terça-feira, 21 de abril de 2020

De Pedrógão Grande ao Covid-19. A maldição de António Costa

Governo de António Costa tem vivido situações inéditas
Desde que tomou posse pela primeira vez como primeiro-ministro a 26 de novembro de 2015 devido a uma solução governativa proporcionada de forma inédia pelos partidos mais à esquerda, António Costa viveu uma espécie de lua-de-mel durante o primeiro ano e meio à frente do governo.


A sempre ruidosa esquerda, composta pelo PCP e pelo Bloco de Esquerda, estava pela primeira vez a desempenhar um papel que não o de oposição, ainda que mediante determinadas condições. E o PSD, que viu Passos Coelho deixar a liderança do partido após umas eleições em que foi o mais votado, entrou numa espiral negativa da qual ainda vai procurando, muito lentamente, sair. Paralelamente, foram repostos direitos aos portugueses, que viram regressar feriados, subir o salário mínimo e, no setor público, diminuir o horário semanal de 40 para 35 horas. Tudo corria bem ao governo socialista.

Porém, depois desse ano e meio de lua-de-mel foram-se sucedendo acontecimentos absolutamente bizarros. A 17 de junho de um tórrido 2017, um incêndio de grandes dimensões deflagrou em Escalos Fundeiros, Pedrógão Grande, tendo alastrado pelos concelhos vizinhos de Castanheira de Pera, Figueiró dos Vinhos, Ansião, Sertã, Pampilhosa da Serra e Penela. 66 pessoas morreram, 253 ficaram feridas e foram destruídas cerca de 500 casas e 50 empresas.

Uma trovoada seca, conjugada com temperaturas superiores a 40ºC e um vento intenso, fez deflagrar e propagar rapidamente o fogo, apontaram as autoridades. Porém, nunca foi afastada a hipótese de fogo posto. O ordenamento florestal, mais do que pouco preparado para incêndios, potenciou-lhes a propagação. E as falhas do Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP), criado em 2006, não ajudaram.

Mas na hora de atribuir responsabilidades, mesmo com tantas variáveis e problemas estruturais de há décadas, ninguém poupou o governo. E apesar de estar há ano e meio no cargo, a ministra da Administração Interna, Constança Urbano de Sousa, começou a ser pressionada para apresentar a demissão, algo que viria acontecer após uma nova vaga de incêndios em outubro de 2017.

Ainda os portugueses digeriam a tragédia de Pedrógão quando, a 29 de junho, menos de duas semanas depois, o Exército tornou público o desaparecimento de material de guerra dos Paióis Nacionais de Tancos, ocorrido na véspera. Entre o armamento estavam explosivos, granadas de gás lacrimogéneo e granadas foguete anticarro. Quem teria roubado e o que tencionava fazer com tais materiais? Estaria a ordem pública ameaçada? Mais uma vez, é o governo que fica debaixo de fogo, nomeadamente o ministro da Defesa, Azeredo Lopes, que mais de um ano viria a apresentar a demissão, após até ter chegado admitido que poderia não ter havido furto em Tancos.

Se o assalto já era suficientemente bizarro, um caso ganhou contornos mais surreais quando, a18 de outubro do mesmo ano, a PJM (Polícia Judiciária Militar) anunciou que esse material havia sido descoberto num terreno na Chamusca, dizendo o comunicado que a operação envolvera a GNR de Loulé. A PJM alegou que tinha recebido um telefonema anónimo indicando a localização das caixas e que, por casualidade, estavam ali perto os militares da GNR, no âmbito de outro processo, a quem pediu apoio. Basicamente, uma encenação que incluiu uma particularidade absurda: entre o material recuperado estava uma caixa de petardos a mais.

A tragédia de Pedrógão Grande e o caso de Tancos fizeram correr muita tinta durante largos meses, mas numa altura em que o governo começava a deixar de estar debaixo de fogo, a 19 de novembro de 2018 um troço de cerca de 100 metros da estrada municipal 255, perto de Borba, colapsou, face à proximidade da pedreira, levando a um deslizamento de terra e rochas para dentro da cratera. O acidente provocou a morte de dois operários que trabalhavam na pedreira e de mais três homens que seguiam em dois veículos automóveis na estrada municipal.

Borba tornou-se então mais uma localidade que saltou do anonimato para as capas dos jornais. Embora os autarcas fossem os mais visados pelo abatimento do troço da estrada, que certamente não estaria em muito melhores condições antes de novembro de 2015, o governo de António Costa não ficou isento de críticas e de acusações de responsabilidades indiretas.

Quase um ano depois, em dezembro de 2019, os efeitos do mau tempo na sequência das depressões Elsa e Fabien provocaram três mortos e deixaram 144 pessoas desalojadas, registando-se mais de 11.600 ocorrências em todo o país, na maioria inundações e quedas de árvores.

O mau tempo levou também a condicionamentos na circulação rodoviária e ferroviária, danos na rede elétrica e a subida dos caudais de vários rios, provocando inundações em zonas ribeirinhas das regiões Norte e Centro, em particular no distrito de Coimbra. No rio Mondego, a rutura de dois diques provocou cheias em Montemor-o-Velho. Porém, o autarca Emílio Torrão revelou que os dois diques que colapsaram não estavam preparados para o tipo de esforço a que foram submetidos, levando a mais um debate sobre o papel do governo para prevenir este tipo de tragédias.

Meses depois das cheias, o surgimento do covid-19 em Portugal. O novo coronavírus surgiu na cidade chinesa de Wuhan no final de 2019, mas rapidamente se propagou por todo o mundo, sobretudo depois de, por altura do Carnaval, ter chegado com grande impacto ao norte de Itália. Mais tarde ou mais cedo seria a vez do nosso país. António Costa optou por ir introduzindo medidas de forma progressiva, sem alarmismos, mas simultaneamente com o intuito de sensibilizar os portugueses para o perigo do covid-19. A tão falada curva de novos casos rapidamente deixou de crescer exponencialmente para ficar achatada, mas para muitos o encerramento das fronteiras deveria ter acontecido mais cedo. Por outro lado, houve quem criticasse a declaração de estado de emergência por a considerar uma medida exagerada. O Serviço Nacional de Saúde tem sido posto à prova como nunca. Embora a pandemia ainda esteja envolta em muito desconhecimento e fosse pouco expectável, depressa se começou a pedir a cabeça da diretora geral de saúde por algumas contradições entre o discurso dela e o dos dirigentes da Organização Mundial de Saúde, nomeadamente devido à utilização de máscaras. Outra das questões que colocou o governo no epicentro do furacão foi a do difícil equilíbrio entre proteger a saúde e proteger a economia, pois grande parte do país foi obrigada a parar e com isso secou a fonte de rendimentos de muitos cidadãos. A lei não previa um cenário destes e, à medida que vai sendo revista, novas questões vão surgindo a quem governa, deixando recorrentemente Costa e seus ministros entre a espada e a parede.

Definitivamente, um governo amaldiçoado.














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