sábado, 19 de junho de 2021

De Estrasburgo a Salvador. Os jogos oficiais entre Portugal e Alemanha

Portugal e Alemanha defrontaram-se no Euro 1984
De Estrasburgo a Salvador da Bahia, mas sem esquecer um fantástico remate e uma noite de despedidas em Estugarda, uma expulsão inexplicável em Berlim, um hat trick improvável em Roterdão e jogos de má memória para a equipa das quinas em Basileia ou Lviv. Portugal e Alemanha defrontaram-se oficialmente em dez ocasiões, com um histórico bastante mais favorável para os germânicos, que ainda assim já sofreram alguns dissabores às mãos dos lusos.
 
Além dos 10 compromissos oficiais, as duas seleções mediram forças por mais oito ocasiões em encontros de caráter particular, com vitórias alemãs em 1936, 1954, 1960, 1982 e 1996, um triunfo português em 1983 e empates em 1938 e 1990.
 
Vale por isso a pena recordar os dez jogos a valer entre Portugal e Alemanha.
 
 
14 de junho de 1984 – Euro 1984 (1.ª jornada da fase de grupos)
Alemanha Ocidental 0-0 Portugal
Jogo histórico para Portugal, que se estreava em Campeonatos da Europa e logo frente à campeã europeia, que tinha à disposição craques do futebol mundial como Harald Schumacher, Andreas Brehme, Rudi Völler ou Karl-Heinz Rummenigge.
O empate a zero em Estrasburgo foi considerado um resultado positivo para Portugal, que teria ainda de defrontar a vizinha Espanha e a Roménia. “Ficou 0-0 e jogámos taco a taco, mas quando estávamos a entrar em campo eles olharam-nos de alto a baixo, olhando para os portugueses pequeninos. A verdade é que o jogo começou e começámos a fazer coisas bonitas. Jogámos mesmo muito bem com os alemães, que eram uns matraquilhos humanos, umas torres impressionantes! Tinham muita força, mas conseguimos contrariá-los”, recordou Fernando Chalana ao portal Relvado.
 
 
 
24 de fevereiro de 1985 – Fase de qualificação para o Mundial 1986
Portugal 1-2 Alemanha Ocidental
Depois de ter estado a um passo da final do Euro 1984, o objetivo de Portugal passava por alcançar pela primeira vez o apuramento para uma fase final consecutiva, ou seja, marcar presença do Campeonato do Mundo de 1986, no México.
No entanto, desta feita a Alemanha confirmou o favoritismo e venceu no Jamor por 2-1. Pierre Littbarski (28 minutos) e Rudi Völler (37’) marcaram os golos germânicos ainda na primeira parte. No segundo tempo, Diamantino Miranda saltou do banco para reduzir a desvantagem (57’).
 
 
 
16 de outubro de 1985 – Fase de qualificação para o Mundial 1986
Alemanha Ocidental 0-1 Portugal
Um daqueles jogos mágicos da seleção portuguesa. À entrada para este encontro em Estugarda, a Alemanha estava com um pé e meio no Campeonato do Mundo, ao passo que Portugal estava a obrigar a vencer e ainda tinha de esperar que a Suécia perdesse na Checoslováquia para sonhar na qualificação como melhor segundo classificado dos vários grupos da zona europeia.
“Lembro-me que o [selecionador] Torres falou sempre no sonho de ganhar à Alemanha e sermos apurados para o Campeonato do Mundo, mas a situação era muito difícil e quase ninguém acreditava. Nós acreditávamos um pouquinho, não muito. Mais uma vez andávamos com a esferográfica e com o papel a fazer contas”, recordou Jaime Pacheco ao Maisfutebol.
Pouco antes do apito inicial, uma boa notícia chegou ao Neckarstadion: a Suécia tinha mesmo perdido, o que, além de colocar Portugal a depender apenas de si, deixava a Alemanha automaticamente apurada para o Mundial 1986. “O jogo da Checoslováquia com a Suécia foi antes do nosso e soubemos o resultado no balneário ainda antes do jogo. Isso foi uma injeção de moral, uma motivação maior. Todos rejubilámos ao saber que dependíamos só de nós”, acrescentou o antigo médio.
A missão continuava a ser bastante complicada, mas Carlos Manuel decidiu resolver o assunto à… bomba. Através de um remate a 30 metros de distância, aos 54 minutos, a locomotiva do Barreiro acertou no ângulo superior e deixou Schumacher, a pensar que a bola passaria ao lado, pregado ao relvado. “Sim, foi mesmo um milagre. Nem a vi a bola. Foi um remate feliz. Sinceramente, não estava à espera daquele pontapé”, contou ao Maisfutebol. “A RFA nunca tinha perdido em casa nas fases de qualificação. Fiquei danado. Para mim, Portugal fez o impossível. Ainda faltavam 30 minutos e fomos incapazes de marcar um golo. Nessa noite Portugal teve toda a sorte do mundo: o Bento fez uma exibição perfeita e os postes ajudaram pelo menos três vezes. Foi difícil aceitar essa derrota, honestamente”, aditou o histórico guardião germânico.
“Ele fazia aquilo muitas vezes, claro que nem sempre com a felicidade de fazer golos. Chutava muito bem e tinha aquele egoísmo, entre aspas, que é necessário nestas situações. Era um daqueles jogadores que têm qualidade para fazerem grandes golos do nada. Eu estava perto, fiz o passe e fui o primeiro a abraçá-lo depois. Quando o vi a rematar e a bola a levar aquela trajetória, cada centímetro, cada metro mais que a bola voava, mais eu acreditava que ia ser golo. Além de ter sido um golo excecional, foi num momento em que se fez história. Foi uma coisa soberba e só ao nível de um grande jogador como o Carlos Manuel. Ele foi, na década de 80, um dos melhores jogadores do Benfica na sua posição, quiçá até de toda a história”, lembrou Jaime Pacheco.
“Já tínhamos feito história em 1984 por sermos os primeiros portugueses a participarem num Europeu. Depois a mesma geração de jogadores acaba por conseguir outra proeza, fomos a segunda equipa a conseguir a presença num Campeonato do Mundo, depois da célebre seleção de 1966, com o Eusébio. A festa no balneário foi enorme porque as adversidades eram muitas. O tempo passa e não nos esquecemos, ainda valorizamos mais esse feito”, rematou o antigo centrocampista.
 
 
 

14 de dezembro de 1996 – Fase de qualificação para o Mundial 1998
Portugal 0-0 Alemanha
Depois de ter marcado presença no Euro 1996, torneio em que caiu nos quartos de final às mãos da República Checa, Portugal alimentava a esperança de participar numa segunda fase final consecutiva, neste caso a do Mundial 1998. À disposição de Artur Jorge estavam alguns jogadores da famosa geração de ouro, como Vítor Baía, Fernando Couto, Paulo Sousa, Luís Figo, João Vieira Pinto e Rui Costa, mas pela frente estava uma Alemanha que era campeã europeia.
Num jogo equilibrado no velhinho Estádio da Luz, ambas as seleções criaram várias ocasiões de golos, mas nenhuma conseguiu marcar.
 
 
 
6 de setembro de 1997 – Fase de qualificação para o Mundial 1998
Alemanha 1-1 Portugal
À entrada para esta partida em Berlim, estava tudo embrulhado nos primeiros lugares do grupo de qualificação. A Ucrânia liderava o grupo com 17 pontos, mas só lhe faltava disputar um jogo. Portugal e Alemanha somavam 15 pontos, mas tinham dois e três encontros ainda para jogar. Ou seja, uma vitória colocava a seleção portuguesa com um pé, no mínimo, no segundo lugar que dava acesso ao playoff.
Após 70 minutos sem golos, Pedro Barbosa fez de Carlos Manuel e deu vantagem à equipa das quinas.
O pior veio depois: a seguir ao golo Artur Jorge decidiu substituir Rui Costa por Sérgio Conceição, mas quando o médio estava prestes a chegar à linha lateral foi expulso por acumulação de amarelos pelo árbitro francês Marco Batta, alegadamente por ter retardado a substituição. A jogar com menos um homem, a equipa das quinas permitiu que a Alemanha marcasse o golo do empate, da autoria do recém-entrado Ulf Kirsten (80’).
Portugal acabou por falhar tanto o apuramento direto como o playoff e a geração de ouro viu ser-lhe adiado o sonho de disputar um Campeonato do Mundo.
“Recentemente, num jogo no Estádio da Luz para a Liga dos Campeões, ele [Marco Batta] estava como observador do árbitro e pediu para falar comigo, para dizer que tinha errado, que não estava contente com o que se tinha passado. Eu mandei dizer o que sempre disse e o que sempre direi: ‘Desculpo-o quando ele pedir desculpa ao meu País’. Porque o que ele fez foi prejudicar o meu País. Os próprios jornais franceses escreveram no dia seguinte em primeira página: ‘Batta tira Portugal do Mundial’. E a verdade é que desde 1996 até hoje só falhámos uma fase final de uma grande competição. Foi aquela”, contou Rui Costa ao jornal A Bola, 20 anos depois da noite de Berlim. “Não consegui, à data ou ainda hoje, encontrar uma explicação. Foi uma coisa inédita e única na alta-roda do futebol. Não há qualquer lei que determine quanto tempo deve passar para um jogador que vá ser substituído sair de campo. Demorei no máximo 25 segundos a chegar à linha lateral”, acrescentou o antigo maestro do meio-campo luso.
“Se toda a gente se lembra desse jogo, claro que eu também me lembro muito bem. Sei que os portugueses ficaram muito desapontados, mas nós árbitros já sabemos que, por vezes temos de tomar decisões importantes. Não sei se foi difícil, porque ainda hoje acho que tomei a decisão certa. Os árbitros têm de respeitar a lei e nós, quando tomamos decisões, estamos convencidos que são corretas. Foi uma das decisões mais importantes da minha carreira, mas não das mais difíceis”, recordou Marco Batta em 2012.
 
 
 
 
20 de junho de 2000 – Euro 2000 (3.ª jornada da fase de grupos)
“O Estádio de Kuip, em Roterdão, foi palco de um momento histórico do futebol europeu. A vitória de Portugal (3-0), sobre a Alemanha, confirma tudo o que de positivo se escreveu sobre o futebol-champanhe da seleção nacional após o jogo com a Inglaterra e, ao mesmo tempo, marca um estrondoso fim de ciclo.  Aquele em que a Alemanha, por direito próprio, era candidato à vitória em qualquer competição onde entrasse. O 150.º jogo de Lothar Matthäus pela sua seleção será também, com toda a probabilidade, o último. E a forma como a sua seleção foi humilhada (Ribbeck dixit) pelo carrossel de passes português mostra bem a dimensão da crise de um gigante que adormeceu durante demasiado tempo”, escreveu o Maisfutebol.
 
 
 
8 de julho de 2006 – Mundial 2006 (jogo de atribuição do 3.º e 4.º lugar)
Alemanha 3-1 Portugal
Depois de uma brilhante campanha no Campeonato do Mundo, Portugal foi derrotado pela França nas meias-finais. No entanto, ainda lhe restava a possibilidade de igualar a melhor classificação de sempre em Mundiais, o 3.º lugar que tinha sido alcançado em 1966.
No entanto, o selecionador Luiz Felipe Scolari viu o jogo de atribuição do 3.º e 4.º lugar como um mero jogo de consolação, decidindo dar oportunidades a jogadores menos utilizados como Paulo Ferreira, Ricardo Costa e Simão Sabrosa, fazendo descansar Miguel, Ricardo Carvalho e Luís Figo.
A anfitriã Alemanha, que tinha sido eliminada pela Itália, também rodou algumas peças, mas teve argumentos para ganhar por 3-1 em Estugarda. Bastian Schweinsteiger (56 e 78 minutos) e Petit na própria baliza (61’) marcaram para os germânicos, Nuno Gomes para a equipa das quinas (88’).
O encontro marcou a despedida de Figo e Pauleta da seleção portuguesa e de Oliver Kahn da congénere alemã.
 
 
 
19 de junho de 2008 – Euro 2008 (quartos de final)
Portugal 2-3 Alemanha
Dois anos após o duelo de Estugarda, as duas seleções defrontavam-se em Basileia, mas com onzes bem diferentes, com ambas a mostrar estarem a passar por um processo de renovação. No entanto, algo se manteve em relação ao encontro de consolação em 2006: Bastian Schweinsteiger voltou a ser o principal carrasco português.
O médio do Bayern Munique inaugurou o marcador aos 22 minutos e fez a assistência para os dois restantes golos da Die Mannschaft, apontados por Miroslav Klose (26’) e Michael Ballack (61’). Nuno Gomes (40’) e Hélder Postiga (87’) marcaram para Portugal, na despedida de Luiz Felipe Scolari, que depois rumou ao Chelsea.
 
 
 
9 de junho de 2012 – Euro 2012 (1.ª jornada da fase de grupos)
Vice-campeã europeia em 2008, semifinalista do Mundial 2010 e com pleno de vitórias na qualificação para o Euro 2012, a Alemanha era amplamente favorita frente a uma seleção portuguesa que pela segunda vez consecutiva necessitou de um playoff para chegar a uma fase final e que nos últimos jogos de preparação empatou com a Macedónia e perdeu com a Turquia.
 
 
 
16 de junho de 2014 – Mundial 2014 (1.ª jornada da fase de grupos)
Alemanha 4-0 Portugal
Tal como dois anos antes, Alemanha e Portugal defrontaram-se logo na primeira jornada da fase de grupos. Muitos dos jogadores até eram os mesmos, mas estavam em fases diferentes da carreira. Os germânicos contavam com uma equipa base em grande parte composta pelos finalistas da Liga dos Campeões no ano anterior, Bayern Munique e Borussia Dortmund, enquanto do lado português vários jogadores vinham de uma época em que atravessaram problemas físicos, entre os quais Cristiano Ronaldo, Nani e Hélder Postiga.
Quando João Pereira cometeu falta sobre Götze dentro da área lusa logo aos 11 minutos, deu início ao descalabro da equipa orientada por Paulo Bento. Müller não só converteu a grande penalidade como foi agredido por Pepe num lance que valeu o cartão vermelho direto ao central português e bisou no tempo de compensação da primeira parte. Pelo meio, Hugo Almeida foi substituído devido a lesão e Hummels fez o 2-0 na sequência de um canto batido por Kroos.
No segundo tempo, Thomas Müller concluiu o hat trick e completou aquela que foi a derrota mais pesada de sempre de Portugal em fases finais de grandes torneios num jogo que foi o 100.º da Alemanha em Campeonatos do Mundo.
 





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