Recreativo Social e Desportivo
Guelson Futebol clube ou simplesmente RSD Guelson FC é um clube fundado a 10 de
abril de 2010 por Pembele André Pedro, empresário angolano
e ainda hoje presidente do clube. O RSD Guelson FC é um clube do município de Kilamba
Kiaxi, no distrito urbano do Golfe. Em apenas uma década de existência,
rapidamente se tornou num dos clubes mais competentes no que à formação de
atletas diz respeito, tornando-se num pilar forte da formação no futebol
angolano.
O RSD Guelson FC já lançou no
mercado jogadores como Zito Luvumbo (1° de Agosto), Gladilson (Wiliete Sport clube
de Benguela por empréstimo do Petro de Luanda) e Maestro (AFA), entre outros. O
clube incorpora três modalidades: futebol, andebol e fisiculturismo, mas é na
primeira que o RSD Guelson FC tem ganhado mais protagonismo.
Em entrevista, o presidente e
fundador Pembele André Pedro, também conhecido por Ty Guelson, analisa o
projeto do clube, revela as principais dificuldades e traça os objetivos para o
futuro.
ROMILSON TEIXEIRA - Quem é Pembele André Pedro, onde nasceu, cresceu e
como foi a sua Infância?
PEMBELE ANDRÉ PEDRO - Tenho 33
anos, sou filho de Sivudiano Pedro Filho e de Mafuta Sidamie, nasci em Luanda, no
município de Kilamba Kiaxi. Sou o segundo filho da minha querida mãe, estudante
do terceiro ano de gestão empresarial na Universidade Técnica de Angola.
Ty Guelson é uma pessoa cristã, muito humilde, simples por natureza, teimosa,
firme, persistente, objetiva, sincera, orgulhosa, espontânea, explosiva quando
necessário, generosa, empática, que adora ajudar os outros e tem muito amor ao
próximo.
Objetivo inicial era desviar jovens do mundo do crime
Como e quando entra para o dirigismo desportivo?
Não sou ex-praticante, nunca
treinei alguma modalidade, não conhecia nenhum campo de futebol de formação e
nem imaginava que existia campeonato de formação. Só conhecia o Estádio da
Cidadela. Posso dizer que sou um paraquedista que caiu sei lá de onde e hoje é
fundador e presidente de um clube de formação.
Mas entrei no futebol da seguinte
maneira: na rua onde vivo, anteriormente havia muita delinquência, rapazes maioritariamente
entre os 15 e os 25 anos acabavam por se inclinar para um mundo de confusões e
roubos. Comecei a trabalhar muito cedo porque a minha mãe sempre me disse: “Enquanto
estou em vida tens de saber o preço da kikuanga.” Isso significa que tinha que
saber fazer alguma coisa e formar-me enquanto ela era viva. E assim o fiz desde
pequeno.
Pembele André Pedro, presidente e fundador do RSD Guelson FC |
Na altura eu estava a conquistar uma miúda muito linda e ela
respondeu-me o seguinte: “Eu até gostei de ti e só não te aceito porque todos
os jovens que vivem na tua rua são gatunos, inclusivamente você.”
Nesse momento
eu parei e perguntei-me o que devia fazer para mudar a má fama que a rua tem.
Pensei logo em ocupar os mesmos jovens que eram os tais gatunos e a única ideia
que veio à minha mente foi criar uma equipa de futebol, então comprei uma bola
e passámos a jogar numa rua, quatro contra quatro, e passámos a jogar todos os
dias.
O número de jogadores foi aumentando e passado algo tempo comprei mais
bolas e equipamento, houve a necessidade de começarmos a sair e fazer jogos
fora, para ocupa-los mais, e comecei a marcar jogo de futebol 11 aos sábados em
diversos campos distantes e fazia aluguer de pequenos autocarros, e ao domingo jogávamos
futebol salão na rua onde começámos. Batia janela a janela e porta a porta para
eles virem jogar das 7.00 até as 14.00. Durante algum tempo o que passou a acontecer
aos gatunos foi que eu comprava gasosa para os gasoseiros e cerveja para os
cervejeiros quando praticavam futebol, então quando iam para casa após comerem
e tomarem banhos, estavam sempre cansados e acabavam por dormir durante muito
tempo e esqueciam que tinham planos para irem roubar.
O índice de criminalidade
foi diminuindo e transformei gatunos em praticantes de futebol. Para poder dar
maior consistência ao programa da equipa que havia criado, que se chamava
Amigos Reais, e de modo a dar maior responsabilidade aos jovens, em 2010 passei
a organizar torneios de futebol salão no Largo do Kissema, no Kilamba Kiaxi, e
acredito ter sido um dos primeiros organizadores destes torneios, em que os
Amigos Reais participavam a custo zero e eram tratados como atletas
profissionais e agitavam o bairro, que nem tinha cultura de prática desportiva.
No decorrer deste processo as crianças e irmãos dos tais gatunos, com idades
entre os 6 e 14 anos e que acompanhavam os jogos e treinos, pediram uma reunião
comigo e disseram que também queriam fazer parte da brincadeira e pediram para
eu criar também uma equipa para a idade deles. Nesse instante percebi que a
minha luta pelo resgate do bom nome da minha rua e a ação da criação da equipa
estava sendo transversal e entendido pelas pessoas ao redor, como pais e
crianças. Então aceitei o desafio e peguei um dos antigos gatunos, fiz dele um
monitor/treinador das crianças, passámos a treinar na mesma rua, comprei mais
bolas e equipamentos desportivos e passámos a ir competir em torneios infantojuvenis
na zona e realizar jogos amigáveis.
Em 2012, enquanto passava no Campo
Municipal do Kilamba Kiaxi, vi muitas crianças equipadas, tudo muito bonito. Estava
no táxi e acabei por descer para ir saber o que estava a acontecer e se ainda
era possível inscrever as minhas crianças naquela festa infantil. Soube então
que era a abertura do Torneio Caçulinhas do Gira-Bairro organizado pelo
movimento nacional espontâneo, mas não soube onde obter mais informações.
Meses depois alguém me disse que
a sede do Gira-Bairro ficava no São Paulo, então fui logo ao São Paulo, no
Sambizanga. Andei muito, perguntei tanto e ninguém conhecia a tal sede, até que
um jovem disse que não era no São Paulo (Bairro do distrito urbano do
Sambizanga) mas sim campo São Paulo por trás do mercado dos congolenses. Já
estava cansado, mas fui mesmo assim, e lá disseram que não podíamos inscrever
equipa porque já tinham muitas jornadas realizadas e só seria possível na
próxima edição. Então passei a realizar apenas os meus torneios de futebol
salão e jogos/torneios para os putos. Na ânsia de participar no torneio, em
janeiro de 2013 fui fazer a inscrição e fomos os primeiros. Diziam que o
campeonato devia começar em abril, mas não começou e davam-me muitas desculpas.
Na sequência de muita espera e ansiedade tive de passar por uma situação triste,
em que fui detido.
Zito Luvumbo, do 1º de Agosto, passou pelo RSD Guelson FC |
Como surgiu a ideia de passar de uma equipa espontânea para um clube de
futebol?
Foi devido às exigências do
momento, porque queria voar mais alto e para isso era necessário legalizar a
instituição, para poder participar nos campeonatos provinciais. Numa primeira
fase registei o clube como Escola de Formação de Futebol Guelson, no dia 29 de
janeiro de 2017 realizámos eleições para constituir os órgãos sociais do RSD Guelson
FC e agora no dia 8 de fevereiro deste ano fomos o primeiro clube nacional a
realizar o ato de renovação de mandatos em cumprimento da lei e da circular do
Ministério da Juventude e Desporto.
O RSD Guelson conta atualmente com quantos atletas e quais são os
escalões que comporta?
O RSD Guelson FC tem três
modalidades desportivas: futebol, andebol e Fisiculturismo. O clube tem hoje
cerca de mil atletas espalhados por Luanda (Kilamba Kiaxi, Cazenga, Zango, Calemba
2) e na província do Uíge, no município do Negage. Temos os escalões de infantis
(Caçulinhas), iniciados, juvenis e juniores.
"Prémios de arbitragens são uma grande roubalheira na formação"
O clube certamente não dá oportunidades apenas para jogadores e
treinadores. Quantos funcionários de apoio tem em média e qual é a principal
fonte de rendimento? Existe algum patrocinador?
O clube realmente não tem um
patrocinador oficial, mas tem um fundador e presidente dedicado que faz das tripas
coração para nunca faltar o necessário para o clube poder funcionar. Existe
dentro do clube a PAPG - Prestação de Serviços (SU), empresa fundada pelo
presidente do clube com ajuda do microcrédito do Banco Sol, empresa esta que se
dedica a mototáxi e assim vai sustentando o clube. Temos também a Farmácia
Mafuta Sidamie, em que o presidente é sócio juntamente com a falecida mãe. E o
salário do próprio presidente, que garante o básico para o funcionamento do clube.
Desde sempre que tenho feito da seguinte maneira: faço um orçamento semanal que
ronda os 100 mil kwanzas e durante a semana faço os possíveis para conseguir
juntar estes valores para que no final de semana consiga realizar todas
atividades desportivas do clube, que passam pelo aluguer do táxi, alimentação e
prémios de arbitragens, que também são uma grande roubalheira no nosso
campeonato de formação.
Felizmente temos conseguido realizar
todas as nossas atividades desportivas sem choramingar, porque cansei-me de
pedir e nunca recebemos algum apoio durante estes dez anos. Temos de agradecer
sempre o apoio institucional que temos recebido da administração municipal do
Kilamba Kiaxi e da Manura - Prestação de Serviços, que também deu sempre a sua
contribuição com os seus serviços. Agora fechamos uma parceria com a GIANT
Seguros, que passará a dar um pouco no âmbito da sua responsabilidade social. Estamos
a organizar-nos também com a ajuda da Gest4sport no sentido de conseguirmos encontrar
patrocinadores.
Temos um total de 26 treinadores
e 20 membros dos órgãos sociais que ocupam também cargos administrativos.
Uma jovem equipa do RSD Guelson FC, de Kilamba Kiaxi |
Como olha para o estado atual do nosso futebol? O que tem de ser mudado
urgentemente?
O estado do nosso futebol não é
dos melhores, tudo porque na categoria sénior já não somos amadores, enquanto
na formação somos amadores. Primeiramente é necessário definirmos qual o nosso
objetivo e foco para o futebol nacional, estabelecer regulamentos e adequar aos
modelos mais desenvolvidos, como os europeus, desde os infantis aos seniores,
criarmos uma política de atração ao investimento empresarial de modo a atingirmos
a ligas e competições mais visíveis e competitivas, onde participam clubes
legais e não como temos vistos. É importante também para ser possível
primeiramente formar os verdadeiros dirigentes desportivos comprometidos com o
desenvolvimento do futebol.
Quais são as maiores dificuldades que um clube talhado para a formação enfrenta
no nosso futebol?
São muitas, desde a falta de
transporte, taxas de arbitragem altas, pagamentos de campos, alimentação digna
dos atletas e materiais desportivos. Para fazeres desporto em Angola
tens de ter coração.
Sempre que há uma convocatória para as seleções jovens de Angola
há polémicas, reivindica-se muito a convocatória de atletas de outras
províncias que não Luanda. Acha que tem havido uma certa indiferença para com
os atletas jovens que representam os clubes de outras províncias do país? Há favorecimentos
nesse aspeto?
Não acredito existir
favorecimentos, mas sim desorganização, porque a Federação
Angolana de Futebol (FAF) alega falta de condições para alojar os atletas que
vêm das províncias e falta de condições técnicas e financeiras para o pessoal
do departamento das seleções poderem ir acompanhar os campeonatos e visitar
todos os clubes legais que participam nos campeonatos de formação. Então buscam
sempre os mais próximos para facilitar os custos. A verdade é que se não houver
uma organização profunda na FAF
estamos a mentir a nós mesmos e o tempo vai passando e acabamos por não fazer
nada para o desenvolvimento do futebol. Nas outras províncias há muitos
talentos.
Qual é o conselho que deixa a todos os jovens que sonham ser jogadores
profissionais?
Primeiramente para se consciencializarem
que nada cai do céu, tudo nesta vida requer sacrifícios. Têm de acreditar no
seu potencial, capacidades, habilidades e sobretudo colocarem Deus em todas as
suas ações, trabalharem arduamente com bastante responsabilidade, compromisso,
dedicação, amor pela ação e nunca aceitarem que lhes digam que são fracos ou
incapazes. Têm de acreditar neles mesmos, o mundo é de todos e cada um tem de
saber ir atrás das suas oportunidades e segurá-las. Jovens, deixem de ser
preguiçosos e vão à conquista dos vossos objetivos e façam sempre o vosso
melhor para juntos e unidos vencermos, porque Deus está no comando.
Entrevista realizada por Romilson Teixeira
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