farto-me de correr. Isto não é futebol'. Ele acalmou-me e disse-me 'tem calma que a tua hora chegará. São apenas três semanas e não tarda estarás adaptado'. E tinha razão”, contou à plataforma DAZN em agosto de 2019.
Titular indiscutível no onze de Jorge Jesus praticamente desde que chegou à Luz, fez uma grande temporada em 2011-12, tendo disputado 49 jogos e apontado cinco golos, entre os quais dois ao FC Twente numa vitória que apurou o Benfica para a fase de grupos da Liga dos Campeões. Nessa temporada não foi campeão, mas venceu a Taça da Liga e ajudou as águias a atingirem os quartos de final da Champions.
A época seguinte também foi iniciada no Benfica, mas após três jogos transferiu-se no início de setembro para os russos do Zenit por 40 milhões de euros – na altura um encaixe recorde para os encarnados –, apesar do interesse do Real Madrid de José Mourinho.
“Queria levar o meu jogo para um nível superior, o Benfica fez uma oferta e foi o melhor destino para mim. Fui muito bem-recebido por todos – equipas, funcionários, adeptos… Gostei mesmo da minha passagem por Portugal. Tenho progredido muito e é graças ao Benfica que o nome Witsel é conhecido na Europa”, disse em declarações ao site da UEFA, em novembro de 2016.



Menos boas memórias, mais medalhas…

Carcela
Em 2015, chegou ao Benfica um belga… internacional marroquino, Mehdi Carcela-González, mais conhecido por Carcela. Nascido em Liège, jogou pelas seleções jovens da Bélgica e até chegou a disputar dois jogos particulares pela seleção principal, mas em dezembro de 2010 mudou de ideia e decidiu representar Marrocos, país da mãe – o pai é espanhol. Mas não deixa de ser belga…
Burocracias à parte, o extremo foi contratado ao Standard Liège por 2,5 milhões de euros, mas nunca se afirmou de águia ao peito, tendo disputado 29 jogos (11 a titular) e apontado três golos em 2015-16, temporada em que conquistou o título nacional e a Taça da Liga, tendo ainda dado um pequeno contributo para a caminhada até aos quartos de final da Liga dos Campeões.
Embora pouco utilizado, valorizou-se, tendo sido vendido ao Granada por quatro milhões de euros no verão de 2016. “Eu podia jogar [no Benfica]. Quando joguei no Benfica, fiz parte da equipa que foi campeã. Foi uma grande experiência. Adorei jogar no Benfica”, afirmou aos jornalistas portugueses em novembro de 2019, após ter defrontado o Vitória de Guimarães para a Liga Europa, ao serviço do Standard Liège.



Alexis Scholl
Também em 2015, chegou ao Benfica outro belga, mas que não passou da equipa B: Alexis Scholl.
Lateral esquerdo formado no Anderlecht e com carimbo das seleções jovens da Bélgica, não foi além de três jogos pelos bês encarnados em 2015-16, todos como suplente utilizado. Ainda nessa época esteve cedido ao Gent, mas não chegou a atuar.
“Aprendi mais no Benfica do que em todos os anos na Bélgica. O Benfica oferece uma verdadeira formação, algo que encontras pouco na Bélgica”, afirmou, aquando do empréstimo.
Na temporada seguinte voltou à Luz, mas sem somar qualquer minuto, e depois desapareceu do mapa.


Mile Silvar
Quem não chegou a cruzar-se com Scholl nos corredores do centro de estágios do Seixal foi o guarda-redes Mile Svilar, filho do antigo guardião internacional jugoslavo Ratko Svilar, que fez grande parte da carreira na Bélgica e esteve nas fases finais do Euro 1976 e do Mundial 1982.
Mile assinou pelo Benfica assim que completou 18 anos, em agosto de 2017, cumprindo as regras da FIFA, e aproveitou uma fase menos boa de Bruno Varela para assumir temporariamente a titularidade e bater recordes de precocidade: guarda-redes mais jovem de sempre a jogar pelo Benfica (frente ao Olhanense, aos 18 anos e 48 dias) e a atuar na Liga dos Campeões (diante do Manchester United, aos 18 anos e 52 dias).
No duelo com os red devils teve culpas no golo que ditou a derrota das águias no Estádio da Luz, ao entrar na baliza com a bola nas mãos, mas mereceu os elogios de José Mourinho, que na altura treinava a formação de Old Trafford.
“Só um grande guarda-redes é que sofre este golo. Porque aqueles que não sofrem este golo, não saem da baliza. Eu costumo dizer que não gosto daqueles que não o fazem. É que a esses eu costumo dizer que se arriscam a que a trave lhes parta a cabeça. E, a este, a trave não lhe parte a cabeça de certeza. Porque o miúdo arrisca, arrisca posicionalmente e tem uma leitura de jogo fantástica. Cometeu um erro de julgamento no lance do golo — algo que acontece a todos. Mas este miúdo é fera, vai ser um grande guarda-redes”, afirmou o treinador português.
Entretanto voltou a perder a titularidade para Bruno Varela e desde o início da temporada 2018-19 que tem vivido na sombra de Vlachodimos, tendo atuado sobretudo nos bês encarnados.
Ainda assim soma já 21 jogos e outros tantos golos sofridos pela equipa principal, tem contrato até junho de 2022 e já é internacional sub-21 pela Bélgica, aos 21 anos. Porém, ainda não colocou definitivamente de parte a possibilidade de representar a Sérvia.























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