sexta-feira, 26 de julho de 2024

O brasileiro que passou discreto pelo Barreirense mas jogou em dois Mundiais. Quem se lembra de Nelinho?

Nelinho vestiu a camisola do Barreirense em 1970-71
Filho e neto de portugueses naturais de Ovar, nasceu no Rio de Janeiro, para onde os pais tinham emigrado, Nelinho tem uma história de carreira incrível: passou discreto pelo Barreirense quando tinha 20 anos, voltou ao seu país e foi a tempo de chegar à seleção brasileira e inclusivamente jogar em dois Mundiais, os de 1974 e 1978.
 
O então jovem lateral direito estava ainda a dar os primeiros passos no futebol profissional ao serviço do América do Rio de Janeiro, às ordens de Otto Glória, quando surgiu a hipótese de reforçar o emblema do Barreiro.  “Ora, em 1970, o Barreirense falou com ele e pediu-lhe que ele sugerisse um nome para assumir o clube. O senhor Otto então apontou o seu adjunto, um tal Edsel Fernandes. O Barreirense aceitou esse nome e o Edsel Fernandes acabou por ir treinar para o Barreiro. Como bónus, levou-me com ele”, recordou ao Observador em dezembro de 2016.
 
O próprio Nelinho admite que a aventura no futebol português correu “mais ou menos”. “Joguei num outro campeonato, bem diferente do estadual, porque em 1970 ainda não havia o Brasileirão como vocês o conhecem agora. Esse só foi criado em 1971. Aí em Portugal joguei seis vezes no campeonato e mais duas na Taça UEFA”, prosseguiu o carioca, que esteve no duplo confronto com o Dínamo Zagreb em setembro de 1970. “Foi a única vez que o Barreirense jogou na Europa e eu estava lá. Foi outro motivo de orgulho na minha ainda curta carreira. Ganhámos 2-0 ao Dínamo Zagreb em casa, mas depois não tivemos qualquer hipótese na Jugoslávia (1-6)”, lembrou.
 
 
No campeonato, porém, as coisas não estavam a correr bem. “Nem me fala. Só conseguimos ganhar à 14.ª jornada, a última da primeira volta [ao Sporting, em Alvalade]! Também não fomos assim tão mal, porque havíamos empatado seis vezes [um delas frente ao FC Porto, nas Antas] e perdido sete”, recordou o internacional canarinho, que deixou de ser opção aquando da saída de Edsel Fernandes, substituído por Artur Quaresma após uma derrota caseira diante do Benfica a 8 de novembro de 1970.
 
“Lesionei-me na virilha em outubro/novembro e aquilo nunca mais sarou. Sentia dores incríveis. O tempo passava, passava, passava e eu nada de treinar, nem de jogar. Que dores! Os diretores não acreditavam em mim, julgavam que eu estava a fazer fita e que me queria ir embora. Lembro-me perfeitamente que só o massagista é que acreditava em mim e dizia-me sempre para confiar em mim, que eu ia superar aquele momento”, contou Nelinho, que nessa temporada foi companheiro de equipa de Bento: “Foi o meu primeiro guarda-redes como profissional. Em 1970-71, ele já era famoso porque tinha uma agilidade inacreditável e marcara um golo no campeonato [à Académica], de baliza a baliza.”
 
O lateral direito também se lembra de “Mira, um jogador técnico-cerebral, os goleadores Serafim e Câmpora, o capitão João Almeida, e um cara com um nome bacano, Murraças”.
 
Em fevereiro de 1971 voltou ao Brasil, mas o Barreirense ainda ficou com o seu passe. “Jovem e inconsciente como era, nem liguei. Só quando cheguei ao Brasil é que percebi que não podia jogar por mais nenhum clube. Estava agarrado ao Barreirense. A minha sorte foi o Barreirense ter acabado mal o campeonato, acho que foi antepenúltimo. O problema foi que um dos clubes atrás do Barreirense meteu um recurso para evitar de descer de divisão, alegando que eu estava mal inscrito, porque a minha ficha no Barreirense dava-me como luso-brasileiro. Acontece que eu sou luso-brasileiro. Por isso, quando esse clube meteu recurso, o Barreirense veio falar comigo para eu assinar um papel em como era luso-brasileiro. Acontece que só tinha 20 anos e ainda não era maior. O meu pai é que tinha de mexer com essa papelada e assinar por mim. Eu então propus um negócio ao Barreirense: eles davam-me o passe e eu entregava-lhes a carta assinada pelo meu pai a respeito da minha dupla nacionalidade. Assim foi. Fiquei livre para jogar onde quisesse e o Barreirense livrou-se da descida”, recordou.
 
Finalmente livre, ainda passou três meses nos venezuelanos do Anzoátegui, mas depois regressou ao Brasil para representar Bonsucesso e Remo antes de ingressar no Cruzeiro em 1973. Ao serviço do emblema mineiro viveu os melhores anos da carreira: conquistou a Libertadores em 1976, o Campeonato Mineiro em 1973, 1974, 1975 e 1977 e tornou-se internacional brasileiro (21 jogos/seis golos).
 
 
Se no Mundial 1974 foi maioritariamente suplente de Zé Maria, em 1978 teve mais protagonismo, tendo inclusivamente marcado um golo de belo efeito ao mítico guarda-redes italiano Dino Zoff no jogo que valeu a atribuição do 3.º lugar ao Brasil.
 
 
Os golos de livre e os remates fortes de fora da área tornaram-se imagens de marca de Nelinho, mas a falta de estatuto impediu que conseguisse mostrar essas qualidades no Barreirense: “Era jovem, 20, 21 anos. Os mais velhos não me deixavam. O Mira queria marcar sempre tudo.” 




 
  




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