sábado, 23 de dezembro de 2017

Romantismo até certo ponto. A diferença entre proibir e evitar

Miguel Cardoso é o treinador revelação da I Liga 2017/18
Está a fazer escola uma nova fornada de treinadores portugueses que quer deixar bem vincado que as equipas que orientam têm a impressão digital deles. Para o bem da modalidade, o registo que querem imprimir é o de um futebol positivo, de pé para pé, de posse de bola, de jogadas com cabeça, tronco e membros, com início do guarda-redes e conclusão de um dos avançados.

As premissas de que um estilo de jogo atrativo cativa adeptos a ir aos estádios, o futebol deve ser visto como uma indústria de espetáculo e um jogador só consegue valorizar-se com a bola nos pés dominam as mentes desta vaga de técnicos, com Miguel Cardoso (Rio Ave) e Luís Castro (Desp. Chaves) à cabeça. E a verdade é que dá gosto ver jogar estas equipas.


Os vila-condenses, que recentemente afastaram o Benfica da Taça de Portugal, são o caso mais flagrante. Já sabemos que podemos contar com uma matriz de jogo ousada, irreverente, positivamente arrogante e que faz prometer partidas bem mais entretidas do que as que estamos habituados a assistir por parte de conjuntos do meio da tabela.

Neste sentido, com mais bola nos pés, sobressai o talento das individualidades. Rúben Ribeiro e Marcelo são alguns jogadores que já andam pela I Liga há várias épocas, mas é com 30 e 28 anos que finalmente são apontados aos três grandes. Outros, como Nélson Monte, João Novais, Pelé e Guedes, para lá caminham, com um protagonismo que nunca antes tinham tido. Miguel Cardoso, já fez questão de o dizer, é daqueles treinadores que preferem morrer agarrado a uma ideia do que abdicar dela, um chavão muito utilizado pelos peregrinos de Pep Guardiola, a referência dos técnicos desta geração.

Contudo, o muito bem-vindo romantismo pode tornar-se suicida se for implementado em excesso. Na verdade, já se tornou suicida quando foi excessivo. Veja-se o exemplo da recente partida entre FC Porto e os rioavistas, em que o golo inaugural dos dragões – e que de certa forma condicionou o resto do encontro… -, nasce da proibição imposta aos chutões para a frente. Este é apenas o exemplo mais recente e mais castigador, mas o que não faltam são sustos…


Cássio, individualmente sob pressão de um avançado e com a equipa alvo de aperto por parte de um bloco bastante subido dos azuis e brancos, não abdica da ideia do treinador em jogar apoiado, acabando por falhar o passe. Seguramente, um golo que o treinador da formação de Vila do Conde não se importará de ter sofrido, pois faz parte do “morrer agarrado a uma ideia”, mas lanço a questão: não será preferível continuar com vida?

O continuar com vida não significa necessariamente bloco baixo e kick and rush. Pode ser um viver com qualidade de vida, isto é, manter a ideia mas introduzir nuances. Reconhecer as próprias fraquezas, os pontos fortes do adversário e, tentar ao máximo, conciliar a matriz com o resultado. O marketing pessoal e autopromoção não devem colocar em xeque os objetivos competitivos.

Dias depois deste FC Porto – Rio Ave, que terminou com a vitória dos visitados por 3-0, Real Madrid e Barcelona defrontaram-se no maior clássico do futebol mundial. Frente a frente, grande parte dos melhores executantes do planeta. Zidane e Valverde sabem bem a qualidade dos pezinhos que os seus jogadores têm, mas não foi por isso que em situações de muito aperto esses mesmos pés não tivessem deixado de resolver alguns problemas com pontapé para a frente ou que cada canto a favor tivesse sido transformado num atraso de 30 metros.

Se o chutão é para evitar? Sim, claramente. Se é para proibir? Jamais. E marcar um golo na sequência de um canto executado para o interior da área não pode ser encarado como algo integrante do resultadismo, mas sim uma demonstração de versatilidade.





3 comentários:

  1. Mesmo sendo excessivo fica sempre bem arriscar contra equipas ditas grandes que de grande não tem nada se jogamos assim eu soi de que temos que jogar sempre assim FORÇA RIO AVE parabéns Miguel Cardoso

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  2. Sou fã da filosofia imposta por Capucho, Castro e Miguel Cardoso, embora alguns pensem que não, principalmente sobre o último.
    Qualquer equipa deve ter uma identidade. Uma equipa só está perto de garantir vitórias se for fiel a si próprio.
    Infelizmente a competição não é justa e algumas equipas têm que se recorrer de outras formas de jogar o jogo, que sendo dentro da lei são tão meritórias como outras. Claro que também são mais ou menos bonitas.

    Miguel Cardoso exagera claramente na rigidez da sua ideia de jogo. Não muda nada. Para ele mudar uma coisa é mudar tudo. Eu não concordo, acredito que isso seja adaptar.

    Para usar uma imagem: Faz sentido dar um lamborghini a quem não tem experiência de condução? Não, mas a verdade é que podemos dar a experiência e depois o carro.
    Faz sentido dar um lamborghini a quem não tem dinheiro para o manter? Não, e não há muita gente para lhe dar esse dinheiro depois.
    O Rio Ave pode jogar assim em quase todos os jogos e em quase todos os momentos, mas perante equipas mais capacitadas deve adaptar-se, até porque em terra de cegos quem tem olho é Rei e no Dragão houve muito olho no treinador da casa.
    Talvez este modelo desse certo a 100% em 4 ou 5 equipa da atualidade. No Rio Ave poderá dar certo em 70 a 80% das vezes. Nos outros casos devemos reconhecer as nossas inferioridades e adaptar.

    Em Conclusão: Será inteligente usar um modelo de jogo cujas fraquezas favorecem as qualidades do adversário?

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    1. Não podia estar mais de acordo. Nem diria melhor. Ideia-chave: "Miguel Cardoso exagera claramente na rigidez da sua ideia de jogo. Não muda nada. Para ele mudar uma coisa é mudar tudo. Eu não concordo, acredito que isso seja adaptar."

      Outro exemplo (e podia apresentar muitos mais...):

      http://www.vsports.pt/vod/39911/m/361880/vsports/b6b8b2520cac17b56c98f87e1ed29e28

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